domingo, 31 de outubro de 2010

DILMA PRESIDENTA

Admito que o meu sentimento já não é, em relação ao PT, o do entusiasmo de outros tempos. O PT pragmatizou-se, entrou nos terrenos da realpolitik e ganhou contornos de chancelaria. Depois do surpreendente Lula - surpreendente, sim! niunguém esperaria que terminasse o seu percurso pela presidência com os níveis de aprovação que apresenta - é a vez de Dilma Rousseff (n. 1947), a antiga activista radical, tomar em mãos os destinos do Brasil.
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A posição do Partido Comunista Brasileiro sobre as eleições presidenciais quase foi ignorada por estas bandas. Aqui fica: Derrotar Serra nas urnas e depois Dilma nas ruas. Ver: www.pcb.org.br
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sábado, 30 de outubro de 2010

RIO BRAVO

Ao fim de quase dois anos de blogue, chega a hora do western. Há semanas deixei aqui um breve excerto de Johnny Guitar, mas o filme de Nicholas Ray tem um pendor cerebral e de tensão de emoções que não existe em Rio Bravo (1959). Nem faz grande falta. Esta obra do versátil Howard Hawks (1896-1977) é um filme cheio de energia, com os nervos à flor da pele e com muita gente mal comportada. Na sondagem da Sight and Sound, Quentin Tarantino foi um dos dois realizadores que votaram neste filme. Percebe-se porquê.
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Os Cahiers du Cinema veneravam Howard Hawks, mas um dos seus primeiros apoiantes foi o crítico Manny Farber (1917-2008) que se celebrizou pelo ataque furioso aos "búfalos do cinema artístico", de entre os quais citava George Stevens, Billy Wilder, Vittorio De Sica e Georges Clouzot. O tempo deu razão a Farber.

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Esta é a minha cena preferida de Rio Bravo. O ambiente tresanda a tabaco e a whisky, duas coisas que vale a pena usar. No final do filme há um tiroteio que ficou célebre. E, como é evidente, há uma mulher misteriosa. O que seria dos filmes, e da vida, sem mulheres belas e misteriosas?

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

A COMPRESSÃO ESPAÇO-TEMPO: APLICAÇÃO PRÁTICA Nº 1

A Luísa nasceu em 1997 e é fã dos Van Halen, uma banda que fez a sua aparição em 1972. O Manuel nasceu em 1993 e é entusiasta dos Led Zeppelin, agrupamento que surgiu em 1968 e desapareceu da cena rock em 1980. Ambos acham o Stairway to Heaven uma obra-prima. E ambos tiveram a lata de me "explicar" a importância do solo de guitarra em Eruption.
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Espaço e tempo comprimem-se. Ou baralham-se, como no divertido conto de Mário de Carvalho A inaudita guerra da Avenida Gago Coutinho, que pode ser lido aqui.
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8760

Foram estas (mais ou menos...) as horas decorridas desde a tomada de posse dos orgãos autárquicos, faz amanhã um ano.
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Foi um ano intenso, marcado por um conjunto importante de obras concretizadas e lançadas a concurso, em todo o concelho. O caminho é em frente e, apesar de todas as dificuldades - o corte de 900.000 euros no orçamento camarário imposto pelo nosso governo é uma delas - continuaremos com a mesma convicção de sempre.
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Deveria ser este o momento de um balanço pessoal que, por razões também pessoais, não farei agora mas sim no dia 31 de Dezembro. Prometo não reivindicar qualquer patente para um ano de 14 meses...
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QUEST


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Minha aldeia é todo o mundo.
Todo o mundo me pertence.
Aqui me encontro e confundo
com gente de todo o mundo
que a todo o mundo pertence.
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Bate o sol na minha aldeia
com várias inclinações.
Ângulo novo, nova ideia;
outros graus, outras razões.
Que os homens da minha aldeia
são centenas de milhões.
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Os homens da minha aldeia
divergem por natureza.
O mesmo sonho os separa,
a mesma fria certeza
os afasta e desampara,
rumorejante seara
onde se odeia em beleza.
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Os homens da minha aldeia
formigam raivosamente
com os pés colados ao chão.
Nessa prisão permanente
cada qual é seu irmão.
Valências de fora e dentro
ligam tudo ao mesmo centro
numa inquebrável cadeia.
Longas raízes que emergem,
todos os homens convergem
no centro da minha aldeia.
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António Gedeão (1906-1997)

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No termo de uma semana difícil e contraditória o balanço oscila entre o Road to Nowhere e a Minha Aldeia. Entre procuras, caminhadas, certezas e dúvidas se faz o tempo.

Road to Nowhere é um brilhante tema dos Talking Heads e saiu no ano em que estava a terminar a faculdade, faz agora 25 anos. O poema de António Gedeão é simbles e bonito, embora ele não seja um autor do cânone - diz uma amiga minha que sabe de literatura e eu acredito nela.

