quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

2020 - VISTO, REVISTO E SEM SAUDADES

Foi o mais bizarro ano destes 57 que conheci. Um tempo inclassificável. E, no entanto, nada o faria prever. A capacidade de adaptação que todos temos é espantosa. Em março fui para casa. Em junho regressei a 100%. No final desse mês comecei um levantamento fotográfico concluído em outubro. Foram meses de bisonha solidão. Mas o trabalho fez-se. Terminaram-se livros, concluíram-se exposições. Dei aulas e fui trabalhando. A vida é menos divertida que antes? Muito menos. Faltam-me as festas e as romarias, as corridas de touros e os jantares com os forcados. A ópera e o cinema. As saídas sem máscara. Andar na rua. Isto vai ter de terminar. Ou em autómatos nos tornaremos.

O que destaco no meu ano de 2020? Foi um ano muito profissional. Centrado em projetos de trabalho. As alternativas eram poucas.


Janeiro

Arguição de uma tese de doutoramento na Universidade Nova. Um momento que fez parte de um percurso retomado em final de outubro de 2017.

QUARTA-FEIRA, 22 DE JANEIRO DE 2020

DIA DE TESE

Não é prática corrente, até porque, formalmente "não estou na carreira". Mas a arguição da tese de Luís Gil, que me foi pedida pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, deu-me especial prazer, por ser sobre Marrocos e por ser um importante esforço de identificação de campanhas de obras e da sua datação.

Safim e a aventura colonial portuguesa no norte de África foram a minha companhia nos últimos dias. Virar de página. Outras coisas se aproximam.

(gosto em especial que o traje académico de Letras, em França, seja amarelo e preto, as cores de uma das minhas terras; a fotografia, com a luz detrás, fez-me lembrar uma música dos Pink Floyd...).

Fotografia de grupo, após as provas (da esquerda para a direita):
Francisco Caramelo (diretor da FCSH), Mário Barroca (Univ. do Porto), Paulo Pereira (Univ. de Lisboa), Luís Gil), o autor do blogue, Luís Miguel Duarte (Univ. do Porto) e André Teixeira, orientador da tese (Univ. Nova de Lisboa)


Fevereiro

Ida a Silves, para a derradeira viagem da exposição "Caligrafias". Um caminho iniciado em finais de 2017 e que em 2020 se concluiu.

DOMINGO, 9 DE FEVEREIRO DE 2020

PELA TARDE DE SILVES

A Câmara Municipal de Silves organizou uma simpática abertura das Caligrafias, na torre de menagem do castelo. Foi um ida e volta em registo blitz. O suficiente para recordar o que foi a aventura da montagem da exposição Algarve Islâmico, inaugurada a 16.7.2010 (v. aqui). A tarde estava cinzenta, a fazer recordar o célebre poema céu pluvioso, de Ibn Ammar. Mas deu para ver que Silves continua bonita.

As caligrafias estarão por Silves até ao próximo dia 12 de abril.

Março

Subitamente, tudo mudou. O mundo começava a parar. De uma forma que não se imaginaria. Recordo-me de ir dar aula e dizer "para a semana, não estaremos aqui". Não voltei a ver os alunos pessoalmente.

SEXTA-FEIRA, 13 DE MARÇO DE 2020

UM POUCO DE UM DESNECESSÁRIO AGOSTO EM MARÇO...

O telemóvel diz a hora precisa: 20:38:52. Não é a hora de maior "pico" na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, mas nunca tinha visto o edifício assim. À saída do seminário do Mestrado em Património há sempre alunos e colegas à vista. Ontem, ninguém. O pátio deserto, a Avenida de Berna vazia, a Avenida Lusíada sem carros (!). Subitamente, o País reagiu (levou tempo, mas foi...).

A Faculdade fecha na segunda e só abrirá no final do mês. Acho que será depois, mas isso agora é irrelevante.

Os adiamentos sucedem-se:

12 - adiada reunião na Câmara Municipal de Lisboa
14 - adiada a visita à Lisboa Islâmica
14 - adiado o lançamento de um livro
19 - adiada reunião na Caixa Geral de Depósitos
21 - adiado o concerto no CCB
31 - adiada uma conferência no Gabinete de Estudos Olisiponenses

Creio que não ficará por aqui.

Abril

À falta de melhor, e fechado em casa, resolvo falar sobre o Património de Moura. Para minha enorme surpresa, quando aquilo acaba, tenho mais de 6.000 (!) visualizações. 

QUINTA-FEIRA, 30 DE ABRIL DE 2020

PATRIMÓNIO DE MOURA X 6.000


No início de abril comprei dois meses de "zoom". Era a maneira mais prática de continuar a dar as aulas. O método funciona, ainda que saiba a pouco. É um pouco como aquelas rodas estreitinhas que os carros agora têm quando temos um furo. Dão para desenrascar.

