Ao ver ontem uma fotografia de David Monge da Silva veio-me à memória um episódio ocorrido há muitos anos (vinte, talvez). Dei boleia, até ao Rosal de La Frontera, a um casal americano: Maan Madina e Marilyn Jenkins. A dado momento, entre Aldeia Nova e Ficalho, Maan olhou atentamente a paisagem em volta e pediu-me para parar o carro. Andou um pouco pela berma da estrada, para depois me dizer "isto é tal e qual o meu Líbano; faz-me lembrar as paisagens da minha infância". Tive vergonha de lhe perguntar há quanto tempo não ía à terra, mas fiquei com a sensação que seria há muitos anos...
A fotografia sugere-me a Toscânia, tal como paisagens sírias, italianas e jordanas me lembraram a minha margem esquerda natal. Tive, em Madaba, a ilusão de andar pelas terras em volta do Sobral da Adiça.
A fotografia sugere-me a Toscânia, tal como paisagens sírias, italianas e jordanas me lembraram a minha margem esquerda natal. Tive, em Madaba, a ilusão de andar pelas terras em volta do Sobral da Adiça.
Balada do Poema que não Há
Quero escrever um poema
Um poema não sei de quê
Que venha todo vermelho
Que venha todo de negro
Às de copas às de espadas
Quero escrever um poema
Como de sortes cruzadas
Quero escrever um poema
Como quem escreve o momento
Cheiro de terra molhada
Abril com chuva por dentro
E este ramo de alfazema
Por sobre a tua almofada
Quero escrever um poema
Que seja de tudo ou nada
Um poema não sei de quê
Que traga a notícia louca
Da história que ninguém crê
Ou esta afta na boca
Esta noite sem sentido
Coisa pouca coisa pouca
Tão aquém do pressentido
Que me dói não sei porquê
Quero um poema ao contrário
Deste estado que padeço
Meu cavalo solitário
A cavalgar no avesso
De um verso que não conheço
Que venha de capa e espada
Ou de chicote na mão
Sobre esta noite acordada
Quero um poema noitada
Um poema até mais não
Quero um poema que diga
Que nada há que dizer
Senão que a noite castiga
Quem procura uma cantiga
Que não é de adormecer
Poema de amor e morte
No reino da Dinamarca
Ser ou não ser eis a sorte
O resto é silêncio e dor
Poema que traga a marca
Do Castelo de Elsenor
Quero o poema que me dê
Aquela música antiga
Da Provença e da Toscânia
Vinho velho de Chianti
Com Ezra Pound em Rapallo
E versos de Cavalcanti
Ou Guilherme de Aquitânia
Dormindo sobre um cavalo
E com ele então dizer
O meu poema está feito
Não sei de quê nem sobre quê
Dormindo sobre um cavalo
Quero o poema perfeito
Que ninguém há-de escrever
Que ele traga a estrela negra
Do canto e da solidão
Ou aquela toutinegra
De Camões quando escrevia
Sôbolos rios que vão
Que venha como um destino
Às de copas às de espadas
Que venha para viver
Que venha para morrer
Se tiver que ser será
E não há cartas marcadas
Só assim poderá ser
O poema que não há
Manuel Alegre - "Babilónia"
Um poema não sei de quê
Que venha todo vermelho
Que venha todo de negro
Às de copas às de espadas
Quero escrever um poema
Como de sortes cruzadas
Quero escrever um poema
Como quem escreve o momento
Cheiro de terra molhada
Abril com chuva por dentro
E este ramo de alfazema
Por sobre a tua almofada
Quero escrever um poema
Que seja de tudo ou nada
Um poema não sei de quê
Que traga a notícia louca
Da história que ninguém crê
Ou esta afta na boca
Esta noite sem sentido
Coisa pouca coisa pouca
Tão aquém do pressentido
Que me dói não sei porquê
Quero um poema ao contrário
Deste estado que padeço
Meu cavalo solitário
A cavalgar no avesso
De um verso que não conheço
Que venha de capa e espada
Ou de chicote na mão
Sobre esta noite acordada
Quero um poema noitada
Um poema até mais não
Quero um poema que diga
Que nada há que dizer
Senão que a noite castiga
Quem procura uma cantiga
Que não é de adormecer
Poema de amor e morte
No reino da Dinamarca
Ser ou não ser eis a sorte
O resto é silêncio e dor
Poema que traga a marca
Do Castelo de Elsenor
Quero o poema que me dê
Aquela música antiga
Da Provença e da Toscânia
Vinho velho de Chianti
Com Ezra Pound em Rapallo
E versos de Cavalcanti
Ou Guilherme de Aquitânia
Dormindo sobre um cavalo
E com ele então dizer
O meu poema está feito
Não sei de quê nem sobre quê
Dormindo sobre um cavalo
Quero o poema perfeito
Que ninguém há-de escrever
Que ele traga a estrela negra
Do canto e da solidão
Ou aquela toutinegra
De Camões quando escrevia
Sôbolos rios que vão
Que venha como um destino
Às de copas às de espadas
Que venha para viver
Que venha para morrer
Se tiver que ser será
E não há cartas marcadas
Só assim poderá ser
O poema que não há
Manuel Alegre - "Babilónia"
Excelente postagem. O Mundo todo no Alentejo da raia e no coração dos viajantes e dos poetas. Bem Hajas. Abraço fraterno.
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