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

UM APÓLOGO

Era uma vez uma agulha, que disse a um novelo de linha:
— Por que está você com esse ar, toda cheia de si, toda enrolada, para fingir que vale alguma cousa neste mundo?
— Deixe-me, senhora.
— Que a deixe? Que a deixe, por quê? Porque lhe digo que está com um ar insuportável? Repito que sim, e falarei sempre que me der na cabeça.
— Que cabeça, senhora? A senhora não é alfinete, é agulha. Agulha não tem cabeça. Que lhe importa o meu ar? Cada qual tem o ar que Deus lhe deu. Importe-se com a sua vida e deixe a dos outros.
— Mas você é orgulhosa.
— Decerto que sou.
— Mas por quê?
— É boa! Porque coso. Então os vestidos e enfeites de nossa ama, quem é que os cose, senão eu?
— Você? Esta agora é melhor. Você é que os cose? Você ignora que quem os cose sou eu e muito eu?
— Você fura o pano, nada mais; eu é que coso, prendo um pedaço ao outro, dou feição aos babados...
— Sim, mas que vale isso? Eu é que furo o pano, vou adiante, puxando por você, que vem atrás obedecendo ao que eu faço e mando...
— Também os batedores vão adiante do imperador.
— Você é imperador?
— Não digo isso. Mas a verdade é que você faz um papel subalterno, indo adiante; vai só mostrando o caminho, vai fazendo o trabalho obscuro e ínfimo. Eu é que prendo, ligo, ajunto...
Estavam nisto, quando a costureira chegou à casa da baronesa. Não sei se disse que isto se passava em casa de uma baronesa, que tinha a modista ao pé de si, para não andar atrás dela. Chegou a costureira, pegou do pano, pegou da agulha, pegou da linha, enfiou a linha na agulha, e entrou a coser. Uma e outra iam andando orgulhosas, pelo pano adiante, que era a melhor das sedas, entre os dedos da costureira, ágeis como os galgos de Diana — para dar a isto uma cor poética. E dizia a agulha:
— Então, senhora linha, ainda teima no que dizia há pouco? Não repara que esta distinta costureira só se importa comigo; eu é que vou aqui entre os dedos dela, unidinha a eles, furando abaixo e acima...
A linha não respondia; ia andando. Buraco aberto pela agulha era logo enchido por ela, silenciosa e ativa, como quem sabe o que faz, e não está para ouvir palavras loucas. A agulha, vendo que ela não lhe dava resposta, calou-se também, e foi andando. E era tudo silêncio na saleta de costura; não se ouvia mais que o plic-plic-plic-plic da agulha no pano. Caindo o sol, a costureira dobrou a costura, para o dia seguinte. Continuou ainda nessa e no outro, até que no quarto acabou a obra, e ficou esperando o baile.
Veio a noite do baile, e a baronesa vestiu-se. A costureira, que a ajudou a vestir-se, levava a agulha espetada no corpinho, para dar algum ponto necessário. E enquanto compunha o vestido da bela dama, e puxava de um lado ou outro, arregaçava daqui ou dali, alisando, abotoando, acolchetando, a linha para mofar da agulha, perguntou-lhe:
— Ora, agora, diga-me, quem é que vai ao baile, no corpo da baronesa, fazendo parte do vestido e da elegância? Quem é que vai dançar com ministros e diplomatas, enquanto você volta para a caixinha da costureira, antes de ir para o balaio das mucamas? Vamos, diga lá.
Parece que a agulha não disse nada; mas um alfinete, de cabeça grande e não menor experiência, murmurou à pobre agulha:
— Anda, aprende, tola. Cansas-te em abrir caminho para ela e ela é que vai gozar da vida, enquanto aí ficas na caixinha de costura. Faze como eu, que não abro caminho para ninguém. Onde me espetam, fico.
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Contei esta história a um professor de melancolia, que me disse, abanando a cabeça:
— Também eu tenho servido de agulha a muita linha ordinária!
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Lembrei-me hoje deste texto do grande Machado de Assis (refiro-me ao escritor, falecido em 1908, a quem Pedro Santana Lopes, então Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, enviou um cartão , agradecendo-lhe um livro que chegara ao seu gabinete na autarquia). Estava no meu livro de leitura da 4ª classe e nunca mais o esqueci. Vale, às vezes, irmos buscar estas coisas da arca da nossa memória. Todos estes textos nos ensinam sempre qualquer coisa.

TARIQ AZIZ

A Tariq Aziz (n. 1936) assentava bem a etiqueta de "rosto humano" do regime de Saddam Hussein. Cristão caldeu, de ar amável, tinha interlocutores a Ocidente (o próprio Saddam também os teve, in illo tempore) e dava ao regime um toque de laicidade ou, pelo menos, de distanciamento face às teocracias da região.
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Esperava-se que viesse a ser condenado por serem provadas acusações sérias. Afinal, foi condenado à morte pelo seu papel na eliminação dos partidos religiosos no Iraque. Em especial, pela perseguição aos xiitas. Em Kerbala, e depois de ter sido conhecido esta notícia, devem ter estoirado muitas garrafas de coca-cola, em jeito de celebração. O regime acalma os xiitas e Tariq Aziz desempenha, malgré lui, um papel muito útil.
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quarta-feira, 27 de outubro de 2010

DIVERTE-FOCINHOS

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Ao olhar para a ementa do jantar da passada segunda-feira dei com esta expressão, hoje menos habitual que antes: amuse-gueule, que designa os canapés e acepipes do género que antecedem as refeições.
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Se traduzirmos directamente amuse-gueulediverte-focinhos (em português dizemos entreténs de boca, o que é bem mais prosaico)... Os franceses têm coisas destas, um pouco bizarras e engraçadas.
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Este post foi pensado para uma amiga com quem gosto de ir a festas e que diz sempre "ora vamos lá a atacar uns diverte-focinhos".

