terça-feira, 30 de junho de 2020

JUNHO, MÊS DE MUSEUS

Junho é mês de museus. Moura recebeu prémios da Associação Portuguesa de Museologia em junho de 2016 (menção honrosa na secção "exposição" pelo trabalho Água, património de Moura) e em junho de 2017 (prémio "instituição do ano"). Como alguém costuma dizer "eu sei como aconteceu; eu estava lá!".

No próximo ano letivo, irei explicar, em Moura, aos alunos do Mestrado em Património quais as possíveis opções ante os recursos que temos. Como se fez a intervenção na arqueologia e nos museus 💗💗💗, áreas onde trabalho há 35 anos (esta parte custa a escrever...). Em especial, há um aspeto que importa frisar. Não há caminhos únicos, não há projetos "exemplares" nem há exemplos a seguir. Há, sim, esforço e a procura da originalidade a partir do território.


segunda-feira, 29 de junho de 2020

A OUTRA LÍNGUA

Quase podemos pensar noutro país, quando entramos em Miranda do Douro e damos com as placas informativas bilingues: português e mirandês. O mirandês ganhou, há perto de duas décadas, estatuto de língua oficial. Tem um som que me é estranho. E que me soa melodioso, quando o ouço. E que mergulha as suas raízes em falares medievais asturo-leoneses. As fronteiras são, aqui, administrativas e recentes.

Miranda fica longe de Moura e de Mértola. Mas não é o topo setentrional deste projeto. Ainda me faltam Montalegre e Melgaço. "Isto" vai a 22% do total. No final da semana passa a 33%, no final da seguinte a 45%.

domingo, 28 de junho de 2020

MILTON GLASER (1929-2020)

Morreu no dia em fez 91 anos. Um autor verdadeiramente genial, que nunca deixou de ser pop, nem de ter um toque sixties, embora não tenha ficado agarrado a modas passadas. O seu cartaz HOPE para Obama foi 100 vezes melhor que a presidência do dito. E o "I NY" fica como marca do século XX. Era difícil dizer tanto com tão pouco. Que tenha sido copiado até à exaustão é a melhor homenagem que se lhe prestou.

Viva a obra de Milton Glaser.

A MOURARIA NO FACEBOOK - DIA 5 DE JULHO, ÀS 18:30

Como a situação pandémica anda mais que desanda, resolvemos (o José Gonçalo, o José Finha e eu) avançar com a apresentação do nosso livrinho sobre a Mouraria de Moura. A sessão terá lugar no próximo domingo, às 18:30. Serão intervenientes o Prof. André Teixeira (Faculdade de Ciências Sociais e Humanas / Universidade Nova de Lisboa) e os autores. Será uma sessão curta, entre 20 a 30 minutos. E que marcará o fim da quase-saga que este livro foi.

Vamos ter livro em dois tempos:
1. Esta apresentação virtual, via facebook;
2. O lançamento, real e ao vivo, na Taberna do Liberato, logo que possível. Esperemos que o mais depressa possível.

sábado, 27 de junho de 2020

VAMOS VER O POVO, VAMOS VER O POVO...

"Ser rico deve ser uma coisa porreira...", disse aquele meu amigo, bem mais velho que eu, e soltou uma sonora gargalhada. Estávamos em casa dele, na Lapa, e na televisão passava um documentário sobre a rodagem do "Apocalypse now". Francis Ford Coppolla, deus ex machina, regia aquele exército num jeito barroco. Os meios eram impressionantes. A cena dos helicópteros foi filmada em tempo real, e sem recurso a computadores. Uma coisa de ricos.

Lembrei-me muitas vezes deste episódio, nos últimos três meses. A diferença entre uns e outros está bem espelhada naquele que é um dos palcos evidentes da diferenciação social: os transportes públicos. O presidente da Câmara de Loures, Bernardino Soares, deixou isso bem claro numa entrevista à Antena Um, a meio da semana. Há mais casos naqueles concelhos - Amadora, Loures, Odivelas etc. - precisamente porque são os sítios onde as pessoas mais usam os transportes públicos e onde não têm alternativas Têm mesmo de ir trabalhar e têm de ir assim. A todos ocorre "ser rico deve ser uma coisa porreira...". É esse o teor, com nuances, de muitas conversas que ouço nos transportes públicos.

As fantasias ambientais que se propagandeiam, as ideias dos transportes limpos, baratos e eficazes, são boas para abrir telejornais e para as páginas da imprensa dominada pelas classes A e B. A realidade, e essa eu conheço bem!, é outra. A outra realidade é a do povo. Que uma certa classe política - não o PCP, que esse está sempre onde está o povo - frequenta, com curiosidade de zoo.



