quarta-feira, 24 de março de 2010

ARISTÓFANES NO IKEA

Em Assembleia de Mulheres são elas quem toma o poder. Aristófanes escreveu a peça em 392 a.C., mas muitos dos seus temas continuam bem actuais.
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O poder das mulheres é imenso. Foi isso que constatei no outro dia de manhã, no IKEA. O IKEA é um mostruário da nossa sociedade e da nossa civilização. Pelo menos no que à relação entre os sexos diz respeito. Fui arrastado para o IKEA ao abrigo de um qualquer pretexto, que nem ouvi porque naquela manhã estava de boa catadura. Por isso me pude dedicar a uma prolongada análise antropológica, que alimentaria várias teses de mestrado, pelo menos.

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O poder de mobilização dos sindicatos transferiu-se, quase todo, para o IKEA. Quem reivindica são as mulheres, que impõe são as mulheres, que escolhe são as mulheres. Como não ia comprar nada (“nada”, em linguagem feminina, tanto pode equivaler a uma lâmpada de 40 watts como a uma mobília de quarto) pude dedicar-me a observar o mundo em volta. Os corredores do IKEA são a ante-câmara do divórcio. Elas comandam. Abrem e fecham gavetas de cozinhas rebrilhantes, e de qualidade duvidosa, testando a resistência dos materiais. Comparam candeeiros, texturas de almofadas e o conforto de sofás. Atrás seguem os maridos. De ar macilento e bigode murcho. Nos casos mais desesperados, envergam t-shirts por baixo de fatos de treino (o que é que raio irão treinar com aquelas barrigas de nove meses?). Elas comandam, eles arrastam-se. Elas gesticulam, discutem, escolhem e decidem. Eles fazem que sim, cada vez mais submissos e cansados. É o mundo machista às avessas.

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No fim da jornada há gritos e desespero. O cenário é operático. Perto das caixas perfilam-se torres com coisas à espera de serem vendidas. Por entre as torres casais gesticulam e debatem-se. “Avisamos os nossos estimados clientes que encerramos dentro de 15 minutos”, avisa uma voz feminina, ó sim feminina. O cenário converte-se em quase tragédia. Nesses breves momentos, tudo se decide. Vemos pequenas chantagens domésticas, gestos dramáticos, lágrimas e gritos. Assisto à comédia de Aristófanes ao vivo no IKEA. Feliz por ter ido ali para comprar “nada”. O que, como sabemos, em linguagem feminina, tanto pode querer dizer uma lâmpada de 40 watts como uma mobília de quarto.

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Este texto foi publicado em A Planície no dia 1 de Março de 2010. A imagem do criado preto da Casa Africana carregado de embrulhos é uma marca do Portugal colonial. O estilo Casa Africana passou-se para as manhãs domingueiras do IKEA.

4 comentários:

  1. Ah !? So te esqueceste de uma coisa...Caso percam uma criança naquela enchurrada humana...nada de voltar para tras à procura da criancinha, a técnica é continuar a seguir o fluxo e as setas pois a criança nao conseguira remar contra a maré.
    E ja agora nada de panico, lembrem-se que por vezes um movél pode esconder uma criança.
    Fala a voz da experiência : )

    So mais uma coisa...como achei que o divorcio deve acontecer por verdadeiros motivos...deixei de ir ao IKEA com o meu marido.

    Moral da historia : quem é o verdadeiro motor da economia ? A MULHER ! Pois é ela que estafa o dinheiro ; )

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  2. Ah, como eu compreendo isso...

    Mas, carissimo Santiago, convido-o um dia a ir ao El Corte Ingles!

    P.S.: Para não haver dúvida ou confusão - este convite é em sentido figurado. A última coisa que me ocorreria era ir com o ilustre amigo Santiago ao El Corte Ingles ou a outro local semelhante em passeio (ou visita de estudo). Se quiser acompanhar-me numa visita de estudo ao restaurante Zé Varunca, ainda aceito o "sacrificio"! www.zevarunca.com


    Com os melhores cumprimentos,

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  3. e quando estas "visitas" são a mais do que um local do genero no mesmo dia???
    e quando a companhia da esposa è potenciada em força pela irmã ?? (a minha ou a dela, tanto faz).
    já tenho defesas,ou levo um monte de jornais, ou certifico-me que há uma fnac na zona e levo uma série de apontamentos com nomes de bandas e/ou livros que quero comparar para ver quais os mais acessiveis á carteira, para comprar ou ficar sinalizado para a proxima ida ao IKEA, Moviflor, loja do Gato Preto... entre outras!! o engraçado è que elas ás vezes esperam por mim à porta da fnac!!
    sugestão: as raparigas que estão na duvida se o atual namorado è ou não o Homem da vida delas, que tal um teste IKEA!?

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