O FADO, TIPO SOPA DE JOEL ROBUCHON

No Expresso do passado sábado anunciava-se, a propósito do fado e da candidatura a Património Imaterial da Humanidade, uma iniciativa onde "um quarteto de cordas ucraniano toca um fado de António Victorino d'Almeida dançado por bailarinos de tango".
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É o fado haute cuisine, a fazer lembrar os pratos de Joel Robuchon:
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Le Tofu en fin velouté aux zestes de yuzu sur une gelée d’algue chaude à l’anguille fumée et caramélisée.
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Ainda haverá fadistas à porta da Igreja de Santo Estevão?

terça-feira, 26 de outubro de 2010

FROM AMARELEJA WITH LOVE

À medida que os anos vão passando a palavra surpresa vai perdendo peso no meu léxico. Mas, às vezes, ainda tenho surpresas. Hoje foi um desses dias, quando me relataram um insólito episódio, ocorrido ontem à noite na Amareleja.
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Por razões profissionais, não pude estar presente no encontro com a população que teve lugar naquela vila. Perdi, assim, a oportunidade de assistir a um momento único. A dada altura, o Presidente da Junta de Freguesia, António José Valadas Gonçalves, entendeu por bem ler em voz alta, e comentar publicamente, em tom chocarreiro e com piadas laterais, o teor de um pacífico mail que eu lhe remetera há uns meses. O mail era pessoal (do vereador para o presidente da junta) e abordava uma série de questões que ele próprio me colocara sobre diversos assuntos da freguesia.
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Sobre a elegância da atitude, nada mais há a comentar. Fica o aviso: quem enviar mails (não sei se o princípio se aplica a outros documentos) ao Presidente da Junta da Amareleja arrisca-se a que os mesmos possam vir a ser publicamente divulgados.
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NB: não serão publicados comentários sobre o teor deste texto.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

O VIAJANTE SEM SONO

A poesia de José Tolentino Mendonça, padre, teólogo e poeta (n. 1965) é , para mim, descoberta recente e feliz. Do livro O viajante sem sono, título que escolhi por acaso e não para me torturar com a minha memória recente, gostei em especial deste Diante do mar. Porque gosto do lirismo, nada mais.
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A fotografia é de Oben Antón (n. 1978). Uma fotografia lisboeta deste autor é a capa do livro. Espreitem o site: www.obenanton.com
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DIANTE DO MAR
Perante linhas que se despenham
numa desarticulação cadenciada
um pensamento, mesmo o mais trivial
coloca-nos no centro de uma tempestade
Um reino subterrâneo
avança a intervalos pela casa fora
emerege muito lentamente
o declive
que para sempre nos separa
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Imagina que tudo isto ocorre antes do próximo Inverno
E mesmo ao escurecer estás diante do mar
O mar como nunca antes o viste

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

DE RODRÍGUEZ

Estar de Rodríguez é uma expressão muito conhecida em Espanha. Significa mais ou menos família fora durante o fim de semana e o tempo todo para um homem fazer o que quer. Às vezes não é lá grande ideia.
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Vai ser mais ou menos assim, vendo filmes na solidão da capital:
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Sábado é dia de Joris Ivens (da guerra sino-japonesa ao quotidiano no Mali) e de Miguel Clara Vasconcelos (a vida de um pugilista que perdeu a visão). Domingo é a vez de Jørgen Leth e da maneira como viu o caótico Haiti, um dos sítios neste planeta que mais curiosidade tenho em conhecer. Desde a leitura de uma certo livro de Graham Greene...
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O blogue volta à vida na segunda-feira. Se o WHPO (2º Encontro Internacional - Património Mundial de Origem Portuguesa) o permitir.
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O DOCLISBOA termina domingo: www.doclisboa.org
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O Encontro começa amanhã e vai até terça: www.uc.pt/whpo

MFS - PAINEL 100.000

A Moura Fábrica Solar celebra hoje a montagem do painel nº 100.000. Recordemos que a fábrica, a laborar desde Julho de 2008, é uma peça importante do projecto de energias renováveis que, a partir da Câmara Municipal, foi posto em marcha no nosso concelho.
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Disse o responsável da fábrica, Nuno Silva:
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“…no que respeita ao ambiente laboral, é importante referir que temos vindo a aumentar gradualmente o número de postos de trabalho efectivos e não efectivos, estamos também a alargar a nossa lista de fornecedores e iremos, a curto prazo, iniciar parcerias com empresas locais…”. Afirmou ainda que a Fábrica passou “…de duas para três linhas de produção de módulos, e também de uma capacidade instalada de 20 MW/ano para cerca de 42 MW/ano, no final de 2010…” (site da Rádio Planície).
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Ena! Para projecto "fracassado" não está nada mal...
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Parabéns e votos de sucesso à MFS.

GREED

A leitura do Orçamento do Estado não é leitura que se recomende. Verlaine, ou qualquer outro poeta, é infinitamente mais interessante. Não resisto, contudo, a transcrever este artigo, para o qual um amigo, gestor financeiro, me chamou a atenção:


Artigo 88.º
Concessão extraordinária de garantias pessoais do Estado
1 - Excepcionalmente, pode o Estado conceder garantias, em 2011, nos termos da lei, para reforço da estabilidade financeira e da disponibilidade de liquidez nos mercados financeiros.
2 - O limite máximo para a autorização da concessão de garantias previsto no número anterior é de € 20 181 583 965,10 e acresce ao limite fixado no n.º 1 do artigo 77.º.
3 - Este limite é reduzido no exacto montante das operações activas que venham a ser efectuadas em 2011, ao abrigo da Lei n.º 8-A/2010, de 18 de Maio.

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Ou seja, o Governo ou, melhor dizendo, nós somos fiadores da banca. No outro dia Teixeira dos Santos falava da "insaciabilidade dos mercados". Está agora ainda mais claro aquilo a que se referia. Nós (eu e você que me lê) somos a garantia dos eventuais buracos da banca. Habituemo-nos. Ou não.


Ilustrar esta situação com a sequência final de Greed (Ganância), realizado em 1924 por Erich von Stroheim (1885-1957), parece-me conveniente. A ganância e a sede do ouro levam à morte. Embora, no caso vertente, sejamos nós a representar os dois condenados. Os abutres que não tardarão a surgir são os outros.