Vamos ver o povo
Que lindo é
Vamos ver o povo.
Dá cá o pé.

Vamos ver o povo.
Hop-lá!
Vamos ver o povo.

Já está. 


Mário Cesariny de Vasconcelos (1923-2006) in Nobilíssima Visão (1959)

AMIANTO NAS ESCOLAS - MOURA FICA DE FORA

O Governo lançou recentemente um programa que visa eliminar as coberturas de amianto existentes em estabelecimentos de ensino. Uma medida positiva, já anunciada em novembro passado. No distrito de Beja serão abrangidas as seguintes escolas: Aljustrel – Escola Secundária de Aljustrel (Aljustrel), Escola Básica e Secundária Dr. João Brito Camacho (Almodôvar), Escolas Básicas de Santiago Maior e Mário Beirão (Beja), Escola Básica e Secundária José Gomes Ferreira (Ferreira do Alentejo), Escola Básica e Secundária de São Sebastião (Mértola) e Escolas Básicas de Abade Correia da Serra (Serpa) e n.º 1 de Vila Nova de S. Bento (Serpa).

Moura fica de fora? Sim. Já não há escolas básicas nessas condições. Durante o mandato autárquico 2013/2017 procedemos à remoção das coberturas com amianto. Um investimento substancial, feito em nome da segurança, e que abrangeu escolas e o pavilhão gimnodesportivo.

Está tudo feito? Não. Neste momento, falta substituir esse tipo de coberturas no pavilhão de exposições e na escola profissional. Estou certo que esse passo está a ser preparado.

sexta-feira, 26 de junho de 2020

MÃO PORTA, VAI BATER À TUA MORTA

Guarda - 18:08. À chegada de Celorico da Beira, um susto. Estão por explicar os efeitos nocivos na condução das más esculturas plantadas pelas rotundas da Lusitânia. Em Alpalhão era um dedo, na Guarda a mão. Aposto que, quando chegar a Montalegre, está lá um braço inteirinho.

quinta-feira, 25 de junho de 2020

COISAS DA AMIZADE

"Tenho aqui um máquina para ti". Tens o quê, respondi receando não ter ouvido bem. "Sim, uma máquina fotográfica, não me entendo com o viewfinder, é uma PRAKTICA".  Uma FX 3. Mais espantado fiquei. São máquinas à antiga, robustas, com boas óticas. Coisas sérias e que merecem um tratamento como deve ser. Dias depois, em frente ao matadouro, e ante a minha (mais uma...) surpresa, aparece-me o José Gonçalo Valente com a relíquia, "toma, é tua". E arrancou-me, deixando de máquina na mão.

Dentro de dias entra em cena. Com os incontornáveis FP4 e HP5, os rolos de sempre. Com a idade, fixamo-nos a pormenores.

Há coisas assim, e momentos assim. E amigos assim. Este ano não haverá escavações no castelo. Mas ainda temos um par de coisas para fazer. E um livro para lançar. E mais o que se verá, em 2021.

quarta-feira, 24 de junho de 2020

DEDO ALPALHOENSE

Mais um cume na arte do kitsch. Entre Crato e Castelo de Vide entro em Alpalhão, para comprar uma garrafa de água. Subitamente, isto. É certo que a igreja matriz não é monumento classificado mas é um bonito edifício. E não merecia aquele dedo. Não me dei ao trabalho de decifrar o significado da coisa. Só me ocorria o hábito de outrora nos cafés. O dedo ao alto e o pssssttttt, para chamar o empregado.

terça-feira, 23 de junho de 2020

VIVER OS MUSEUS NO FERIADO MUNICIPAL

No Feriado Municipal da minha terra, os museus vão, este ano, ter um papel principal. Parece-me bem. Tudo tem uma lógica e uma explicação. Os meus alunos irão visitar Moura, no próximo semestre.

segunda-feira, 22 de junho de 2020

PREOCUPAÇÃO

Já há semanas tinha acontecido. Andámos a vaguear por Vila Real de Santo António, até encontrarmos, com pouco fortuna, um sítio para jantar. Hoje, a cena repetiu-se. Depois de quase desistir de tentar jantar, em Elvas, acabei por ter a fortuna de, ao acaso, encontrar um bom sítio, o "Acontece".