Resolvi aproveitar o zoom, o trabalho acumulado sobre Moura e projetos em curso para quatro curtas conversas à volta do Património. Tive a surpresa de contar, ao todo, com mais de 6.000 visualizações. Esperava umas centenas, vá que chegasse ao milhar.

O mérito não é meu, é da terra. E dos que lá nasceram ou vivem e que gostam de Moura. E do interesse que os temas suscitam.

Aqui ficam os links e os temas:

COMO DUARTE DARMAS VIU MOURA EM 1510
https://www.facebook.com/santiago.macias.58/videos/10217653092060859/

A MOURARIA DE MOURA
https://www.facebook.com/santiago.macias.58/videos/10217722009183744/

AS MURALHAS MODERNAS DE MOURA
https://www.facebook.com/santiago.macias.58/videos/10217799001228497/

DA PRATA DA ADIÇA À MOURA SALÚQUIA
https://www.facebook.com/santiago.macias.58/videos/10217871808568635/
Maio

Foi o mês de terminar um livrinho começado em 2012. Foi sendo feito ao sabor do tempo. Sem rigor (nenhum, mesmo) nem pressa (ainda menos). Ficou feito e será impresso em 2021.


DOMINGO, 24 DE MAIO DE 2020

MÚSICA GUINEENSE

É assim que me soa o crioulo, a uma toada musical. E é assim que arranca o livrinho:

Marjen di riu i un tapadu di tarafi. Marjen di riu i un linha ki ka kortadu. Tris ora dipus di ianda na iagu na metadi di tarafi, di seu fungulidu ku di mar fungulidu, barku tchiga Bulama. Na mar no ka na odja sidadi. No na odja son puntu, ku pekaduris manga del suma kakris na kabas.

Pensada em 2012, anunciada em abril de 2013, está perto do final esta saga teimosa sobre Bolama. Há dias, um escritor guineense, Geraldo Marinho Pina, enviou-me a tradução do texto. Vamos ao financiamento do que falta.

Junho

Foi tempo de recordar prémios recebidos pelo Museu de Moura em 2016 e em 2017.

TERÇA-FEIRA, 30 DE JUNHO DE 2020

JUNHO, MÊS DE MUSEUS

Junho é mês de museus. Moura recebeu prémios da Associação Portuguesa de Museologia em junho de 2016 (menção honrosa na secção "exposição" pelo trabalho Água, património de Moura) e em junho de 2017 (prémio "instituição do ano"). Como alguém costuma dizer "eu sei como aconteceu; eu estava lá!".

No próximo ano letivo, irei explicar, em Moura, aos alunos do Mestrado em Património quais as possíveis opções ante os recursos que temos. Como se fez a intervenção na arqueologia e nos museus 💗💗💗, áreas onde trabalho há 35 anos (esta parte custa a escrever...). Em especial, há um aspeto que importa frisar. Não há caminhos únicos, não há projetos "exemplares" nem há exemplos a seguir. Há, sim, esforço e a procura da originalidade a partir do território.


Julho

O "Público" pediu-me um testemunho sobre a reconversão da basílica de Santa Sofia. Vim depois, a constatar, não sem surpresa, que o texto era menos pacífico do que eu suporia. É a vida...

DOMINGO, 19 DE JULHO DE 2020

QUANDO O PATRIMÓNIO É ARMA POLÍTICA

A recente decisão turca de reconverter a basílica de Santa Sofia em mesquita é mais um capítulo na já longa história do monumento. De basílica para mesquita, depois museu, agora novamente mesquita. Esta última mudança causou comoção e protestos um pouco por todo o nosso mundo ocidental. A intenção fora expressa por Recep Tayyip Erdogan, em março de 2019, durante a campanha eleitoral para as eleições municipais. O tema nem sequer é recente. Há mais de 50 anos, o poeta islamista Necip Fazil Kisakurek protestava publicamente contra o estatuto de museu dado à antiga mesquita. E profetizava que o regresso ao passado seria uma questão de tempo. Não se enganou.

Esta decisiva mudança de estatuto representa um retrocesso? Não tenho dúvidas que as modificações de uso de monumentos, determinadas de modo reativo e como forma de marcar uma agenda política, são sempre um recuo. Também aqui não há novidades. No fundo, e de forma talvez demasiado simplificadora, aquilo que nós, ocidentais, valorizamos do ponto de vista cultural e patrimonial, é aquilo que outros rejeitam. A destruição dos Budas de Bamyan e de importantes testemunhos históricos e artísticos em Palmyra são as duas faces da intolerância e, também, de uma forma de afirmação política anti-ocidental. Nestes dois casos, tal como no de Santa Sofia, estamos ante exemplos de monumentos e de sítios classificados pela UNESCO como Património da Humanidade.

