Abriu o processo de candidaturas, com ligeiras modificações no regulamento. Têm sido premiados projetos e intervenções de reconhecido mérito.
Candidaturas até 31 de janeiro de 2022.
Ver: https://gulbenkian.pt/fundacao/premios/premio-vasco-vilalva/
Abriu o processo de candidaturas, com ligeiras modificações no regulamento. Têm sido premiados projetos e intervenções de reconhecido mérito.
Candidaturas até 31 de janeiro de 2022.
Ver: https://gulbenkian.pt/fundacao/premios/premio-vasco-vilalva/
Dizia-me, em tempos, um amigo, que os semáforos em Bombaim eram (ainda serão?) como as árvores de natal. Muito coloridas, muito faiscantes, mas só de efeito decorativo. E isso será só em Bombaim? Não. A tendência lisboeta nesse domínio é crescente. Já não se passa com o amarelo ou com o vermelho acabado de cair (o que não se pode, mas enfim...). É mesmo com o sinal fechado. Ontem, na Rua da Venezuela, ultrapassou-me um carro que passou por um vermelho, fechado há longo segundos. A rua estava vazia, é certo. Mas que esta moda está a ficar perigosa, lá isso está.
Hoje à tarde haverá livro, na Feira de Mértola: Relatório circunstanciado de uma vida a dois. Escrito pela Manuela. Só o vou "encontrar" na quarta-feira, quando rumar a Mértola, para um início de mês à beira-Guadiana.
Achei graça à coincidência. Repito o que já por aqui se escreveu, há muitos anos:
Um belo meio de tarde com muita gente na sala (50 pessoas, nos dias que correm, a um sábado à tarde assim meio frio é muita gente) com dois amigos de Mértola: o Miguel e o José Miguel. Um cantar de amigos, por entre as palavras da Liberdade. Que o mesmo é dizer por entre as palavras da Esperança. O tempo da tarde passou depressa. Espero que se repita.
Uma máscara entre o grego e Wes Craven. Ou estarei a imaginar coisas?
Ouguela (Campo Maior)
18.12.2020 (12:13)
Não sou fotógrafo. Não tenho essa veleidade. O contacto que me foi feito pelo Jorge Calado surpreendeu-me. Para integrar uma exposição e um catálogo. "Euu, Jorge? Sim, você!". Mais fiquei quando, ao chegar a Vila Franca de Xira, me vi em ilustres companhias (António Pedro Ferreira, Kees Scherer, Pierre Verger. José Manuel Rodrigues, Édouard Boubat, etc.). Não fiquei nem vaidoso, nem orgulhoso, nem convencido que sou fotógrafo. Fiquei, só, imensamente divertido, "caramba! esta é daquelas que nunca me teria passado pela cabeça". É mesmo daqueles momentos excecionais que nos acontecem, de forma inesperada e que são mais engraçados por isso mesmo.
Ontem, fui buscar os meus exemplares do catálogo. E visitei, uma vez mais, o Museu do Neorrealismo, um espaço excelente e com uma programação que continua, sem hiatos, de calendário ou qualidade, há muitos anos. Disse isto à vereadora Manuela Ralha e não foi por simpatia de circunstância.
Começa no domingo e vai até julho de 2022. É o ciclo "Música no Panteão", com direção artística de Paulo Amorim (Conservatório Nacional). Esta é uma das três vertentes de intervenção preconizadas para o monumento: programação / infraestruturação / investigação. O concerto seguinte é já no dia 5 de dezembro.
Foi um grande êxito na voz de Ketty Lester (n. 1934). Há outras versões, mas gosto mais desta. Love letters straight from your heart.
A Forma e o Conteúdo. O que é importante é o nome. Pois claro. Se não se chamar Faculdade ou Universidade é porque não é sério. Nomes antigos e bonitos como Escola de Belas-Artes ou Instituto Nacional de Educação Física assim desapareceram. Durante muitos anos, a França resistiu a essa vaga e tinha escolas com nome improváveis como École des Ponts et Chaussées (literalmente Escola de Pontes e Pavimentos) ou École de Commerce (Escola de Comércio). Eram os grandes estabelecimentos de ensino gauleses. Ao primeiro já acrescentaram o "tech", ao segundo o "business school". Deve ser mais sério, assim... Resistem, ainda, a École Nationale d'Administration, a École Polytechnique (de alta qualidade, apesar de serem apenas escolas) e algumas mais. E, entre nós, o Instituto Superior Técnico, que não não se chama faculdade nem universidade...
Ah! E temos as Autoridades! Essa lusitaníssima macaqueação das Authorities amaricanas.