Só me ocorre uma palavra: preocupação. Por mais que me digam que vai tudo ficar bem, não creio que isso vá acontecer. Soluções miraculosas não há. O caminho vai ser muito difícil e muito lento. Para mal de todos nós.

domingo, 21 de junho de 2020

TRIPLA CELEBRAÇÃO

Foram três dias num só, duas datas privadas e mais a ida à Igreja de São João, em Moura. A recolha de imagens para o projeto Duarte Darmas levou-me a pedir ajuda ao Pároco de Moura, Padre José Manuel Guerreiro. Não só tive todas as facilidades, o que implicou uma ofegante subida ao campanário da igreja, para fazer fotografias, como pude constatar a magnífica organização da missa. A imagem, tirada do coro alto, atesta-o. Sempre tive a convicção que é possível manter calendários, iniciativas e celebrações. Não pode é isso ser feito com multidões, com pessoas aos magotes, na base do improviso ou na lógica do "antes". O "antes" vai tardar a regressar, convençamo-nos disso.

sábado, 20 de junho de 2020

UM POUCO DISCRETO CONVITE À REBALDARIA

Escreve Daniel Oliveira no Expresso:

"A paciência acabou esta semana, quando se confirmou que entidades sediadas ou com filiais em paraísos fiscais fora da UE podem concorrer sem qualquer restrição aos apoios extraordinários do Governo. Fogem a pagar os impostos cá, mas têm direito a usar os impostos dos de cá. Com prioridade sobre muitos cidadãos desesperados. 
As perdas fiscais de milhares de milhões anuais não são uma fatalidade, resultam de cumplicidade. Com assinatura: PS, PSD, CDS e IL. E a conveniente ausência do Chega. Fossem uns tostões para beneficiários do RSI e Ventura gritaria presente. Já para aborrecer quem lhe paga...".

É raro que esteja tão de acordo com Daniel Oliveira como hoje. A verdade é que só o PCP, os Verdes, o Livre e o BE estiveram contra esta inacreditável medida. Os nossos impostos vão financiar quem foge aos impostos. Nem o D. Corleone se lembraria de tal coisa.

A DISTOPIA, AO VIRAR DA ESQUINA

Nunca pensei que um banal filme de pancadaria (mea culpa, mea maxima culpa, gosto de ver filmes de pancadaria...) se pudesse tornar premonitório. Esta cena do filme O homem demolidor, de 1993, está quase a acontecer. Não vai ser preciso esperar por 2036.

sexta-feira, 19 de junho de 2020

O DETALHE ESTÁ NO RADAR...

Para quem hoje usa o autocarro Lisboa-Paris na TAP (na Easy Jet nunca fiz este percurso e recuso-me a entrar na Ryanair) este menu do início dos anos 60 parece uma coisa de conto de fadas. Mas o pormenor mais divertido no menu é o solene aviso "Em Super Constellation com radar". Não fosse o viajante desconfiar que andavam às apalpadelas para encontrar o caminho.

Mas vale a pena ler a lista de iguarias. Parece um casamento.

Tal como vale a pena ver o blogue https://restosdecoleccao.blogspot.com


quinta-feira, 18 de junho de 2020

ENIGMA TOPOGRÁFICO-POLÍTICO, EM OLHÃO

Ontem, a meio da tarde, precisei de uma indicação para encontrar um determinado edifício, em Olhão. Esquecera-me do telemóvel no carro e orientava-me só pelo faro. A rua estava quase deserta. Só um homem à vista. Cumprimentei e perguntei. Solícito, informou "é muito perto; segue em frente e, no cruzamento onde está a loja xis, vira à direita". E abanou, energicamente, a mão esquerda. Intrigado, sugeri "não será à esquerda?". Olhou-me, surpreso, "esta é a esquerda?". Confirmei. Respondeu "ok, então vira à esquerda". Consegui, com um esforço homérico, ficar sério como um cardeal.

O edifício era perto. Fotografei e voltei para o carro.

Fiquei na dúvida. Ou tinha encontrado o maluco oficial de Olhão (todas as terras pequenas têm um) ou dera de caras com mais um que daqueles que confunde, a todos os títulos, esquerda e direita.

A PROPÓSITO DE HIPOCRISIA

A hipocrisia e a mentira são irmãs gémeas. Ao lado delas está o bem-parecer. Desse minueto de sorrisos falsos se alimenta muita gente.
Squelette arretant masques (1891) - James Ensor
AS PESSOAS SENSÍVEIS
As pessoas sensíveis não são capazes
De matar galinhas
Porém são capazes
De comer galinhas
O dinheiro cheira a pobre e cheira
À roupa do seu corpo
Aquela roupa
Que depois da chuva secou sobre o corpo
Porque não tinham outra
O dinheiro cheira a pobre e cheira
A roupa
Que depois do suor não foi lavada
Porque não tinham outra
“Ganharás o pão com o suor do teu rosto”
Assim nos foi imposto
E não:
“Com o suor dos outros ganharás o pão”.
Ó vendilhões do templo
Ó construtores
Das grandes estátuas balofas e pesadas
Ó cheios de devoção e de proveito
Perdoai-lhes Senhor
Porque eles sabem o que fazem.

