segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

OS FILHOS DO PADRE

Só depois daquele meu tio ter falecido soube da história. Na realidade, não era meu tio, mas sim das minhas primas. Para o caso, tanto dava.

Era um português raiano, um comerciante de andar rápido, tom ríspido e gestos de pouca paciência. Viveu em Paymogo dezenas de anos, falando sempre um castelhano pior que mau. Mas que toda a gente entendia.  Gostava de o ir esperar à saída da Plaza de San Mateo, já perto do fim da aldeia, na zona do cinema de inverno. Ao fim da tarde, ele chegava com a carrinha, vindo de Huelva, e parava, para me levar até casa, na Calle Calvo Sotelo (hoje Calle del Santo).

Há poucos anos alguém me disse "sabes que ele era filho de um padre...". Não sabia, mas a situação estava longe de ser inédita. A parte curiosa é que o padre vivia com a governanta e os filhos da governanta numa casa de uma pacata vila alentejana. Se o caso era motivo de falatório não sei. Mas os hábitos lassos do sul permitem isso e muito mais. A parte divertida da história tem a ver com a proibição, ditada pelo padre, que os petizes assistissem à missa. É que, ao vê-lo no lugar principal da igreja, todo paramentado, os miúdos não resistiam e começavam aos gritos "pai! pai! pai!" e acenavam com entusiasmo. Ainda que fossem só filhos da governanta e mesmo tendo em conta a liberalidade do sul, isso já era demais...

Não será uma grande história de Natal. Mas é verdadeira.


Vista da Calle del Santo, tirada a partir do castillo. Sobre Paymogo: http://www.paymogo.org/

2 comentários:

  1. Saudades desta rua e dos dias da minha infância...

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  2. Caro anónimo de dia 31.12.
    A história que conta é bastante curiosa. Já a conhecia. Infelizmente, não poderei publicar o comentário, por referir nomes e poder ferir suscetibilidades.
    Cumprimentos
    SM

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