sexta-feira, 15 de novembro de 2019

CRÓNICAS OLISIPONENSES - XXXVIII

Lisboa é uma cidade gélida. Linda de morrer, mas gélida. É muito melhor nas margens que no centro. Ainda hoje, no 13 e na linha de Sintra, demonstrei isso, coloridamente, a uma velha amiga.

Há momentos de exceção. Há umas noites atrás, vi o autocarro ao longe e pensei "não chego lá, nem pensar". E a seguir também pensei "****-**, *******, *****". Ia ter de esperar 25 minutos pelo seguinte. Comecei a correr (tenham a bondade de considerar como correr o trote desengonçado de um cinquentão, tentando segurar a pasta com uma mão e o borsalino com a outra, como o da fotografia, mas a léguas dele) e o autocarro começou a abrandar. Depois, parou na paragem deserta. A porta ficou aberta longos segundos, enquanto continuava o meu trote, cada vez desengonçado. Atirei-me para dentro do 54. Olhei o motorista. Era um dos habituais das horas finais daquela carreira. Reconhecera-me, somos sempre os mesmos aquela hora. E ficara à espera. Balbuciei um "obrigado", enquanto tentava não desmaiar. Fiquei depois a pensar que uma cidade assim, gélida e distante, tem momentos de calor. Nos sítios por onde passa o povo. Como as barulhentas e alegres conversas, hoje no 13, bem nos mostraram.

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