Sophia de Mello Breyner Andresen

terça-feira, 16 de junho de 2020

DOM SEBASTIÃO

Ao meio da tarde de hoje, devo estar em frente a esta estátua.

Recordo-me bem de a ter visto, no verão de 1974. De a ter achado estranha e diferente de tudo o que via nos livros de História. Tal como me recordo das críticas ferozes dos amigos dos meus pais que moravam em Lagos. Quase 50 anos volvidos, a estátua tornou-se um símbolo da cidade. Isso diz bem da perenidade de algumas coisas.

Ainda "não se lembraram" desta. Valha-nos isso.

segunda-feira, 15 de junho de 2020

ROAD ART - ENTRE ALVESS, JACKIE STEWART E JOHN CLEESE

À saída da primeira rotunda, ouvi um ploc surdo. À saída da segunda, outro. Estranhei, mas não vi nada. Acelerei e, à passagem pela Rádio Renascença, houve uma revoada de plocs. Vi, pelo retrovisor, livros esvoaçando. Parei e saí para apanhar os restos do disparate. Tal como John Cleese em "Um peixe chamado Wanda", pusera os livros em cima do tejadilho e esquecera-me deles. Depois, conduzira à Jackie Stewart, naquela coisa da Formula Finesse, com a bandeja em cima do carro, fazendo manobras sem que a bola saltasse. Só assim se explica que boa parte dos livros permanecesse, sossegadamente em cima do tejadilho, várias centenas de metros após o começo. Rua fora tinham ficado, irrecuperáveis, uns 10 exemplares do livro "Caligrafias". Que se lixe, pensei. Alvess mandava, na sua mail art, desenhos a desconhecidos, sorteados ao acaso na lista telefónica de Paris. Eu acabava de converter a mail art em road art, espalhando livros de fotografia Buraca fora. Com menos talento que Alvess, mas com convicção.

Isto foi só o começo. O resto do dia foi também caótico, muito obrigado.

domingo, 14 de junho de 2020

COMO MORRE UM CASTELO

Um artigo do El Pais, sobre a morte de um castelo andaluz, avivou-me um episódio pouco conhecido em Moura, sobre o desaparecimento das chamadas "muralhas árabes".

A perda de funções militares do castelo, no início do século XIX, levou a que essas muralhas fossem vendidas. As razões foram de ordem prática. Feitos na chamada taipa militar - com forte incorporação de cal -, davam azo à formação de imenso salitre. O que se passou, de seguida, foi rápido, prático e dramático. Sendo o salitre essencial à "indústria da guerra" foi decidido usar como matéria-prima as muralhas mais antigas de Moura. Em poucos anos, instalou-se uma fábrica na cidade, que "transformou" as magníficas muralhas do século XII em pó. Literalmente. Restou o grande torreão que está por cima da biblioteca.

Vale a pena ler o precioso livro de João Manoel Cordeiro, que explica como tudo se passou.




Ver - https://books.google.pt/books?id=Dj9YAAAAcAAJ&printsec=frontcover&hl=pt-PT&source=gbs_ge_summary_r&cad=0#v=onepage&q&f=false

E também:

http://www.santiagomacias.org/publi.php?livros

sábado, 13 de junho de 2020

BRAXTON RUTLEDGE

Passou, há dois dias, num daqueles canais que raramente passam grandes filmes. Sergeant Rutledge (1960), não é um dos melhores John Ford. Os diálogos são piores-que-o-Deus-me-acuda... O remate é quase pueril. Mas o fundo do argumento (a cor de um homem enquanto justificação para atribuir um crime) está mais que atual, 60 anos volvidos. Não duvido que este filme tenha tido grande impacto, social e político, no seu tempo. Que continue tão atual é motivo de preocupação.

sexta-feira, 12 de junho de 2020

CIDADE BRANCA

Esta pintura quase encerraria um projeto que a pandemia levou. O melhor, talvez se faça, "reformatadamente". Nem fazia parte do alinhamento original, porque não a conhecia. Um feliz acaso levou-me, uma manhã, à Fundação Arpad Szenes - Vieira da Silva. Ganhou ali novo significado a expressão cidade branca. Que, na verdade, só o é de forma figurada.

Este guache de Maria Helena Vieira da Silva (1908-1992) passaria a ter lugar de destaque num final de percurso. Até porque, estranhamente, numa cidade como Lisboa, não há muitas representações do Castelo de S. Jorge: Carlos Botelho, Maluda, Carlos Calvet... Depois, há autores mais antigos, como Alfredo Keil ou Alberto de Souza.