Vale a pena ver o filme todo, embora vos confesse que a minha memória reteve apenas esta poderosa sequência final. Vale também a pena ler um pouco sobre este filme. A rocambolesca história da sua produção, e os fragmentos de que hoje dispomos, assemelham-se um pouco ao percurso pouco linear dos benditos mercados financeiros.




quarta-feira, 20 de outubro de 2010

O BEIJO

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Paul Verlaine (1844-1896) não foi um modelos de virtudes. As fotografias, ácidas e, não raro, de enorme violência, de Nan Goldin (n. 1953), nunca reflectem ambientes virtuosos. Gosto do poema de Verlaine e da fotografia de Goldin, por não fingirem falsas virtudes.
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Vivo acompanhamento no piano dos dentes
Dos refrãos que Amor canta nas almas ardentes
Com a sua voz de arcanjo em lânguidas delícias!
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Divino e gracioso Beijo, tão sonoro!

Volúpia singular, álcool inenarrável!
O homem, debruçado na taça adorável,
Deleita-se em venturas que nunca se esgotam.
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Como o vinho do Reno e a música, embalas

E consolas a mágoa, que expira em conjunto
Com os lábios amuados na prega purpúrea...
Que um maior, Goethe ou Will, te erga um verso clássico.
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Quanto a mim, trovador franzino de Paris,

Só te ofereço um bouquet de estrofes infantis:
Sê benévolo e desce aos lábios insubmissos
De Uma que eu bem conheço, Beijo, e neles ri.
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Paul Verlaine, in "Caprichos"

Tradução de Fernando Pinto do Amaral

terça-feira, 19 de outubro de 2010

RAPAZ COM UM CACHIMBO

O que motivou o texto anterior leva-me direitinho a este: não imagino nenhum dos nossos mecenas a comprar um quadro e a fazer dele um bem de usufruto público.
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E logo eles, que tanto gostam de citar o exemplo dos States, deveriam saber que as colecções dos maiores museus americanos foram constituídas com através de generosas doações de milionários. Não sei se o sr. Belmiro ou o sr. Amorim alguma vez tiveram semelhante inspiração. Mas tenho seríissimas dúvidas.
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Este Garçon à la pipe, pintado por Pablo Picasso (1881-1973) em 1905, foi vendido por uma fundação a um privado (hélas, o mundo não é perfeito...), em 2004, por 104 milhões de dólares (120 em números actuais). É o sexto quadro mais caro de sempre.
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FILANTROPIA

Quem tiver lido a revista Pública de há umas semanas, cuja capa era dedicada à filantropia terá, seguramente, reagido como o autor do blogue: rindo às gargalhadas. A atitude da maior parte dos nossas mecenas é digna de uma atitude de boa disposição. Quando se pedem exemplos concretos do apoio concedido pelos mais ricos do nosso país a domínios como a assistência social ou a cultura as respostas são vagas e sempre dominadas por um conceito: apoiar o que quer que seja inscreve-se no âmbito da caridadezinha.
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Há uns anos, o director de um museu nacional, um profissional dinâmico e com um currículo assinalável, contou-me que tentou obter, para uma iniciativa de grande visibilidade, o apoio, nem por isso muito significativo do ponto de vista financeiro, de uma conhecida multinacional. Teve como resposta qualquer coisa como: "sabe, nós já apoiamos todos os anos a entidade xis (uma instituição de solidariedade social)". Ainda e sempre a caridadezinha. Gulbenkian não era português e Champallimaud uma assinalável excepção.
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domingo, 17 de outubro de 2010

DO GHARB AO ALGARVE: INSCRIÇÕES ÁRABES DE MOURA

A partir desta semana, os visitantes da exposição do Gharb ao Algarve: uma sociedade islâmica no Ocidente poderão ver uma nova peça. Trata-se de uma lápide pertencente à colecção do Museu Municipal de Moura e que apresenta, numa das faces, a frase "Não há vencedor senão Deus e não há força e não há poder senão em Deus". Esta invocação, usada pelos emires de Granada, ajudou o epigrafista Artur Goulart a situá-la nos séculos XIII-XIV d.C. É, portanto, uma inscrição pertencente à comunidade muçulmana que permaneceu em Moura após a Reconquista.
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A exposição Do Gharb ao Algarve: uma sociedade islâmica no Ocidente estará patente ao público na Casa da Cultura Islâmica e Mediterrânica de Silves até ao próximo mês de Fevereiro.

MÉRIDA - X: CALLE JOHN LENNON

E assim se conclui o périplo emeritense. Com uma passagem pela Calle John Lennon, onde há cervejarias, casas de tapas, restaurantes e bares que fecham muito tarde. Mas o meu local preferido nessa calle é o Restaurante Pizzeria Galileo (no nº 28). Um sítio simpático e com clientela local. O ponto forte da ementa é o carpaccio. Há dez anos que lá vou e esse prato está sempre no menu. Só que o prato nunca está disponível e "hoy no hay carpaccio" é a resposta. Sempre.
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Se passarem por lá e houver carpaccio dêem-lhes cumprimentos da minha parte.
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O carpaccio é um prato de carne de vaca crua (na origem, que hoje em dia os chefs "carpacciam" tudo o que lhes apetece: bacalhau, atum, espadarte etc),
cortada em finíssimas fatias e temperada com azeite, pimenta e alcaparras. Também se usa mostarda, mas o gosto forte deste condimento acaba, na minha opinião, por aniquilar os outros sabores.
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O prato deve o nome ao pintor veneziano Vittore Carpaccio (1460-1525/6), mas as razões dessa atribuição são controversas.

sábado, 16 de outubro de 2010

ABERTO ATÉ DE MADRUGADA

O Público online de ontem à noite anunciava, num dos seus títulos, Ministério das Finanças aberto até de madrugada.
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Coincidência ou não, raras vezes um título me pareceu tão apropriado. É que Aberto até de madrugada é a versão portuguesa do filme de vampiros From dusk till dawn. No final do final, e se bem me recordo, ganham os bons e os vampiros são liquidados. Tenhamos esperança e lembremo-nos que para arrumar os vampiros George Clooney se farta de batalhar. Sigamos-lhe o exemplo.
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Aberto até de madrugada, com argumento de Quentin Tarantino, é um filme de 1996 do interessante cineasta americano Robert Rodríguez (n. 1942). Há um filme dele que as nossas televisões gostam de passar com regularidade: El Desperado (1992).