Não é tanto sabermos que a antiga basílica de Constantinopla volta a ser mesquita que é o fator principal de preocupação. Em boa verdade, o monumento está na Turquia e é aos turcos que, em última análise, cabe uma decisão sobre o uso a dar aos seus edifícios históricos. Claramente, têm esse direito, por muito que tal custe a um paternalismo ocidental que me faz lembrar, irresistivelmente, o episódio do astrónomo turco em “O principezinho”. O tal que só foi levado a sério quando se passou a vestir como nós.

O problema principal está nos danos colaterais. Erdogan, que se veste como nós, tem uma agenda política claramente traçada, desde há muito. Ao reverter Santa Sofia,passando por cima da Convenção do Património Mundial de 1972,deu mais um claro sinal à Europa. E arriscou, também, abrir a caixa de pandora do Património. Claro que deu garantias que fica “quase tudo” como antes. Toda a gente, independentemente do seu credo e nacionalidade, pode continuar a visitar a mesquita. E também está garantida a preservação dos mosaicos cristãos que cobrem as paredes interiores de Santa Sofia. Que serão, pudicamente, tapados com cortinas ou com raios laser durante as orações. Uma operação que terá de ser repetida 1825 vezes por ano. A tentação seguinte será, bem o temo, a cobertura dos mosaicos por períodos mais dilatados de tempo. Soluções diplomáticas como este “tapa-destapa” esbarram, mais cedo ou mais tarde, na realidade do quotidiano, nas pressões de grupos radicais e nos interesses políticos à qual a realidade e a perenidade do Património são alheias.

Hoje, no "Público"

Agosto

Em meados de agosto fechava-se a lista de apoios a este projeto. O verão e o outono forma passados numa incessante recolha de imagens.

QUINTA-FEIRA, 13 DE AGOSTO DE 2020

DUARTE DARMAS - O SITE E OS APOIOS


Aos poucos, o projeto (promovido pela MULTICULTI, e do qual sou autor) toma forma. O site agora tem o formato definido, com as cinco secções que o compõem. Dos 20 castelos, estão registados 13 (até final do mês de agosto essa tarefa estará terminada).

Para já, está aberta a secção onde se reproduzem as imagens desses 20 castelos, segundo foram vistas por Duarte Darmas, há cerca de 500 anos. Quais são os sítios abrangidos?

Alandroal
Alpalhão (Nisa)
Arronches
Assumar (Monforte)
Campo Maior
Castelo de Vide
Elvas
Juromenha (Alandroal)
Mértola
Monforte
Monsaraz (Reguengos de Monsaraz)
Montalvão (Nisa)
Moura
Mourão
Nisa
Noudar (Barrancos)
Olivença
Ouguela (Campo Maior)
Serpa
Terena (Alandroal)

O site tem também uma secção consagrada aos apoios. Ou seja, às entidades que tornaram possível este projeto e a quem é devido reconhecimento e agradecimento:

Apoios financeiros
Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Alentejo
Caixa Geral de Depósitos
Turismo de Portugal
Direção Regional de Cultura do Alentejo
Continente
Cafés Delta
Câmara Municipal de Barrancos
Câmara Municipal de Campo Maior
Câmara Municipal de Castelo de Vide
Câmara Municipal de Elvas
Câmara Municipal de Mértola
Câmara Municipal de Mourão
Câmara Municipal de Reguengos de Monsaraz
Câmara Municipal de Serpa

Parcerias institucionais
Arquivo Nacional da Torre do Tombo / DGLAB
Turismo do Alentejo / ERT
Resialentejo
  

Setembro

Ainda sob o signo do Património. O mês de setembro veria chegar ao fim o processo de deliberação em torno do Prémio Vilalva. Não tivemos granes dúvidas, sobretudo depois da visita ao local.

SEGUNDA-FEIRA, 21 DE SETEMBRO DE 2020

RESTAURO DA IGREJA DE SANTA ISABEL, EM LISBOA, VENCE PRÉMIO VILALVA

A notícia foi hoje divulgada. O Prémio Vilalva é atribuído ao restauro de um igreja em Lisboa.












O júri salientou ainda: 

A espetacularidade e requinte estético do projeto de pintura de Michael Biberstein (na foto), que cobre a totalidade da abóbada. Trata-se de uma das mais notáveis intervenções da arte contemporânea numa arquitetura clássica, concretizada depois da morte do pintor com o acompanhamento do artista Julião Sarmento e do curador Delfim Sardo;

A pluridisciplinaridade e elevadíssimo nível de qualificação da equipa (coordenada pelo Padre J.M. Pereira de Almeida e pelo Arq. João Appleton) que tem procedido aos trabalhos, potenciando saberes da engenharia, da conservação e restauro, da história da arte, do design de equipamentos e da arte contemporânea;

A metodologia de intervenção em faseamentos sucessivos que, em 2020, se concentram na valorização do altar inicial da Igreja e na criação de novo mobiliário litúrgico. 