Um concurso já não um concurso. É um procedimento concursal.
E o boletim de vacinas já não se chama assim. É uma ficha vacinal. Recebi no outro dia a minha ficha vacinal. Fiquei desvanecido com a criatividade do nome.
Pergunto-me sempre, mas sempre mesmo: quem serão os obscuros e imerecidamente desconhecidos poetas do burocratês que inventam tão sublimes expressões?
Um clássico intemporal.
Luis D'Antas tomou posse do castelo de Noudar no dia 3 de junho de 1516. O cerimonial de entrega e o inventário que o novo alcaide fez são bem conhecidos dos historiadores e estão transcritos no texto "Auto d'uma posse do Castello de Noudar e inventário do que lá exisitia no século XVI", de Pedro de Azevedo. O texto foi publicado no vol. V de "O archeólogo portuguêz", de 1900.
Que relata Luís D'Antas?
Que "a casa que está em cima da dita torre [de menagem] está derribada e no chão, e toda a água que nela cai cala a torre e vai abaixo".
Que há um portado "com duas portas com duas armelas e sem ferrolho nem fechadura e uma delas tem a couceira quebrada".
Que há "sete armaduras de cabeças muuito antigas e quebradas".
Que há "uma faldra e gossete de malha grossa muito ferrugenta e quase podre"
Que há "seis bocetes da mesma sorte e ferrugentos".
Que há "uma alpartaz (?) de malha muito ferrugenta e podre".
Que "na primeira casa que serve da câmara [há] duas janelas com suas portas sem aldrabas (...) e esta casa [está] mal reparada do telhado". E "na dita casa [há] uma tripeça de pau da Guiné quebrada de um cabo e dois bancos velhos e um taipal velho".
E mais:
"todas as outras casas do dito castelo todas derrubadas e sem telhados" [com exceção de uma, que servia de estrebaria...].
"em todas as portas da vila não há nenhumas portas, senão uma só quebrada, que jaz no chão".
etc. etc.
Ou seja, o novo alcaide fazia um relato catastrófico do que o antecessor lhe legara. Uma forma de justificar o que vem a seguir.
Em Loures, a história repete-se, pela enésima vez. Ameaça-se com auditorias e com o Ministério Público e com supostas matérias criminais. Vou aguardar, com muitíssima curiosidade. No mínimo, muitíssima curiosidade.
Notre-Dame, une fin d'après-midi data de 1902. Matisse viu assim a catedral. Sorte nossa, que ele viu mais e melhor que nós. Espantosamente colorida, coisa difícil no céu quase sempre cinzento daquela cidade. Uma Notre-Dame violeta e assim meio misteriosa.
O quadro está na Albright–Knox Art Gallery, um museu de arte situado em Buffalo, no extremo ocidental do estado de Nova Iorque. Site: https://www.albrightknox.org
Fecha-se o arco-íris de Matisse.
O colóquio da próxima semana terá, no seu encerramento, uma mesa-redonda. Com a presença de senhoras que, de uma forma ou de outra, têm responsabilidades na área do mecenato:
*
Dra. Maria Cândida Rocha e Silva (Presidente do Banco Carregosa)
* Dra. Maria João Carioca (Administradora Executiva da Caixa Geral de Depósitos)
*
Dra. Vera Pinto Pereira (Presidente do Conselho de Administração da Fundação
EDP)
* Profª. Doutora Maria João Neto (Instituto de História da Arte - Fac. de Letras de Lisboa), que será a moderadora.
Que caminhos futuros para o mecenato? Dia 26, às 17 horas, no Palácio dos marqueses do Lavradio.
Programa completo em:
https://coloquiomulheresmecenas.dgpc.pt/
E pronto! Dezassete (17) anos depois de, pela primeira vez, ter pensado nisto, eis que o livro começa a ser impresso. Ontem, foi dia de escolher o pantone das guardas. E de corrigir, pela quinta vez, a página 52.
20 sítios visitados, numa saga de idas e vindas (porque a luz não está no sítio certo, porque foi necessário reverificar a topografia, porque não gostei da primeira versão dos enquadramentos etc.):
Alandroal - quatro deslocações
Alpalhão - três deslocações
Arronches - três deslocações
Assumar - duas deslocações
Campo Maior - quatro deslocações
Castelo de Vide - quatro deslocações
Elvas - quatro deslocações
Juromenha - três deslocações
Mértola
Monforte - três deslocações
Monsaraz - quatro deslocações
Montalvão - quatro deslocações
Moura
Mourão - três deslocações
Olivença - duas deslocações
Ouguela - três deslocações
Noudar - três deslocações
Nisa - quatro deslocações
Serpa - quatro deslocações
Terena - quatro deslocações
Nem quero pensar no número de quilómetros andados.
