Santiago Macias, que preside ao município de Moura, foi recentemente empossado presidente da Assembleia
Distrital de Beja (ADB). Uma entidade
que o próprio considera “anacrónica” e
“sem sentido” face ao seu atual enquadramento e que apenas serve como
“palco de luta política”. Macias viu esta
terça-feira, 14, aprovado por unanimidade o orçamento da ADB para 2014.
São 372 700 euros, mas destes ape-
nas menos de um por cento são despesas de capital: “A ARB consome o
orçamento sem uma perspetiva de investimento”. Isto, numa altura em que
as câmaras associadas devem perto de
120 mil euros em transferências atrasadas. O património e os custos operacionais da ADB, instituição que quase se esgota na gestão do Museu Regional de
Beja, deve, segundo Santiago Macias,
passar de forma faseada ao longo dos
próximos oito anos, para a posse da
Câmara Municipal de Beja. Uma vez
que as restantes autarquias olham
para a instituição como “um fardo e
uma chatice”. Esta ideia será debatida
e votada em próxima reunião magna
daADB, mas conta já com a oposição de
Manuel Narra, presidente da Câmara
Municipal de Vidigueira.
Ainda faz sentido existir a Assembleia
Distrital de Beja?
Sinceramente, acho a assembleia distrital
um tanto anacrónica. Não faz sentido existir com o enquadramento que atualmente
tem. É uma instituição que respondeu, em
tempos, a necessidades concretas, que se
pensava que iriam ser substituídas pelo
processo de regionalização. Aliás, sem órgãos regionais, não é formalmente possível
extinguir as assembleias distritais. Como esse processo encravou, temos assembleias
que vão existindo, sem futuro à vista. São
um palco de luta política, com efeitos práticos limitados. À boa maneira portuguesa
“vamos indo…”.
O anterior presidente da mesa da ADB,
António Sebastião, chegou a afirmar que
esta entidade não servia para nada, a não
ser para gerir o Museu Regional de Beja.
Concorda?
No essencial, sim. Assembleia e museu
confundem-se. Que a assembleia distrital exista para gerir um museu não é, em
si, um problema. Desde que a assembleia
queira assumir essa tarefa de alma e cora-
ção. Ora, na verdade, nunca dei por isso.
A legislação vai ser alterada. Não sabemos ainda os contornos precisos, até porque a realidade das assembleias distritais
difere muito de região para região. Mas,
em recente reunião tida com o secretário
de Estado da Administração Local, senti
abertura quanto à procura de soluções práticas e realistas. Há, contudo, que ter em
conta que estas assembleias são expressa-
mente mencionadas na Constituição, pelo
que a sua extinção, pura e simples, não é
possível...
E como se pode gerir o museu se parte dos
membros da ADB, os municípios do Baixo
Alentejo, não pagam as dotações a que es-
tão obrigados?
Peço desculpa, mas os municípios fazem os possíveis por pagar essas dotações.
Há apenas dois casos mais complicados,
mas mesmo esses estão a ser ultrapassados. A gestão do museu é feita com imensas dificuldades. Com entraves e sufocos.
Sobretudo, sem uma perspetiva segura de
futuro. No fundo, muita gente olha para a
assembleia e para o museu e pergunta: “Mas
afinal, para que raio é que aquilo serve?”. O
que quer dizer que o próprio museu vai ter
de trilhar novos caminhos.
Qual é o valor da dívida dos municípios à
ADB e quais são as câmaras devedoras?
A dívida é na ordem dos 120 mil euros. Não vou especificar quem deve, nem o que deve. Até porque há planos de pagamento em curso. Prefiro sublinhar a boa vontade generalizada em resolver os problemas existentes. Noto, da parte dos meus colegas, uma sincera preocupação em ultrapassar todo o tipo de constrangimentos.
A dívida é na ordem dos 120 mil euros. Não vou especificar quem deve, nem o que deve. Até porque há planos de pagamento em curso. Prefiro sublinhar a boa vontade generalizada em resolver os problemas existentes. Noto, da parte dos meus colegas, uma sincera preocupação em ultrapassar todo o tipo de constrangimentos.
No dia 14 foi apresentado e votado o orçamento da ADB. Estamos a falar em verbas
de que ordem?
Estamos a falar de um orçamento de 372 700 euros. O mais preocupante é você olhar para o orçamento e constatar que desse montante apenas 3 300 euros (0,88 por cento) são despesas de capital. Ou seja, a as-sembleia consome o seu orçamento sem ter uma perspetiva, ou uma possibilidade, de investimento.
Estamos a falar de um orçamento de 372 700 euros. O mais preocupante é você olhar para o orçamento e constatar que desse montante apenas 3 300 euros (0,88 por cento) são despesas de capital. Ou seja, a as-sembleia consome o seu orçamento sem ter uma perspetiva, ou uma possibilidade, de investimento.
