sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

UMA CRÓNICA SOBRE A AMIZADE

A conversa teve lugar no início do 2017. Ainda a garrafa mal tinha chegado à mesa e já eu atirava "quando deixar de ser presidente, a maioria dos que agora me cumprimentam na rua até fogem de mim". E ri muito. Os meus interlocutores SGAM (Sérgio Guerreiro e António Monteiro) não levaram a sério. Tentei uma explicação. O Sérgio ficou, subitamente, muito sério "estás a brincar, não estás?". Que não, tornei. E frisei o caráter da relação circunstancial, hipocritamente circunstancial, que muitas pessoas mantêm com aquilo que elas acham que são "os poderosos"... O tempo ensina-nos coisas assim. Voltámos à garrafa de Cotéis e o assunto ficou por ali. Ou quase. De tempos a tempos, o Sérgio recorda-me do que falámos nessa noite de inverno no Tapas.

O tempo tem vindo a encarregar-se dessa contabilidade pouco útil. Conto com os de sempre. E com muitas amizades que, entretanto (por vezes de forma inesperada), fui fazendo. O resto foi e é circunstancial. Claro que, de outubro para cá, tudo mudou. Recentrei-me e voltei a minha atenção para outras coisas. Com a mesma convicção com que mergulhei em Moura.

Claro que, de outubro para cá, já tive algumas amargas desilusões. Algumas delas verdadeiramente tristes. Como nunca aprendo, e sou cronicamente ingénuo (os que me são próximos troçam sem piedade dessa minha caraterística), acontece-me confiar em quem não devo…

Claro que, de outubro para cá, recebi demonstrações de amizade totalmente inesperadas. A forma como fui recebido por muitos amarelejenses na Feira do Vinho deixou-me estupefacto e aturdido. O modo fraterno como fui entretanto acolhido noutros sítios do nosso concelho, na Póvoa, no Sobral, em Santo Amador, deixou-me confortado. Tornou-se claro que a forma que achei adequada para o desempenho do cargo não era “jogada” nem tinha “segundas intenções”. Era assim porque era assim.

Quando, há semanas, me perguntaram se sinto nostalgia do cargo que desempenhei respondi “nenhuma, rigorosamente nada”. A componente humana, a do contacto com as pessoas, foi a melhor parte. E isso não depende de cargos efémeros. E isso não se perde. Pelo menos com quem vale a pena. Os sucessivos contactos, via messenger, os mails, as sms, os telefonemas, a dizer “não se esqueça da gente”, “apareça por cá”, “temos almoço no dia xis”, são a minha torre e espada. Claro que o tempo amortecerá tudo isso. Claro que, daqui a uns tempos, não será tanto assim. Disfruto do momento. E prezo, como nenhum outro sentimento, a amizade. Em especial, as que se diriam improváveis.

         Esta crónica é para ti, José André dos Santos. Parabéns e aproveita o tempo, que não vais ter sempre 25 anos.

 Cartier-Bresson, Brie, 1969

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