Fotografias (sem incluir as aéreas)? 7.600...
A próxima vez que falar deste livro/projeto será na altura da sua apresentação pública (início de 2022).
Artur Pastor na torre 3, a infanta D. Maria no coro alto, junto à torre 4. Entre os vários passados e a construção do futuro vivemos os dias. O trabalho prossegue e tenho confiança que dê (mais) frutos.
Novembro ainda vai ter: dança contemporânea, uma conferência, um colóquio de dois dias, um recital de fado e o primeiro concerto da série "Música no Panteão". A equipa é pequena, a vontade é grande.
O nu chama-se azul, mas dá-me jeito que seja anil/indigo. Porque é um pouco mais indigo que vejo.
A inesgotável paleta de Henri Matisse, que cruza todo o arco-íris e vai mais além...
Os óculos tinham ficado num carro de aluguer, em S. Miguel.
Telefonei para a empresa (ILHA VERDE). Pediram-me a matrícula do carro. Lembrava-me (tenho uma memória imbatível para coisas inúteis...). Não havia óculos. Há dois dias ligaram de novo.Os óculos tinham finalmente aparecido e iam mandá-los. Uns Rayban velhíssimos (1991 ou 1992), que não valem nada, mas que são "de estimação".
Achei fantástico que a empresa tivesse anotado o meu pedido e que tivessem tido a preocupação de resolver um assunto tão insignificante. Eu ganhei os óculos, eles ganharam um cliente na próxima deslocação lá.
Uma rápida surtida à zona do antigo Hospital da Marinha proporcionou-me, no regresso, este inusitado cenário. Quatro homens jogavam críquete nas traseiras do Panteão Nacional. Não resisti a meter conversa. Eram imigrantes (claro), do Bangladesh (evidentemente) e passavam os finais de tarde jogando críquete. Um desporto muito mais popular que o futebol na sua terra de origem. Acederam à fotografia, desde que isso não os prejudicasse. Nem por sombras, era só o que faltava.
Há dezenas de nacionalidades nesta freguesia. Uma cidade cada vez mais "de desvairadas gentes".
Em troca, passei-lhes o meu email e convidei-os a visitar o monumento, na próxima semana.
1. A União de Freguesia de Moura e Santo Amador foi mal instalada. No fundo, tomou posse duas vezes. Uma vez não valeu, a outra sim. A CDU alertou para a ilegalidade da primeira "tomada de posse", em que os atropelos à lei foram mais que muitos. O PS, em especial o presidente da junta, teve de recuar. Como se lê na página do facebook da CDU Moura: "tendo em conta os acontecimentos e conscientes da necessidade de dar um rumo certo na fiscalização da atividade da freguesia, a CDU decidiu avançar com a candidatura da sua eleita Ana Rita Santos para a Presidência da Assembleia de Freguesia. Entretanto o PS retirou a sua candidatura e foi eleita por unanimidade a Mesa da Assembleia que passou a ser presidida pela CDU, com dois Secretários do PS".
2. A vereadora que foi eleita pelo CHEGA saiu do partido e agora é vereadora independente. As razões são obscuras e difíceis de perceber numa lógica cartesiana.
Cada vez mais a liderança política socialista no concelho de Moura se parece com uma comédia slapstick. Aquilo acaba tudo numa cena de tartes de creme, como nos bons velhos filmes mudos.
É cada vez mais "à americana". Se tens dinheiro e pagares, tudo bem. Se não tens, vai morrer longe. Drópe déde.
Agora que Astro desapareceu, é o momento de recordar uma das minhas bandas de eleição - ainda hoje o é, mas era ainda mais há 40 anos, quando eu me deixava ir no doce balanço do reggae -, os UB 40. Nome que correspondia ao formulário do desemprego no Reino Unido.
O reggae e o ska andavam por cidades como Birmingham e Coventry. Eram música de diversão e de protesto, numa altura em que o thatcherismo começava a deixar claro por onde ia. Aqui fica, em homenagem a Astro, aos UB 40 e a todos os que lutam contra as oligarquias, Madam Medusa, justamente dedicado à referida senhora.
Não tinha televisão em casa, nem tida ainda casa definitiva, em Mértola. Mas não foi a televisão que me levou, nessa noite, à Casa Vargas, onde era então a sede do Campo Arqueológico. Precisava de ter acesso à biblioteca, para terminar o meu texto para a "História de Portugal", de José Mattoso, e de trabalhar num computador. Havia 2 (dois) na altura, no CAM, e tinham de ser usados por turnos.
