Por entre as colunas de pedra, um borboleta
negra com vermelho nas asas voava. Entre uma coluna
e outra procura a entrada para o centro onde
se arrancaram corações de cativos e de virgens. Talvez
quisesse que o seu vermelho a tingisse com o sangue
das vítimas; talvez quisesse roubar-lhes, dos lábios,
o último sopro, ou o último grito. Pensei
que a poderia seguir por entre as colunas; mas
o cão que parecia dormir, na perpendicular
de vénus, levantou a cabeça e olhou-me, como
se fosse o jaguar devorador de corações. Tudo tem
a sua lógica quando procuramos dar um sentido
ao acaso. E olhei para o alto da pirâmide
como se lá estivesses, à minha espera, com os teus olhos
presos nas asas da borboleta e a chamar por mim,
como se nao tivesses já o meu coração
sem teres precisado de o arrancar na câmara
dos sacrifícios (ao que dizem, fechada
por motivos de segurança).
Passaram-me, discretamente este poema de Nuno Júdice, ontem, a meio de uma sessão de leitura de poesia. Fiquei com dúvidas que fosse para o ler em público. Pensei que não era. Afinal era, disseram no fim. Fiquei quase feliz por nao ter percebido. Mas só mesmo quase.
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