Nunca em tal tinha pensado, depois o facto não deixou de me espantar.

quinta-feira, 11 de junho de 2020

CONTOS DA LOUCURA NORMAL - VERSÃO PATRIMÓNIO

Das duas, uma:

Ou isto foi obra de um brincalhão (fiquei com essa suspeita ao ler século XXVI);
Ou então, estamos muito pior do que se podia imaginar...

RECICLAGEM E CIVISMO

A fotografia foi feita às 11:02:54 (os telemóveis são o nosso big brother de bolso). Junto à rotunda, em Mértola, o "espetáculo" era este. Sem justificação alguma. Os serviços da RESIALENTEJO fazem a recolha com regularidade e há muito que deixei de andar de ecoponto em ecoponto, à procura de espaço. O "azul" estava praticamente vazio. Bastaria um pouco de trabalho e isto não teria acontecido. Quem ali despejou os cartões fê-lo para não ter trabalho e para não se incomodar.

Bonito serviço!

QUANDO OS JORNALISTAS QUEREM SER MINISTROS E JUÍZES...

Assisti, no outro dia, a um entrevista a quatro importantes decisores da área financeira. Foi num canal televisivo. Não consigo explicar devidamente o meu espanto. O jornalista tratava os seus interlocutores de igual para igual. Não é que não tivesse de colocar questões incómodas. Era essa a sua missão e até colocou algumas. O que me deixou siderado foi a atitude. De igual-para-igual, numa de "sei tanto quanto tu sabes". Arrogância, pesporrência e magistério. Que, noutra vertente, descamba para o jornalismo justiceiro. Que dá para tudo, numa pesquisa de lixo.

Muitos estão ao serviço de poderes paralelos. Um dos melhores exemplos foi lambe-botismo de tantos no ataque ao PCP e à Festa do "Avante!". E na promoção de um político fascista que, sem a ajuda dos media, teria o silêncio que merece.

Precisamos de um jornalismo forte, atento, qualificado e independente? Sem dúvida. Outra coisa, bem diferente, é que alguns jornalistas se queiram substituir ao Governo e à Justiça. Em nome sabe-se lá de quê.

quarta-feira, 10 de junho de 2020

A CAIXA DE PANDORA DA ESTUPIDEZ

Claro, era inevitável que acontecesse. Depois das estátuas, vêm os filmes. "E tudo o vento levou" foi retirado de um catálogo porque o racismo blablabla. Depois, virão os quadros e as esculturas. Etc. É um nunca mais acabar. Como é que se explica à trupe de fanáticos que não é apagando a História que ela se explica? Como é que se clarifica que o racismo de "E tudo o vento levou" - por favor, não lhes mostrem "O nascimento de uma nação", de Griffitth, que é do piorio... - não deve ser ocultado, mas sim mostrado uma vez e outra?

Hoje é Dia de Camões. Que era poeta e tinha um escravo negro. E agora? Queimamos os sonetos?

LYON: 15 ANOS

Quando recebi a primeira carta, com um vasto lote de documentação, fiquei apreensivo. O processo burocrático era longo e minucioso. Pior, tinha de ir a quatro sítios diferentes, e ia estar só dois ou três dias em Lyon, cidade que não conhecia. Só depois de comprar uma planta da cidade me dei conta que o Quai Claude-Bernard, a Rue Raulin, a Rue Jaboulay, a Rue Chevreul, a Rue Pasteur estavam ao lado umas das outras. Inscrevi-me no doutoramento no outono de 1996. Fiquei poucas vezes em Lyon. Preferi sempre o conforto da Biblioteca Nacional, em Bercy, a lúgubre, mas bem fornecida, Biblioteca do Instituto Nacional das Línguas e das Civilizações Orientais, a do Instituto do Mundo Árabe e, em casos pontuais, a de Estudos Árabes, em Paris IV.

Foi um percurso longo, entre outubro de 1996 e junho de 2005. Desnecessariamente longo, entrecortado e com outras coisas pelo meio. Foram muitas as idas a Lyon, sempre de combóio "notre TGV, à la destination de Lyon-Perrache", para estadas curtas. Por diversas vezes, no próprio dia, chegando à cidade às 9 horas e regressando a Paris às 19.

A fotografia data de 10 de junho de 2005. Passaram 15 anos. Não voltei a Lyon, desde essa data.