Distraidamente, liguei a televisão da sala da biblioteca e fui espreitando, naquela de "os ingleses limpam isto". Fui escrevendo, entre pilhas de fichas e de livros enquanto a ação se desenrolava no já desaparecido Highbury Stadium. Foi no dia 6 de novembro de 1991. Era uma noite fria e o meu caminho em Mértola, cheia de convicção e de esperança, tinha começado pouco antes. Faz hoje 30 anos.
Isaías acaba de rematar para o 3º. golo. Recordo-me como se fosse hoje. E sabem que mais? Tenho saudades de Gabriel Alves.
Mais Matisse, agora em azul. Pergunto-me até onde iria o pantone dele. Este Petit interior blue é de 1952, pouco tempo antes de o pintor desaparecer. Não é muito original usar este poema de Sophia, mas não há aqui obrigação de originalidade.
O mar beijando a areia
O céu e a lua cheia
Que cai no mar
Que abraça a areia
Que mostra o céu
E a lua cheia
Que prateia os cabelos do meu bem
Que olha o mar beijando a areia
E uma estrelinha solta no céu
Que cai no mar
Que abraça a areia
Que mostra o céu e a lua cheia
um beijo meu.
O CLDS 4G de Moura - COMPROMISSO SOCIAL anuncia oferta de emprego para operador indiferenciado. A função é a apanha da azeitona. O CLDS está enquadrado na Comoiprel, cujo presidente da direção é o Presidente da Câmara. Até aqui, tudo tranquilo.
Daqui para a frente é que se complica.
Quem seleciona é a MANPOWER, uma empresa de recursos humanos. Que seleciona quem vai trabalhar. Um dos requisitos para trabalhar é "vontade de trabalhar". Parece anedota, mas não é.
Depois, quais serão os olivais que a MANPOWER tem?
Alguns terão, uma vez que têm volumes de vendas anuais em Portugal de mais de 114 milhões de euros. Deve dar para umas courelas...
Depois, quanto é que os empregadores pagam à MANPOWER e quanto é que os trabalhadores (os tais que têm que ter "vontade de trabalhar") recebem líquido? E qual o valor da hora de trabalho? E quais os benefícios sociais?
Que uma Câmara que se diz socialista apare estes golpes diz muito sobre quem nos governa localmente. Sobre os seus valores, sobre o respeito pelos outros e pelo seu trabalho. Sobre aquilo que se entende por Condição Humana.
E ainda só vamos no primeiro mês de mandato.
"Artur Pastor - O Povo no Panteão", é o título da exposição de fotografia de Artur Pastor (1922-1999) através da qual se procuram revelar diversas facetas do povo português captadas pela lente deste fotógrafo cujo fundo se encontra à guarda do Arquivo Municipal de Lisboa, sendo atualmente um dos mais requisitados. A inauguração terá lugar no dia 9 de novembro, às 18:30.
A exposição resulta de uma parceria da Câmara Municipal de Lisboa / Arquivo Municipal Lisboa e da Direção Geral do Património Cultural/Panteão Nacional. A esta iniciativa junta-se o lançamento do livro "Artur Pastor", publicação promovida pela Fundação Francisco Manuel dos Santos e pela autarquia lisboeta, através do seu arquivo.
A exposição ficará patente ao público até ao próximo dia 6 de fevereiro.
Conheci a Susana Correia em 1985, num restaurante à entrada do Bairro Alto (o 1º de maio, na Rua da Atalaia). Tinham combinado ir lá com um amigo e acabámos por lá encontrar a Susana, o António Carlos Silva e outros colegas do IPPC. Para mim eram já seniores, embora ainda mal tivessem entrado na casa dos 30. Eram a nova geração da Arqueologia e do Património. De esquerda e pouco formais, um bocadinho anarquistas e muito conhecedores, do ponto de vista técnico.
Simpatizei de imediato com a Susana. Inevitavelmente. Exuberante e bem disposta era, na profissão, aquilo que eu desejava ser. Poucos anos volvidos, a Susana instalava-se em Beja, para trabalhar nos Serviços de Arqueologia do Sul. O seu labor discreto, quase anónimo, está longe de ser reconhecido. Talvez um dia chegue essa ocasião.
Comecei a minha carreira em Moura, em setembro de 1986. O apoio da Susana Correia foi-me decisivo. Ela sabia disso. Várias vezes lho disse. A começar pela exposição "Moura na época romana". Durante a preparação da qual me deu vários puxões de orelhas e me obrigou a ler "A voz dos deuses" ("faz-te melhor à cabeça que essas tretas técnicas que andas para aí a ler"). Tal como depois me deu uma ajuda decisiva para o arranque da escavação do Castelo de Moura, em 1989. Que teve um episódio florentino (e do qual fico como guardião). O meu projeto de escavação foi redigido numa Philips/Magnavox VideoWriter que o Museu Regional de Beja tinha. Era uma máquina de escrever com ecrã e que funcionava com disquetes de 3.5. A Susana ia supervisando e aprovando (ou não...).