O júri decidiu ainda atribuir uma  menção honrosa ao projeto de reconversão e reabilitação do Prédio na Rua da Boavista, 69, também em Lisboa. A decisão, de acordo com o júri, justifica-se pela qualidade do projeto de reconversão e reabilitação de um prédio que será de fundação fino-setecentista e pelo empenho dos arquitetos Filipa Pedro e Paulo Pedro na recuperação e recriação de diversos elementos construtivos e decorativos do edifício inicial ou das sucessivas fases da sua historicidade. 

Ver - https://gulbenkian.pt/noticias/restauro-da-igreja-de-santa-isabel-em-lisboa-vence-premio-vilalva/

Outubro

Conclusão de mais um processo "longo". Depois de quase 5 anos de avanços e recuos, era inaugurada na Sé Patriarcal a exposição "Moita Macedo - diálogo na Sé". Por razões que agora não vêm ao caso, foi também um saboroso ajuste de contas com um passado próximo.

SEXTA-FEIRA, 23 DE OUTUBRO DE 2020

MOITA MACEDO - DIÁLOGO NA SÉ

"Moita Macedo - diálogo na Sé" é o título da exposição que pode ser vista na Sé de Lisboa, entre 27 de outubro e 29 de janeiro de 2021.

O projeto, que arrancou em 2013 ou em 2014 (foi anunciado aqui no blogue como "recente" em 22 de março de 2015). Não é que seja complicado, do ponto de vista técnico. É um projeto bem fácil, diga-se de passagem... O pior foi lidar com o Sr. Cronos. E, ultimamente, com a Pandemia. E com outras limitações. Mas o projeto está terminado, haverá exposição e catálogo. A partir de dia 27 de outubro, na sala do tesouro da Sé Patriarcal.

O catálogo, que também coordenei, tem textos de D. Manuel Clemente, do Pe. Vítor Melícias e do autor do blogue. As fotografias, de grande qualidade, são de Fábio Moreira, que fez impossíveis, tendo em conta as difíceis condições de trabalho.







Do meu texto para o catálogo:

Os tons nacarados do algumas das suas obras parecem ter sido pensados para o ambiente operático do tesouro da Sé Patriarcal. Vermelhos cardinalícios, ouro e prata estão perto da cor das pinturas de Moita Macedo. Tal como Cristo Crucificado pertence a este sítio. Foi esse jogo, de temas, de cores, de evocações, de palavras que ecoam na Catedral, que quisemos criar e dele fazer diálogo. 

Novembro

Dois anos passados (o processo tiver início em novembro de 2018), abria finalmente ao público a exposição sobre os mártires de Marrocos. À medida que o ano caminhava para o final, ganhar a sensação de ser um tempo de viragem. Muitos processos concluídos, pensando já noutros tantos para o futuro.

QUINTA-FEIRA, 19 DE NOVEMBRO DE 2020

FINALMENTE, "GUERREIROS E MÁRTIRES"

Uma longa e sinuosa estrada, desde a primeira proposta, enviada ao Diretor do Museu Nacional de Arte Antiga, no outono de 2018.

A partir do martírio de cinco frades franciscanos, ocorrido em janeiro de 1220, construiu-se um projeto ao qual se deu o subtítulo A Cristandade e o Islão na formação de Portugal.

São mais de 200 peças, com as quais se tenta enquadrar uma época, a partir do que aconteceu em Marrakech.

A exposição está muito bonita, mas esse mérito é da Manuela Fernandes e da Sónia Teixeira Pinto, não dos comissários.

A inauguração foi hoje tarde, presidida pela Ministra da Cultura.










































Dezembro

Termina o ano com um texto sobre Mértola. Há regressos a que não se escapa, nem quer escapar.

SÁBADO, 26 DE DEZEMBRO DE 2020

REVISTA PATRIMÓNIO: UM TEXTO SOBRE MÉRTOLA

Verdade se diga que ainda não vi a revista.  Recebi um mail do Manuel Lacerda avisando que, depois de inúmeros constrangimentos devido à COVID, saiu finalmente o nº. 7 da Revista Património, uma edição da Direção-Geral do património Cultural. Fui, há meses, convidado para escrever  sobre Mértola. A abordagem é marcadamente impressionista, como tudo o que se passou (falo do ponto de vista pessoal) ao longo destes quase 40 anos. Pouca teorização, muita atuação de terreno. Muitos textos, exposições, livros e permanente interação.

Foi assim e assim será.




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