terça-feira, 22 de março de 2011

OURO SOBRE AZUL

Quase

Um pouco mais de sol - eu era brasa,
Um pouco mais de azul - eu era além.
Para atingir, faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...
Assombro ou paz? Em vão... Tudo esvaído
Num grande mar enganador de espuma;
E o grande sonho despertado em bruma,
O grande sonho - ó dor! - quase vivido...
Quase o amor, quase o triunfo e a chama,
Quase o princípio e o fim - quase a expansão...
Mas na minh'alma tudo se derrama...
Entanto nada foi só ilusão!
De tudo houve um começo ... e tudo errou...
- Ai a dor de ser - quase, dor sem fim...
Eu falhei-me entre os mais, falhei em mim,
Asa que se enlaçou mas não voou...
Momentos de alma que, desbaratei...
Templos aonde nunca pus um altar...
Rios que perdi sem os levar ao mar...
Ânsias que foram mas que não fixei...
Se me vagueio, encontro só indícios...
Ogivas para o sol - vejo-as cerradas;
E mãos de herói, sem fé, acobardadas,
Puseram grades sobre os precipícios...
Num ímpeto difuso de quebranto,
Tudo encetei e nada possuí...
Hoje, de mim, só resta o desencanto
Das coisas que beijei mas não vivi...
Um pouco mais de sol - e fora brasa,
Um pouco mais de azul - e fora além.
Para atingir faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...


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Há momentos quase, há dias quase. Há países quase, decididamente. Lendo a História de Portugal estamos sempre quase. Neste bem conhecido poema quase, de Mário de Sá-Carneiro (1890-1916), o verso Um pouco mais de azul - eu era além leva-me um pouco mais além e um pouco mais acima.
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Nestes dias precisamos de azul. E de ouro sobre azul. Como aquele ouro e azul que cobria o teto dos mais belos edifícios da Antiguidade. Como este, do túmulo de Nofretari. Que, com este céu estrelado, ganhou a Eternidade. Ou quase.

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