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

AS MINHAS ESCOLAS NO RANKING

Hoje saiu o ranking das escolas. Um ranking não é a palavra de Deus. As variáveis são imensas, o debate sobre os rankings tem tantas variáveis quanto os rankings propriamente ditos, depois há as declarações do Ministério e as da FENPROF, depois há os comentadores e depois há (oh não, por favor) os educocratas e os especialistas em educação... Há tudo isso, mas os rankings fornecem indicações e merecem, sempre, comentários e reflexão.
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Deu-me para ir procurar as minhas escolas no ranking das escolas:
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A
Escola Preparatória do Conde de Sabugosa, hoje Escola EB2+3 de D. Pedro IV (em Massamá) está em 32º lugar no básico, o Liceu Nacional de Queluz, hoje Escola Secundária Padre Alberto Neto em 183º lugar, na lista das secundárias. Frequentei a primeira entre 1973 e 1975, o segundo entre 1975 e 1980.
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Tenho aceitáveis recordações de ambas, não tenho saudades nem suspiro nostalgicamente quando nelas penso. Conservo duas ou três amizades para toda a vida desses dias. Sinto-me, sobretudo, grato pelos professores com quem me cruzei e que, com paciência, me ensinaram. A minha gratidão não chega ao ponto, e deveria chegar, de me recordar do nome de todos eles. Aqui vão alguns deles: Isabel Soares, a minha primeira professora de Francês e a mais importante na aproximação a essa língua; Carlos Chagas (hoje secretário-geral do SINDEP), que me passou, caritativamente, a Ginástica; Manuel dos Santos Alves, que me ensinou a gostar de História; Altino Cardoso, que aliava a prática do ensino do Francês à animação musical de certas aulas; Esther de Lemos, de um rigor exigente na tradução de textos; a bondade do Padre Alberto Neto, que me ensinou muito sobre a palavra tolerância (e nem sempre me lembro do que ele me ensinou...); os magníficos professores que tive a Língua Portuguesa e a História e a quem procuro não envergonhar.
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Pátio do 1º andar da minha Escola Preparatória.
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Pavilhão 1 do Liceu de Queluz (fotografia Edmundo Tavares)
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Ver: http://www.eb23-massama.rcts.pt/home.htm e espan.edu.pt

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

DOCLISBOA: IVENS E LETH E TODOS OS OUTROS

E hoje é o dia do início do DOCLISBOA. Uma grande programação e motivos mais que suficientes para uma peregrinação. Já por várias vezes confessei a minha paixão pelo cinema documental. Não sei onde estão as raízes, mas recordo-me de um programa da RTP intitulado Universidade na TV (1971? 1972?). Era aos domingos à tarde e passava imensos documentários sobre, entre outros temas, a vida em regiões remotas de África. Gostava de ficar sentado no chão da sala a ver , a preto e branco, aquelas coisas estranhas de um mundo que me era desconhecido. É por essas e por outras que uma velha amiga me diz "não é normal que uma criança faça essas coisas; não devias um miúdo normal". Claro que era, também gostava de trepar às amoreiras, de me apropriar de laranjas no melhor pomar de Moura - é melhor não dizer qual era... - e de atirar pedras a um gato pelo qual nutria um ódio muito particular. E de ficar a ver filmes como aqueles.
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Não sei se foi por causa desse programa televisivo, mas o registo do quotidiano ficou-me gravado. Muitas tardes da adolescência e dos tempos de adulto foram passadas em solitárias incursões na Cinemateca e na Gulbenkian por causa dos benditos documentários. Um, em especial, me ficou gravado: Spanish Earth (1937), do holandês Joris Ivens (1898-1989). Não só pelo empenhamento político, mas também pela coragem pessoal de um cineasta que se compromete de forma directa na acção. Não há visões neutras nem distantes dos problemas e Joris Ivens mostra-nos isso, com aquele empenhamento e com aquela tenacidade tão típicas dos holandeses. Verei, no DOCLISBOA, dois filmes de Ivens. E irei à descoberta de Jørgen Leth (n. 1937), um dinamarquês que estará no centro das atenções, até pelo facto de orientar uma masterclass no próximo dia 18. Os filmes a ver estão escolhidos. Interessam-se os ambientes não europeus. Aqui fica, em jeito de introdução, o começo de um documentário de Joris Ivens, ... À Valparaiso, de 1963:
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Ver
http://www.doclisboa.org/ (os bilhetes custam 3,5 euros)
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e
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http://www.ivens.nl/

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

AINDA OS 30 ANOS DE ARQUEOLOGIA EM MÉRTOLA

Já há ficha de inscrição para as comemorações do Campo Arqueológico de Mértola.
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Dias 5 e 6 de Novembro assinalam-se os 30 anos do projecto de Mértola. Que começou pelo campo arqueológico e pelas escavações da alcáçova. Que teve na investigação e na arqueologia o ponto de partida. A minha primeira passagem por aqui teve lugar em finais de 1982. Iniciei uma efectiva participação no projecto no Verão de 1983. Andávamos por lá todos: o Miguel Bento, que vinha de Alcaria numa V5 ou numa Casal; o Jorge Revez, que se encarregava de escavar sepulturas; o Manuel Passinhas, que tinha a seu cargo as cerâmicas, a Gena, que ainda era arqueóloga nesses tempos, o José Bento, o Carlos Viegas, a Guilhermina, a Maria João (falo só do grupo mertolense) e tantos outros. O tempo se encarregaria de nos dispersar por carreiras, instituições e escolhas de todos os tipos. É também isso que vamos comemorar nesses dias. As minhas melhores recordações são as do campo arqueológico desses dias. Que cada um fale das suas, bem entendido.
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Ver, dentro de um par de dias: www.camertola.pt e www.adpm.pt