Da esquerda para a direita: o autor do blogue, efusivamente abraçado por André Bazzana (CNRS), que esconde Cláudio Torres (CAM). E mais Maria da Conceição Lopes (Univ. de Coimbra), Christophe Picard (Univ. Paris I) e Pierre Guichard (Univ. Lyon 2). Do grupo, só a Conceição Lopes e eu estamos ao serviço ativo. O tempo passa...

terça-feira, 9 de junho de 2020

A PROPÓSITO DE SOLIDARIEDADE

Confunde-se, amiúde, a ideia de solidariedade com caridade. Uma e outra não são, sequer, as duas faces de uma moeda. A propósito do calor da solidariedade aqui fica um poema de Alexandre O'Neill (1924-1986). Foi escrito no ano quente de 1975.

A CAMA QUENTE

Homenagem aos mineiros do Chile
que dormem, singelo,
pelo sistema de "a cama quente"


Na mina trabalha-se por turnos.
Quando se volta, nem se tiram os coturnos.

Bebido o café negro e trincado o casqueiro,
joga-se o corpo ao sono, mas primeiro,

enxota-se o camarada da cama ainda quente,
que não há camas, no Chile, pra toda a gente.

Do calor que sobrou o nosso se acrescenta
pra dar calor ao próximo que entra.

Vós, que dormis em camas, como reis,
tantas horas por dia, não sabeis

como é bom dormir ao calor de um irmão
que saiu ao nitrato ou ao carvão

e despertar ao abanão (é o contrato!)
de um que chega do carvão ou do nitrato!

É este sistema, minha gente,
que se chama no Chile "a cama quente"...


A Serra Pelada, na objetiva de Sebastião Salgado

IVAN, O TERRÍVEL

Cada filme de Eisenstein é uma lição de como fazer cinema. Cada um dos seus filmes me marcou de forma profunda. Ora pela montagem, ora pela banda sonora (nada se aproxima daquele Prokofiev...). Mas, sobretudo pelo jogo de luzes e de sombras. Pelas máscaras que as luzes rasastes criam. Pela coreografia dos gestos. Eisenstein ficou a dever parte do seu sucesso a outro génio, hoje esquecido, que foi Eduard Tisse (1897-1961). Raras filmes vi filmar assim, com aquela limpidez e aquele recorte.

segunda-feira, 8 de junho de 2020

O CROCODILO OU "À TERCEIRA É DE VEZ"

Em 1972 foi o leão de Rio Maior. Em 2014 haveria um tigre à solta em Paris. Nada, eram rumores. Agora, parece que é a sério. Anda um crocodilo-do-nilo nas águas do Douro. Ainda está em fase de crescimento (atinge cerca de 4 metros na idade adulta), mas já representa perigo.

Mas quem, meu Deus!, é que se lembra de ter um crocodilo como animal doméstico? Essa é a pergunta que toda a gente que ouve a notícia se coloca.

domingo, 7 de junho de 2020

TODA A CRIATIVIDADE DA TOPONÍMIA

Sempre gostei de registar toponímia criativa. Tenho apanhado de tudo um pouco. Ontem à noite, foi a vez deste nome. RUA DA CASINHA DO CONSUMO? É todo um leque de especulativas possibilidades que se se abrem. Não há ali nenhum supermercado, em todo o caso.


sábado, 6 de junho de 2020

SAÚDE E FRATERNIDADE

Achei graça aos últimos mails de um amigo, que passou a usar, como fórmula de despedida, "saúde e fraternidade". Numa conversa esta manhã, questionou: "São duas coisas de que precisamos, não é? Saúde e fraternidade". Sem dúvida que sim. Foi uma conversa clara e objetiva. E, também, fraterna.

A saudação "saúde e fraternidade" é republicana. Esteve em vigor até abril de 1933, quando foi substituída pelo "A bem da Nação". A seguir ao 25 de abril tenho ideia - estarei a efabular? - que os ofícios passaram a ser fechados com um "A bem da República". A partir de outubro de 1974, a portaria 672/74 determinou que "toda a correspondência oficial deve ser expedida sob a fórmula: «Serviço da República» (S. R.) e terminará pela expressão: «Com os melhores cumprimentos". Minudências que o tempo eliminou.

Haja, pois, saúde e fraternidade.

Ver: https://coisasinfungiveis.wordpress.com/2017/11/29/saude-e-fraternidade/

sexta-feira, 5 de junho de 2020

SINES – ALI NÃO HÁ NADA DO PERÍODO ISLÂMICO...

No final dos anos 70 do século passado, a arqueologia medieval era, tal como a televisão que nos entrava em casa, ainda a preto e branco. Era tudo muito sim ou sopas, de certeza ou nem pensar nisso. Num país sem arabistas portugueses dignos desse nome – creio que, hoje em dia (e pedindo desculpa por qualquer involuntária falha) apenas António Rei pode ser referido – os estudos islâmicos faziam-se a partir de dados físicos. Da arqueologia de terreno, que balbuciava as primeiras sílabas em Silves e, sobretudo, em Mértola. As limitações eram evidentes. Algum negacionismo imperava quanto à presença islâmica em vários sítios do sul, “há o período romano, depois não há mais nada até depois da Reconquista”.

