quarta-feira, 6 de março de 2019

CENAS DA GUERRA ÀS PORTAS DE LISBOA

Alguns cineastas tinham, noutros tempos, o hábito de vestir, nas cenas de reconstituições históricas toda a equipa técnica com roupas idênticas às dos atores. Era uma forma de criar ambiente e de conferir um pouco de autenticidade à ilusão que o cinema é.

Tenho passado as últimas semanas recolhendo elementos para uma exposição sobre Lisboa Islâmica. Ainda não foi necessário comprar um kaftan... Mas já tenho dado comigo às voltas na cidade antiga, olhando muros e relendo textos. Acima de tudo, relendo a Carta a Osberto. E tentando perceber como se teciam os laços entre sitiantes e sitiados, que a conquista de uma cidade não se faz sem negociação ou sem diálogo. Uma torre construída expressamente para o cerco da cidade desempenhou papel crucial na campanha que teve lugar no outono de 1147. Atente-se a este excerto da Carta:



Desmoronamento dum lanço da muralha; avança a torre móvel
Minada, pois, a muralha e atafulhada com lenha para arder, nessa mesma noite, ao cantar do galo, um pano das muralhas de cerca de trinta côvados ruiu por completo [seria na zona de Alfama, perto das Portas do Sol, e a muralha teria cerca de 60 metros de extensão].

Os mouros, pois, acorrem todos, cada de sua parte, a defender a brecha da muralha, tapando-a com uma barreira de cancelas. Foram então os colonienses e os flamengos e tentaram entrar, mas foram rechaçados. Efectivamente, embora a muralha tivesse ruído, à configuração do terreno impedia-lhes a entrada pelo simples aterro existente. No entanto, como não podiam atacá-los de perto, atormentavam-nos com o arremesso de setas incessantes e violentas, de tal forma que eles, para se defenderem e como que evitando não ficar feridos, ao manterem-se imobilizados, pareciam ouriços de espinhos.

Martins Barata (Carvão e aguarela s/ papel - Museu de Lisboa)

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