O CARLOS JÚLIO TEM RAZÃO

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Não sei quem é o Nobel da Paz mas estou de acordo com o Carlos Júlio. Ora vejam:
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http://acincotons.blogspot.com/2010/10/nobel-da-paz-nao-conheco-mas-para-estar.html
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Quanto ao Prémio em si valerá a pena recordar que já distinguiu: Henry Kissinger, Al Gore, Jimmy Carter, Kim Dae-Jung, Willy Brandt, George Marshall etc. etc. Estamos conversados sobre o interesse de coisa...

ESCOLA SECUNDÁRIA DE MOURA: SEGUNDO FÔLEGO

As imagens não são muito grandes e o melhor é ver o site do arquitecto responsável pela intervenção (cf. infra). De que se fala? Da obra de renovação da Escola Secundária de Moura, promovida pela Parque Escolar e que resultará numa melhoria significativa das condições de trabalho para todos os que laboram naquele espaço. Obra ambiciosa - orçada em 13 milhões de euros -, à altura da história e da tradição daquele estabelecimento de ensino.
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A escolha de Nuno Lopes para liderar este processo parece-me muito feliz. Conheço o trabalho do Nuno em diversas regiões do país - com destaque para a liderança do processo de classificação do Pico a Património Mundial e para intervenções arquitectónicas como o Centro de Interpretação dos Capelinhos. E destaco também a sua passagem por Moura, onde, há poucos anos, se encarregou do processo de alteração ao Plano de Salvaguarda do Centro Histórico. Trata-se, pois, de um regresso.
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A Escola Industrial e Comercial de Moura - era esse então o seu nome - começou a funcionar naquelas instalações no ano lectivo de 1963/64. Tinha então capacidade para 800 alunos. O funcionamento permanente era assegurado por 33 professores, 2 funcionários administrativos e 8 auxiliares de acção educativa (nessa altura chamavam-se contínuos/as e uma delas era a minha mãe). Uma realidade que, bem entendido, nada tem a ver com a dos nossos dias.
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Ver o site do arq. Nuno Lopes: http://www.nurilo.com

assim como, evidentemente, o site http://www.esmoura.com/ e o blogue da Escola http://esmoura.blogspot.com/

terça-feira, 12 de outubro de 2010

ACARRO

Do Vocabulário de Rafael Bluteau (1638-1734):
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ACARRADO - Propriamente se diz das ovelhas quando no abrazado da calma se chegão humas às outras (...)
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A palavra acarro é interessante. Tem uma mancha geográfica limitada (Alentejo e Beira Baixa, tanto quanto julgo saber) e está hoje em vias de extinção, uma vez que o abandono dos campos levou a que cada vez menos jovens conheçam o significado de acarro ou acarrado.
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Há uns anos encontrei uma palavra de som idêntico num dicionário botânico sobre as plantas do Norte de África: aqarru, que significa figueira, numa das variantes da língua berbere. Fiquei, desde então, convencido acerca da ancestralidade e singularidade do nosso acarro. E, embora possa estar equivocado, fiquei também com a convicção que a palavra entrou na língua portuguesa por influência berbere. E, ainda, que há uma ligação estreita entre a sombra densa da figueira e a imagem dos animais que, encostados uns aos outros, se protegem da dureza do sol sob a copa de uma árvore.
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Fotografia: Francisco da Vide in http://fotografosdeelvas.blogspot.com

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

LEVEZA

Leve é o pássaro:
e a sua sombra voante,
mais leve.
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E a cascata aérea
de sua garganta,
mais leve.
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E o que se lembra, ouvindo-se
deslizar seu canto,
mais leve.
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E o desejo rápido
desse mais antigo instante,
mais leve.
E a fuga invisível
do amargo passante,
mais leve.
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O poema é de Cecília Meireles, por cujas palavras nutro uma especial paixão. A fotografia é de Francisco Pinto Moreira, meu amigo e patrício. E um belíssimo fotógrafo de natureza. Um talento inesperado. Mas que não nos deixa dúvidas.
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As palavras de Cecília Meireles vão bem com esta imagem, bem leve.
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Ver mais em:

MÉRIDA - IX: AQUEDUTO(S)

O monumento é bem visível, mas muitos visitantes contentam-se em vê-lo ao longe. Fazem mal. O local, outrora meio abandonado, merece hoje uma aproximação. Lembremo-nos, sempre, do que dizia Robert Capa: "If your pictures aren't good enough, you're not close enough". As melhores imagens do Acueducto de los Milagros fazem-se de perto, onde podemos apreciar todos os detalhes da construção.
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Restam hoje pequenos troços desta obra do século I, renovada em finais do século III. Recorde-se, em todo o caso, que Mérida tinha mais duas estruturas deste género. E que vale a pena perdermo-nos pela silenciosa estrada que leva ao Embalse de Proserpina, obra refeita no século XVII. Ir até ao embalse é também uma forma de homenagearmos o génio de anónimos construtores romanos: dois mil anos depois, a barragem continua a ser utilizada. Os textos nada nos dizem sobre erros, omissões, deslizes nos custos, erros de construção e outras coisas que tais...
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SÁBADO À TARDE

