quinta-feira, 19 de março de 2015

UMA CIDADE E O SEU MUSEU: 11/20 - BEJA

"Tenho esperança que, de acordo com os arreigados hábitos que são nossos, na 25ª hora se encontre o bom-senso e assim também a solução que o Museu Regional de Beja merece." Esta mensagem, de um veterano e qualificadíssimo quadro da Administração Central chegou-me às 10:58, de terça-feira, na sequência de um mail que eu próprio enviara a colegas da área dos museus.

Não houve 25ª hora. Entre as 22:38 e as 22:44 de ontem houve três votações, em que os eleitos do Partido Socialista reprovaram tudo o que havia a reprovar: as alterações às Grandes Opções do Plano e Orçamento, ao Mapa de Pessoal e ao Regulamento Interno dos Serviços.

A sessão teve momentos lamentáveis, que quem lá esteve pode testemunhar. Infelizmente, éramos poucos, porque a sociedade civil e as "forças vivas" desta cidade vivem à margem do seu Património e do seu Museu. Ambos são extraordinários, mas parecem não ser uma prioridade...

E agora? Agora mais impasse. A única vontade que emerge é a de criar dificuldades à Câmara Municipal de Beja. Ou seja, os trabalhadores foram convertidos, pelo Partido Socialista, em peças de xadrez. Aconteceu o pior. Que era o que eu temia.

Sexta-feira haverá um plenário dos trabalhadores do Museu. Tiveram a gentileza de me convidar estar presente. Não faltarei.



JOSÉ

E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, Joaquim?
e agora, você?
Você que é sem nome,
que zomba dos outros,
Você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?

E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio, - e agora?

Com a chave na mão 
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais!
José, e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse,
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja do galope,
você marcha, José!
José, para onde?

Carlos Drummond de Andrade

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