No seu blogue pessoal desabafou que es-
tava perante uma “situação lixada”. O que
quis dizer concretamente?
Claro que é uma situação lixada. Imagine que, de um dia para o outro, lhe cai em cima a responsabilidade de ter de trabalhar para encontrar soluções para esta situação. Ser presidente da assembleia distrital não é um mero exercício burocrático. Não o é para mim, como não o foi para quem me antecedeu. Assumi esta tarefa com empenho e com a convicção de que poderei dar algum contributo no delinear de uma solução para o futuro do museu.
Claro que é uma situação lixada. Imagine que, de um dia para o outro, lhe cai em cima a responsabilidade de ter de trabalhar para encontrar soluções para esta situação. Ser presidente da assembleia distrital não é um mero exercício burocrático. Não o é para mim, como não o foi para quem me antecedeu. Assumi esta tarefa com empenho e com a convicção de que poderei dar algum contributo no delinear de uma solução para o futuro do museu.
A grande prioridade desta nova mesa, já o
afirmou, passa por assegurar o funcionamento do museu e o seu financiamento.
Que estratégia pensa seguir para atingir estes objetivos?
Só há dois caminhos: o museu é assumido
pela Cimbal (Comunidade Intermunicipal
do Baixo Alentejo) ou pela Câmara
Municipal de Beja. Pessoalmente, vejo a
passagem para a Cimbal como “mais do
mesmo”. Não creio que a solução seja suficientemente flexível para dar capacidade de
manobra ao museu regional.
Também referiu que a ADB estava numa espécie de “limbo administrativo”... Concorda
com a corrente, de alguma forma generalizada, que defende a passagem do museu regional para a tutela direta da Câmara
Municipal de Beja?
Essa é, na minha opinião, a solução ideal. O
museu está em Beja, é uma marca importante da cidade, tem um enorme potencial
e deve ser colocado ao serviço de uma estratégia de promoção da região. Isso só pode
ser conseguido seguindo, administrativamente, duas vias: primeiro, o património
da assembleia distrital teria de passar para a
Câmara de Beja, por não me parecer lógico
nem justo que uma entidade arcasse com
custos sem ter benefícios; segundo: defendo
uma diluição de custos, nomeadamente os de pessoal, no tempo. Ou seja, a Câmara de
Beja não deveria arcar com as despesas de
uma vez só, mas sim de forma gradual, num
horizonte de oito anos. Passando dos 60 por
cento atuais para 100 por cento. Isso implica
encontrar um quadro legal que o possibilite.
Mas se houver vontade política, as soluções
aparecem.
O anterior executivo bejense, nomeadamente o ex-presidente Pulido Valente, por
seu lado, pretendia a integração do Museu
Regional na Cimbal. É uma solução com via-
bilidade para ambas as entidades?
As posições de Jorge Pulido Valente a este
propósito não deixam de ter a sua graça.
Quando era presidente da Câmara de
Mértola várias vezes o ouvi defender que
deveria ser Beja a ter a responsabilidade
do museu. Depois, enquanto presidente da
Câmara de Beja passou a sustentar o con-
trário. No fundo, nunca contribuiu para que
se encontrasse solução alguma. Pelas razões
que acima referi, a integração na Cimbal
não me parece ter interesse. As autarquias
continuarão a olhar para a instituição museu regional como um fardo... Se for essa a
posição da maioria, acato-a. Mas não estou
de acordo.
O que pretende transmitir quando declarou
que a viabilidade do museu regional passa
por encontrar “soluções marcadamente
criativas”?
Um museu com o potencial do de Beja não
pode trabalhar, apenas e só, a partir das
comparticipações camarárias. Isso é prolongar a agonia. Há componentes científicas a promover (encontros, seminários
etc.), mas há também um trabalho de promoção do museu a fazer. E isso abrange várias vertentes, incluindo uma marcadamente “comercial”. Defendo, no que diz
respeito à parte científica ou de investigação, a abertura do museu à comunidade científica, através de um programa
de curadorias em sistema rotativo, que traga ao museu propostas formuladas a
partir do meio museológico, tendo as coleções de Beja como ponto de partida. Penso
também que o museu terá de procurar, de
forma mais intensa, contactos e ligações às
empresas da região. Não tanto pelo mecenato em si (dizia Diogo Bernardes, no século XVI, que “de mecenas tanto temos
como de brancos tem a Etiópia”), mas por
uma necessidade de abertura que me parece imprescindível.
A atual fórmula de cálculo das comparticipações municipais à ADB, que imputa cerca
de 50 por cento do orçamento à Câmara de
Beja, está bem conseguida ou pode sofrer
alterações?