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As celebrações litúrgicas não são o meu forte. Desde que, na pré-adolescência, deixei de querer ser padre e depois de ter abandonado o catolicismo (consegui livrar-me de várias tentações, e uma delas foi a do anti-clericalismo) as missas exercem sobre mim um nulo apelo.
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Fui, e depois não me arrependi de ter ido, à acção política que o PCP promoveu em Serpa. A sala do Cine-Teatro esta completamente cheia. Havia muita gente nova, cheia de convicção. O discurso do secretário-geral Jerónimo de Sousa foi bom, mas ele é muito melhor e muito mais emotivo quando fala de improviso. O encontro foi importante, porque ajuda a uma mobilização que é decisiva, tendo em conta os tempos que se avizinham.
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E este tipo de celebrações é sempre interessante porque reencontramos amigos, e alguns deles estamos anos sem os ver. Outra pequena vantagem: não temos de nos confessar. Sempre detestei aquela coisa da confissão.
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Faltam 43 dias para a greve geral.

domingo, 10 de outubro de 2010

DOMANI

Escavações - final da campanha de 2003

Escavações - em Julho de 2010
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E domani recomeçam as escavações na alcáçova do Castelo de Moura, em mais uma etapa deste projecto. Junta-se à equipa o Dr. José Gonçalo Valente. Continua na equipa a Dra. Vanessa Gaspar, veterana do projecto da alcáçova. É bom trabalhar com equipas renovadas e alargadas. Os trabalhos irão até 26 de Novembro, numa zona menos afectada pelas obras dos séculos XVII e XVIII. Se chegamos ou não até aos níveis medievais nesta temporada logo se verá. Em todo o caso, em 2011 a ocupação islâmica da alcáçova poderá, depois de seis verões de labuta (veja-se o antes e o depois nas fotografias), ver a luz do dia. E trazer respostas sobre aspectos menos conhecidos da história de Moura.
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Porque usei a palavra italiana para amanhã? Porque vinha hoje no carro a ouvir um cd onde Frank Sinatra interpretava uma versão de Forget domani (coisa que não posso mesmo fazer). Gosto muito desta música, embora a prefira na versão de Katyna Ranieri (n. 1927), que era a do filme O Rolls-Royce amarelo, visto no Cinema Mundial em 1976 ou 1977. Não tenho grande memória do filme, a não ser uma cena de George C. Scott, que fazia de gangster, cantando desastradamente O sole mio.
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Viviamo oggi, chi lo sá c'è il domani. Podem ouvir Katyna Ranieri aqui.

ABRINDO UMA EXCEPÇÃO

Mandaram-me ontem à noite este comentário a respeito de uma pequena nota intitulada SÁBADO MUSICAL II:
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Para fait-divers ok.
Para Presidente, tens muito que dar ao carcanhol. Não estou falando de ti, pá. Tou falando do outro.
Há em ti qualquer coisa parecida com os heterónimos do Pessoa. Não sabemos se és politico, se és professor, se és arqueólogo, se és "postado" aqui dos blogues, se és escritor.
Olha, amigo. Sejas o que fores és um gajo porreiro. Faz lá as tuas voltinhas e um dia destes - se te apetecer muito, assenta a cuca de vez.
Esta rapaziada tem que se lhe diga...
Uma amiga.
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Cara amiga
Era mais engraçado se te tivesses indentificado...
Ao escrever no blogue tenho, com frequência, a sensação de me dirigir a pessoas que conheço, o que me leva também a publicar este texto justificativo, até porque o comentário deixou coisas em suspenso. Ou pelo menos assim as entendi.
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E não sendo meu hábito comentar desta forma os comentários, aqui vai:
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1. Não sei quem é "o outro".
2. Político? Professor? Arqueólogo? Bloguista? Escritor? Um pouco de tudo, sendo que entendo escritor como aquele que escreve coisas de História.
3. Obrigado pelo cumprimento do gajo porreiro. Já não é mau, na vida de um vereador...
4. Assentar a cuca de vez? Deve ser difícil, pelo menos no que tem a ver com a ideia de "sossegar".
De resto, muitos são os caminhos e ainda mais as voltas.
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PS - O sábado musical não foi mau. Muito som, mas o rock pesado é assim. Uma velha amiga andava por lá, coxeando. Garantiu-me que não tinha levado com nenhum decibel na tíbia...

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

À ESPERA DE UM DESMENTIDO

De entre os meus múltiplos defeitos não está o da inveja. O salário dos outros ou o sucesso dos outros ou me deixa indiferente ou, se são amigos, feliz por eles.
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Isso não tem nada a ver com uma obscenidade que hoje corre pela net e que fui picar a um blogue amigo, o ACINCOTONS. Salários desta dimensão (cf. lista) são um exemplo acabado de ganância e de falta de respeito para com a sociedade.
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Os nossos gestores de topo (a avaliar pelo estado desgraçado de algumas empresas públicas não sei muito bem o que eles topam...) gostam, por dá cá aquela palha, de dar o exemplo dos países nórdicos: a Dinamarca isto, a Suécia aquilo, bla-bla-bla.
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Não me parece mal o exemplo. Sigamos o exemplo: os CEO - não falo dos simples administradores - das 23 maiores empresas suecas (incluindo as financeiras) têm salários mensais da ordem dos 110.000 euros.
A avaliar pela escala portuguesa devem ser uns incompetentes do caraças... Tendo em conta o subdesenvolvimento sueco só pode ser isso.
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FOTOGRAFIA TALVEZ ALEXANDRINA

