O colorido mapa que o “Jornal de Negócios” apresentou no passado dia 20 de junho diz bem da desgraça em que o interior do País se tornou. Entre 2011 e 2019 a população diminuiu em 86% dos concelhos de Portugal. Todos os concelhos do Alentejo perderam gente. Moura baixou em 8,58% o número de habitantes. Somos hoje menos de 14.000. O concelho mais interior que ganha população é Vila Nova da Barquinha (Santarém), que está a 60 quilómetros da costa. Para dentro, é a desolação.
É espantoso como um país com cerca de 200 quilómetros de largura conseguiu criar a ideia de “interior”. Pior, foi fazer com que sítios como Vila de Rei (a 150 quilómetros da capital) ou Sousel (à mesma distância) pareçam locais remotos, num sertão longínquo.
Um trabalho em curso tem-me feito percorrer todo a raia. Comecei em Mourão, passei depois para o limite norte do Alentejo, depois a Cova da Beira, de seguida a encosta oriental da Serra da Estrela, agora o planalto mirandês. À medida que percorro as estradas, dia após dia, num registo interessante, mas cansativo, vou-me perguntando “para onde foram todos?...”. Passo por aldeias perdidas e sem gente, por sedes de concelho onde, a espaços, vejo um ou outro jovem. O mais extraordinário é constatar, sem esforço, nem favor, que este interior nada tem a ver com a raia miserável dos anos 50 e 60. Que há infraestruturas de qualidade e prontas a funcionar. Sítios como Trancoso, Redondo, Celorico da Beira, Nisa, Sabugal, Penamacor estão bem arranjados e são muito agradáveis. Assim vazios, parecem um salão de festas à espera que os convidados apareçam. Para onde foi toda a gente?, pergunto-me, temendo saber a resposta.
As estradas que percorro são as da angústia. Não há gente, porque o Poder Central abandonou vastas faixas do território à sua sorte. Quando vêm inaugurar feiras – este ano, nem isso... – lá vem a revoada de banalidades elogiosas aos autarcas, ao esforço das populações, à autenticidade do país real. “It kills me”, como dizia o personagem de “Catcher in the rye”, quando elogiam a autenticidade. Parece que estão em visita a uma reserva de criaturas exóticas.
Há 20 anos prometiam-se benesses a quem fosse viver para o tal interior. Não deu em nada. Duas décadas volvidas criou-se uma fantasia, simpática e inofensiva, chamada “Unidade de Missão para a Valorização do Interior”. Não deu em nada, nem dará em nada. Por uma razão simples. Lisboa e Porto elegem 98 deputados. Beja, Évora, Portalegre, Guarda e Viseu elegem, em conjunto, 19 deputados. Somos uma aposta curta. Temos o Património e o Turismo. E isso é pouco.
Entretanto, fecham escolas, postos de correios, quartéis da GNR, num desinvestimento global e programado. De forma discreta, vai-se passando a mensagem que a batalha está perdida. Não está, assim nós queiramos fazer o contrário. Para baralhar, há presidentes de câmara que nos querem convencer que a devolução da taxa variável do IRS, ou a simpatias para com os recém-nascidos, são um estímulo à atração da população. Não atraem coisa nenhuma.
Falta-nos e falha-nos o Estado. Agora mais que nunca. “¡Pobre México, tan lejos de Dios y tan cerca de Estados Unidos!”, dizia o presidente Porfirio Díaz (1830-1915). Penso muitas vezes nestas palavras. Estamos perto de Lisboa, cada vez mais perto. As viagens são cada vez mais curtas. O resto, todo o resto, é um abismo que cresce.
Crónica em "A Planície"
Espero que percorras a raia de Mourão para sul e assim completes esse périplo de suma importância, para nos dares conta da realidade do terreno fronteiriço. Creio que vale a pena valorizar os esforços dos agentes locais nas infraestruturas, mas também na cultura e educação, e atender às iniciativas colectivas, mesmo que residuais. Um abraço e continuação de bom trabalho!
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