Não são 50 por cento, é mais do que isso. Na
linha do que acima afirmei, penso que a ges-
tão deve ser assumida pela Câmara de Beja,
ainda que de forma gradual. Parece-me também crucial que o museu regional se envolva
ativamente em projetos financiados pelos
fundos europeus. Há muito tempo que o ve-
nho dizendo. Parece-me ser uma fórmula
possível para avançar com novos projetos.
Em que estado se encontra o Museu
Regional de Beja?
Choca-me que o museu seja visto como um
fardo e uma chatice. O que acima afirmei
não representa qualquer tipo de censura,
quanto ao tipo de orientação técnica seguida. Tenho grande estima e consideração
pelo José Carlos Oliveira, pela sua equipa e
por todos os trabalhadores que ali desenvolvem a sua atividade. Mas isso não me obriga
a estar de acordo com tudo.
Enquanto arqueólogo e historiador consi-
dera que o trabalho desenvolvido pela direção do museu, apesar das dificuldades
orçamentais, tem sido o melhor ou devem
ser implementados novos processos de
trabalho e de valorização daquele espaço
museológico?
De algum modo, já respondi antes.
Independentemente do trabalho efetuado –
conhece algum sítio com um núcleo da qualidade do Santo Amaro? – é sempre possível
e desejável levarmos a cabo novos processos
de trabalho. O esforço que nos leva a querer,
sempre, melhorar, é salutar. No Museu de
Beja há margem de manobra para crescer.
E há, tem de haver, espaço para uma promoção mais agressiva. Mas para isso é também
necessário um novo enquadramento político e administrativo.
Que importância tem, de facto, o Museu
Regional de Beja?
Tem uma importância extraordinária, dos pontos de vista histórico e patrimonial. Sabe que, há meses, veio cá, de propósito, uma professora da Sorbonne, só para ver a janela da Soror Mariana? A coleção tem as- petos extraordinários, com grandes peças de época romana, com notabilíssimas pinturas do século XVI, com um núcleo visigótico a que já me referi, com azulejaria e com ourivesaria... Está instalado num edifício carregado de peso histórico e que encontramos em todos os guias turísticos. O museu regional faz lembrar uma bela adormecida no seu esquife.
Tem uma importância extraordinária, dos pontos de vista histórico e patrimonial. Sabe que, há meses, veio cá, de propósito, uma professora da Sorbonne, só para ver a janela da Soror Mariana? A coleção tem as- petos extraordinários, com grandes peças de época romana, com notabilíssimas pinturas do século XVI, com um núcleo visigótico a que já me referi, com azulejaria e com ourivesaria... Está instalado num edifício carregado de peso histórico e que encontramos em todos os guias turísticos. O museu regional faz lembrar uma bela adormecida no seu esquife.
Entrevista ao Diário do Alentejo de hoje.
Que se considere um museu com tanto valor como o de Beja como uma chatice, é um fim de mundo!
ResponderEliminarnão se divulga muito o que temos, parece que há vergonha nisso
fui là e adorei já coloquei no meu blogue um artigo sobre a história da religiosa portuguesa
cumprimentos
ResponderEliminarO Museu Rainha Dona Leonor, mais conhecido do público como Museu Regional de Beja, para além de ter na sua génese o prestigiante estatuto de "Primeiro Museu Português", cuja fundação remonta ao longínquo ano de 1791, tem hoje uma importância crucial dentro do seu género - museu regional - , possuindo importantes coleções que contemplam peças de inestimável valor, devido quer à quantidade, como à qualidade, raridade ou fortuna artística dos seus espécimes.
Falo com conhecimento de causa, visto ter levado a cabo uma investigação -inédita- sobre as diferentes coleções de pintura desta instituição, investigação essa que veio a ser classificada como excelente por autoridades científicas na área, como os Profs. Drs. Pedro Flor, Fernando A. Baptista Pereira ou João Luis Cardoso.
É de lamentar que o MRB se encontre hoje subvalorizado e as suas coleções - e sobretudo no que à de pintura diz respeito - desatentamente apreciadas e injustamente esquecidas, as quais urge reconhecer e divulgar.
Depois da leitura muito atenta que fiz da sua entrevista ao Diário do Alentejo, de 17 de janeiro, na qualidade de Presidente da ADB, concordando em absoluto com as suas palavras no que concerne ao museu, gostaria de lhe dar a conhecer a minha investigação, que contempla uma proposta de valorização e divulgação do Museu Regional, a custo - atrevo-me a dizer - mínimo, ou mesmo custo zero para o MRB/ADB.
Todos teríamos a ganhar: a instituição, o organismo que a tutela, a própria cidade/região, o público do museu e eu mesma, que sou uma interessada na matéria e uma curiosa da História da Arte em geral.
Subscrevo-me atentamente,
Helena Tadeia
Helena Tadeia
E-mail: studyandwork.mail@gmail.com
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