Recordava,
no outro dia ao almoço, com Jorge Calado, a produção do livro
“Amareleja”. O Jorge, que só ali foi, pela primeira vez, em
2016, apanhou depressa o pulsar da aldeia [chamemos-lhe assim, como
gostam muitos amarelejenses]. “É uma terra forte e com grande
orgulho e identidade”, dizia, convicto. O Jorge gostou imenso da
Amareleja, o que facilmente se percebe pelo texto que escreveu.
Ao
longo de quatro anos vivi, com especial intensidade, a relação com
a Amareleja. Sem grande suporte político, e contando com um punhado
de amigos, fui passando pela aldeia uma vez e outra. Uma atitude
muito criticada por vários mourenses das minhas relações “eles
não ligam a ninguém, o que é que lá vais fazer tantas vezes?”.
Discordei sempre dessa perspetiva. E ia à Amareleja porque gostava
de lá ir. Porque nunca gostei de pessoas que dizem que sim só
porque sim. E os amarelejenses nunca dizem que sim só porque sim,
para fazerem o frete e por bem parecer. Tive, entre 2013 e 2017,
momentos duros. Alguns bastante difíceis. Decidi que nunca
desistiria. Porque gostava muito da Amareleja. Porque gosto muito do
sítio e das pessoas desse sítio. Nunca promoveria e participaria
num livro sobre um sítio que me fosse indiferente. Por isso escrevi
que
“é
a paixão dos fortes feita rua e gente”. E
também que “a aldeia é um sítio e muito mais do que um sítio. A
Amareleja espraia-se em linhas longas e contínuas, Ferrarias abaixo,
Alto de Bombel acima. Não há declives fortes ou cortes abruptos. A
Amareleja estende-se num suave ondular, numa geografia toda feita de
recortes e de imprecisões. Como suave é o andar das mulheres com
quem nos cruzamos. O poder ordenador das leis e do urbanismo chegou
tarde às terras mais escondidas. As amarelejas do interior
habituaram-se a tomar conta de si. O ziguezaguear das ruas e a
improvisação dos limites são a marca de sítios assim”.
Quando
esse convívio regular terminou, alguma coisa me ficou a faltar. No
dia 24 irei recuperar um pouco, nem que seja só um pouco, do tempo
perdido nos últimos meses. Irei ao Alto de Bombel? Certamente. E ao
bar da música. E ao do GDA, seguramente. E à sociedade do terreiro,
sem dúvida. E haverá viagem à Lua. E à do Vela. E ao Barriga
Cheia. E ao Moreira. E ao novo Xico Mota. E por aí fora, tarde fora,
noite dentro. E acho que o dia se me fará curto para tanto sítio.
No
próximo dia 24 irei estar na inauguração do bar do Campo das
Cancelinhas, na Amareleja. Retomarei, nem
que seja só por umas horas, a minha jornada sentimental. Numa
terra que é a paixão
dos fortes. E que se não existisse, eu também não existiria.
Crónica publicada hoje, em "A Planície".
Crónica publicada hoje, em "A Planície".
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