Sem entrar aqui em detalhes inúteis, a verdade é que há, a sul do Tejo, muitos sítios romanos que conheceram ocupações importantes na Alta Idade Média, que se prologaram pelo período islâmico. Numa contabilidade grosseira, um pouco mais de dois terços dos fragmentos arquitetónicos da Antiguidade Tardia – muito tardia, por vezes... – concentram-se em três locais: Beja, Mértola e Sines. As duas primeiras conheceram importante ocupação no período islâmico, já para Sines se dizia “ali não há nada dessa época...”.

Há perto de 30 anos, criou-se “um facto arqueológico”. Cláudio Torres identificava Sines como sendo a Marsa Hashim das fontes islâmicas. Sendo que, desde Lévi-Provençal (1894-1956), se fazia coincidir esta última localidade com Castro Marim. O ponto de partida é um texto de al-Himiary, um autor magrebino do século XIV que se baseou em escritos anteriores. A sua obra tinha o extraordinário título de “O livro dos jardins perfumados” e dava-nos esta colorida descrição: “perto de Mértola, junto ao mar, encontra-se Marsa Hashim. É uma fortaleza antiga, onde se encontram ruínas antigas, assim como uma grande igreja que foi construída sob o reinado de César Diocleciano (Kasliyan). É ao reino deste imperador que remonta igualmente a igreja de Toledo”. Com desarmante simplicidade, Cláudio Torres baseava a hipótese da correspondência entre Sines e Marsa Hashim em dois argumentos: o filológico e o histórico-artístico. Em relação ao primeiro, a explicação era bem direta: marsa é porto em árabe e sines/hashim deriva do latim sinu- (enseada). O segundo era não menos claro. A enorme quantidade de fragmentos arquitetónicos de qualidade indiciava a nobreza de um edifício que ali existira.

E depois? Depois, nada. Cláudio Torres ouviu um nutrido coro de assobios e a sua proposta foi desvalorizada. Não faltou quem ridicularizasse a argumentação apresentada. Afinal, nunca se encontrara nada islâmico em Sines... Intimamente pensei “ele tem razão” e passei a citar o local da costa alentejana como Marsa Hashim. Era pouco lógico que um dos raros pontos de abrigo seguros entre Tróia e o Cabo de S. Vicente tivesse sido, pura e simplesmente, abandonado.

Em tempos recentes, a arqueologia tem vindo a detetar ribats (pequenos espaços fortificados destinados à oração e à vigilância da costa) no litoral: junto à praia da Maçãs, perto de Lisboa e perto de Arrifana, no concelho de Aljezur. A estes dois ribats, há que juntar outro, em Sines. Acabado de construir em maio de 1009, conforme atesta uma lápida descoberta junto ao castelo da cidade. A inscrição repõe a verdade e a lógica das coisas. Marsa Hashim é Sines. E não só o sítio teve ocupação em época islâmica, como era um sítio relevante.

Cláudio Torres bem podia recordar o célebre dito “quem ri por último...”. Não creio que perca tempo com isso.

Crónica publicada hoje, no "Diário do Alentejo"

quinta-feira, 4 de junho de 2020

UM POUCO MAIS DE SOL

As semanas tinham corrido um pouco mal. Não muito mal, na verdade. Tinham sido sofríveis. Dois meses e meio de peste, trabalhar de manhã à noite, concluir artigos e livros, dar aulas à distância, falar com muita gente ao telefone, alguma incerteza, mas não em coisas decisivas, em temos pessoais. E estava em casa, com a família, pela primeira vez em muitos anos.

Em volta, havia e há bem pior. Empresas que fecham, o lay-off que se torna lei em on, o desemprego que aumenta, investimentos que foram ao ar e futuros adiados. O País respondeu com calma e percebeu-se a importância do Estado. Até o fascista de turno, que queria privatizar Saúde e Educação, se calou e foi pregar outras demagogias. O pavão da Iniciativa Liberal meteu, por agora, a viola no saco e remeteu-se a um benfazejo silêncio.

Razões de reclamação pessoais não tenho, portanto. Mas o mundo em volta tornou-se bisonho e algo sombrio.

