segunda-feira, 2 de setembro de 2019

MOURA ARQUEOLÓGICA

Vem este texto a propósito da recentemente inaugurada exposição no antigo matadouro. Utilizando materiais da coleção do Museu Municipal, peças de escavações arqueológicas e réplicas do Museu Nacional de Arqueologia, é apresentada uma panorâmica dos achados arqueológicos no nosso concelho.

É um trabalho de grande mérito de quem se encarregou do comissariado da exposição, José Gonçalo Valente e Marisa Bacalhau. Raramente é possível, por limitação alheia aos comissários, ter materiais de excecional qualidade para todos os períodos históricos. Moura tem a “sorte” (e essa sorte tem muito a ver com a riqueza agrícola e mineira do seu território) de ter uma importante ocupação humana desde a Pré-História.  Hesíodo escreveu, na Teogonia (e isso foi há quase 3.000 anos...) sobre “as Hespérides que guardam belos frutos em ouro e as árvores que os sustentam, para lá do famoso oceano”. Os metais da Ibéria terão criado este Jardim das Hespérides. Sem eles, não teríamos os belos materiais que “Moura Arqueológica” nos mostra, em especial para épocas mais recuadas.

É um trabalho seguro e de grande qualidade, aquele que Marisa Bacalhau e José Gonçalo Valente construíram. É também a oportunidade para revermos muito bons materiais, nem sempre conhecidos da nossa terra. O thymiaterion e o tesouro do Álamo, pertencentes ao Museu Nacional de Arqueologia, podem ser vistos através de réplicas. Os botões em ouro do Castro dos Ratinhos são uma novidade absoluta, por nunca terem estado expostos. Trazem-se para este contexto explicativo um fragmento cerâmico que refere uma igreja do século VII (Santa Maria Lacantensis), hoje desaparecida, e a lápide fundacional do minarete da mesquita de Moura, de meados do século XI. Os materiais são o suporte necessário de uma exposição. Mas não chegam para construir um percurso. Daí que a linha de tempo construída pelos responsáveis pela exposição seja fundamental para se perceber o contexto em que nos movemos. Resultou bem, e daí as coisas se tornarem claras.

Por um princípio que, em tempos e por várias vezes, discuti com a Marisa e com o José, não sou grande adepto das chamadas abordagens diacrónicas ou de sucessão temporal. Mas isso é aqui o que menos interessa. Fundamental mesmo é ver a exposição e ver que há profissionais como Marisa Bacalhau e como José Gonçalo Valente que fazem falar as coisas do passado, em nome da nossa terra.

Esta Moura partiu da arqueologia e fez-se um belo museu. Quem havia de dizer?...


Crónica em "A Planície"

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