Competente e bem preparada, não dava tréguas nem facilitava. Nem dizia que sim só para ser simpática. Era ainda mais exigente com os amigos. Sei o que digo e tenho disso provas. A verticalidade profissional foi imagem de marca até ao fim.
No meio de muitas andanças, ficaram inúmeros encontros profissionais, onde a parte extra-científica era bem mais interessante que as sessões de trabalho (como um colóquio em Faro, em 1990, do qual tenho a certeza que a Filomena Barata, a Teresa Marques e o Miguel Rego se recordarão)
Ao longo da vida, muitas vezes me fui cruzando com a Susana Correia. Algo menos desde 2017, quando decidi mudar de rumo e recomeçar, de outro modo, o caminho profissional. Uma decisão sobre a qual me zurziu "acho que fazes muito mal em deixar Mértola".
Devia-lhe este texto. Devo-lhe, seguramente, muito mais que este texto.
Devo-lhe (devemos-lhe, tantos de nós) este reconhecimento e esta gratidão.
Obrigado.
Obrigado, camarada!
Obrigado, querida Susana.
Os sítios não são um acaso da sorte ou do destino. Os primeiros a chegar foram, ao mesmo tempo, geólogos e geógrafos e arquitetos e urbanistas. Não sabiam que o eram, mas esse é o detalhe menos importante da História. Preferiram pontos altos e a proximidade dos rios ou da costa, para se protegerem das ameaças que conheciam e, sobretudo, das que não conheciam.
Isso é mais visível quando se levam para outras paragens os modos de vida dos sítios de origem. Aí, o simples ato de construção torna-se aventura, descoberta e ousadia. Foi assim em Mazagão, em Bissau, em S. Salvador da Baía, em Goa, por todos os sítios onde se andou. Várias vezes, muito menos do que gostaria, fui constatando como esse espírito empreendedor levou para outros sítios um modo de vida e uma forma de olhar o mundo. Interessa-me menos constatar a presença dos grandes modelos da arquitetura religiosa ou militar ou ver como os palácios foram transplantados. Gosto muito mais de ver como aqueles cujo nome nunca passará para a História se adaptaram a novos sítios, usaram materiais que não conheciam e passaram o espírito do lugar onde nasceram para onde haveriam de viver e de ficar para sempre.
Angra do Heroísmo é um desses sítios, e um dos mais fascinantes entre os não muitos que conheço. Toda a cidade velha é planeamento antigo, bem sedimentado pelo tempo, numa ligação entre terra e mar. A ribeira que cruzava a sua parte oriental desapareceu há muito, canalizada e subjugada à vontade dos homens. Pelas encostas há arquitetura vernacular de grande qualidade. Que foi moldada pelos homens e que moldou um modo de vida. Angra é um meio caminho entre dois continentes. Uma realidade física e visual. É o Brasil antes do Brasil. A escala das casas, as portas e as janelas que crescem em altura já não são o Alentejo ou a Estremadura, mas ainda não chegaram a Santo Antônio de Igarassu ou ao Rio de Janeiro. Os tons rosa, azul, verde, amarelo, cinza, já não têm a brancura algarvia. Mas estão ainda muito longe do frenesim vermelho ou anil de Olinda. O que aqui é discrição pastel, no Brasil será festa sem limites. Angra é esse meio caminho, feito de génio e mantido até hoje.
No dia 1 de janeiro de 1980 a cidade foi devastada por um terramoto. Foi rápida e duramente refeita. Recompôs-se e seguiu caminho. Em 1984 passou a ser Património da Humanidade. Uma justiça que se me confirmou nas poucas vezes que aqui vim. Uma excecionalidade feita de cultura, de persistência e de personalidade. Manifestada de forma individual e coletiva. São assim as cidades de longa História, em Portugal ou nos trópicos. Vivem numa permanente reconstrução e numa contínua reinvenção. Vivem num equilíbrio instável, entre a necessidade de prosseguir a caminhada, de inventar novos projetos, de criar novas soluções e a ameaça que gente sem escrúpulos, urbanistas pouco imaginativos e autarcas crassamente ignorantes para essas cidades constitui. Em Angra, o caminho é sólido. Em muitos outros sítios não o é, infelizmente. Para grande tristeza minha.
Crónica em "A Planície"