Estava eu, na sexta, dia 29, num resmungar lento e introvertido, quando o telefone tocou. Eram 18.36 e o dia tinha sido como no “king”, quando damos vazas para negativos. Do outro lado, ouço a voz do António. Um velho e querido amigo vinha dar-me notícias. Estava manifestamente satisfeito. Acabara de rever mais um livro. Uma tarefa normal num historiador, um pouco menos normal quando se tem 91 anos. Como é o caso do António. Sem me dar tempo a respirar, desfiou o conteúdo do livro. Falou de colegas, e narrou-me um episódio surpreendente passado com Jorge Borges de Macedo. Elogiou-o e estamos de acordo que “A situação económica no tempo de Pombal” continua a ser, com 70 anos, um livro genial. Falou do Partido e da velha amizade com Álvaro Cunhal. Discorreu sobre Leibniz, tema que me é desconhecido, mas que o apaixona há muito. A meio da conversa, a luz abriu-se um pouco. Dei comigo a pensar “que razões tens tu para lamúrias, quando dás com este otimismo fantástico aos 91 anos?”. Dos tempos na prisão, no Forte de Peniche, saltou para os Mártires de Marrocos. Falei-lhe desse projeto em curso. Comentou, rapidamente, “como bem sabe, os mártires são-me familiares, fizeram parte do meu percurso no seminário”.

A dada altura, a conversa trouxe-me à memória um conto de Mário Dionísio em que um homem, só por assobiar uma melodia, anima a carruagem do elétrico. O António fizera-me ganhar o dia. Sem que ele soubesse bem porquê, agradeci muito ter-me telefonado. Foram mais de 20 minutos de luz e calor. Foi um pouco mais de sol, no final da tarde.

Crónica publicada em "A Planície"

quarta-feira, 3 de junho de 2020

DA CIDADE-LUZ

Vinha tudo de Paris... Nas primeiras décadas do século XX ainda não chegara a vez dos Estados Unidos, como farol cultural do Ocidente. Fui dar com esta preciosidade no meio de um projeto de Porfírio Pardal Monteiro. É claro que, uma vez mais, farei figura de Neanderthal ao dizer que as cópias heliográficas (os chamados blueprints) são 1000 vezes mais bonitas que os autocads. Mas acho mesmo que é assim.

Neste projeto o que vinha de Paris eram as torneiras. Eh, oui. Para edifícios de prestígios não iam comprar torneiras à drogaria da esquina. Estas vinham da Rue Berthollet.

terça-feira, 2 de junho de 2020

O GLORIOSO REGRESSO DO WM

Quando cheguei à cantina, estava tudo sentado em harmónio. Um lugar de separação entre cadeiras e todos em rigorosa e mui organizada décalage. Os comensais não podiam ter ninguém à sua frente, mas, apenas e só, nas diagonais. Fiquei a pensar "isto é o WM em versão covid".

O que é o WM (a explicação é obrigatória para quem tem menos de 50 anos)? É/era um sistema tático, também definido como 3-2-2-3, que há muito deixou de ser praticado. Não querendo dar uma de Gabriel Alves, mas a verdade é que estes temas em tempos me interessaram. O WM, embora esquecido (ou quase...) teve papel importante no futebol dos anos 30.

Hoje joguei sozinho. Amanhã, volto a jogar com a equipa.

segunda-feira, 1 de junho de 2020

FEZ HOJE TRÊS ANOS

O tempo voa. Faz hoje três anos que o Continente abriu portas em Moura. Um processo algo difícil, mas consumado num prazo relativamente curto. Um bom negócio, que trouxe vantagens à Câmara e ao concelho. Uma história contada em detalhe, num livro que aguarda altura apropriada para sair à luz do dia.

Não deixa de ser engraçado ver, ler e ouvir o que ontem se dizia e o que hoje se diz. Sobretudo, é muito interessante ver e ler o que os inimigos figadais do projeto diziam e aquilo que hoje dizem. O projeto só era mau naquela lógica da raposa e das uvas: "estão verdes, não prestam, só os cães as podem tragar".

O processo concluiu-se e um terreno sem préstimo passou a estar ao serviço da nossa terra. Ao ler elogios, recentes e surpreendentes, ao CONTINENTE não pude deixar de sorrir.

Foi no dia 1 de junho de 2017.


Apareceu, entretanto, no facebook, esta fotografia, onde estou no meio de uma ação de protesto. Data, de certeza, do mês de maio de 1985. Pertencia à Direção da Associação de Estudantes e participei ativamente naquele processo. Que era de combate a uma perseguição a professores de esquerda da faculdade. Lixei ali a possibilidade de iniciar uma carreira académica a seguir à licenciatura. Ainda bem. Muitas vezes pensei, ao longo da vida, que tomei / tomámos a decisão certa.


O que é que a Associação de Estudantes e a abertura de um supermercado têm em comum? A convicção de se fazer o que se acredita. Sem meias tintas nem calculismos. Acreditando na justeza das decisões. Foi assim e assim será.