Tentei ilustrar o texto anterior com uma fotografia da grande dupla de artistas Lehnert e Landrock, que já por aqui passaram numa ocasião. Tal como então referi, são raras as imagens de Alexandria disponíveis.
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Deixo-vos com este testemunho, enigmático e contraditório e que nos decifra um pouco do orientalismo, de uma mulher, seguramente bela, provavelmente jovem e talvez de Alexandria.
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ALEXANDRIA

Do lado do mar, sobre a estrada escarpada, as fachadas mantêm ainda muito da sua glória passada. Neoclássico, neogótico, neoveneziano, ruínas neo-qualquer coisa como o crânio de Voltaire em criança. Essa mania da citação arquitectónica, da imitação, das cidades cosmopolitas. Grandes ritmos verticais de pedra dourada ou rosa. Dejectos, chuvas de água de lavar roupa caem das janelas. Cariátides cariadas, Atlantes, pilastras e frontões partidos. Na ponta das cordas sobem cestos que um hortelão, na rua, encheu de legumes. Loggias com guilhochês, cúpulas fendidas. Baixos-relevos onde já não galopam mais do que uma ou duas patas de cavalo deixando a marca de um cavaleiro desaparecido, onde dançam a máscara, o braço drapeado, brandindo uma cítara, de um corpo volatilizado. Persianas fechadas, gelosias de tabuinhas. Escadarias monumentais atulhadas, à sombra das quais tacteia toda uma multidão. Maquinarias negras, acobreadas, de ascensores avariados, ferros forjados em desalinho. Uma floresta de colunas decapitadas, tendo por tecto o céu. Nomes antigos que se apagam, GRAND CAFÉ DO COMÉRCIO E DA BOLSA, CABELEIREIRO DE SENHORAS, ELLINIKON KOURION, PICCADILLY HOTEL, CAFÉ MEMPHIS, CINEMA RIALTO. Para quem a contempla do mar, Alexandria deve oferecer mais ou menos o seu rosto durrelliano de "Babilónia estilo Boulle". À medida que nos aproximamos, os traços começam a mexer, a nitidez das linhas corrompe-se: a ruína pulveriza subtilmente a máscara da riqueza.
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Lembrei-me hoje deste excerto do livro O meu chapéu cinzento - pequenas geografias, de Olivier Rolin (n. 1947). Depois de o ter lido, e ter revisitado Pharos e Pharillon, fiquei com uma daquelas certezas inabaláveis que um dia irei a Alexandria. Pelo que leio e me contaram é uma cidade demasiado generosa para que a possamos disfrutar na solidão e de uma só vez.
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A forma como Rolin conclui a frase deixa-me dúvidas. O envelhecimento das cidades, tal como o de algumas pessoas, acrescenta-lhes, e se outras coisas se perderam, charme e calor. É uma lei cuja veracidade tenho podido constatar, mais que uma vez.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

VARGAS LLOSA - NOBEL

O Prémio Nobel da Literatura foi atribuído ao peruano Mario Vargas Llosa (n. 1936). É um dos maiores escritores do século XX e a Academia, tantas vezes alvo de críticas, recebeu hoje um alargado consenso.
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Vargas Llosa é, quase sempre, detestado à esquerda. Isso não o impediu de escrever um dos mais interessantes relatos sobre a questão palestiniana: Israel-Palestina, paz ou guerra santa. Saiu na já desaparecida edições quasi; foi o último livro dele que li.
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Arequina deve estar assim, cheia de luz pelo reconhecimento de um dos seus filhos (fotografia Hermanos Vargas - c. 1920)

SÁBADO MUSICAL - II

E, já agora, sábado há rock em Moura. É no Parque Municipal de Feiras e Exposições.
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Vou lá estar. Desempenharei, convictamente, o meu papel de cota. Por via das dúvidas só regressarei a Mértola ao fim da manhã.
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SÁBADO MUSICAL - I

Durante muito tempo interroguei-me porque é que esta estação de rádio não existia. Mal cruzava a fronteira tinha a RADIOLÉ que, com toda a descontracção, me bombardeava com rumbas e boleros e sevilhanas. Muitos amigos espanhóis acham a radiolé cutre. Não estou nada de acordo. É popular, mas alguns in-te-lec-tu-ais não gostam desse estilo de música...
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No outro dia, e por acaso, caí nos braços da RÁDIO AMÁLIA. Fado a tempo inteiro. E não é desse que está cheio de world music e de tiques de jazz (que não é nada mau, antes pelo contrário). É fado cantado à sombra da igreja de Santo Estêvão, fado de Alfama e da Madragoa. Fado de Manuel de Almeida e de Alcindo de Carvalho e de Lucília do Carmo.
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A RÁDIO AMÁLIA faz um ano no sábado. Só é sintonizável em Lisboa (92.0 FM) e em Setúbal (100.6 FM). Mas está na net.
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Ouça-se na net:
http://www.amalia.fm/
e, também, sejamos tolerantes
http://www.radiole.com/

NATÁLIA E JOSÉ

No blogue Portugal dos Pequeninos apostava-se que a saída de cena de José Sócrates seria semelhante à de Natália de Andrade quando foi ao Passeio dos Alegres.
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O problema não está aí mas na ilusão em que se vive: Natália de Andrade (1910-2004) viveu até ao fim na ilusão de ser uma grande soprano, José Sócrates tem a ilusão de ser um estadista visionário.
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Ouçamos Natália de Andrade:

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Natália de Andrade "canta" Di tale amor, do 1º acto de Il trovatore, de Giuseppe Verdi. Na realidade, o que Leonora repete é per esso morirò e não per esso vivro, título que surge na peça televisiva. Repare-se que Shegundo Galarza não perde a compostura... Há outras peças notáveis: o rouxinol e o nosso amor é verde. Os verdadeiramente fanáticos podem recorrer a http://nataliadeandrade.com.sapo.pt/