terça-feira, 2 de janeiro de 2024

AS FESTAS DO CONCELHO E A CÂMARA MUNICIPAL

A Rádio Planície anunciava, no seu site e sua página no facebook, no dia 26 de dezembro: “O evento anual na cidade [Festas de Nossa Senhora do Carmo] terá apenas as celebrações religiosas por não ter sido apresentada nenhuma lista para integrar a Comissão de Festas 2023/2024”. Ditas as coisas desta forma, há três possibilidades: uma, a festa limita-se à parte religiosa e haverá, eventualmente, um ou outro concerto pelas nossas bandas filarmónicas; segunda, mobilizam-se as boas vontades para haver uma comissão e faz-se a festa nos moldes habituais, com maior ou menor espavento; terceira, a Câmara Municipal toma conta da festa.

 

Em 2016, houve uma destas costumeiras pequenas crises. Quando chegámos ao início do ano, ainda não havia Comissão. Começou a pressão em cima da autarquia “a Câmara é que devia tratar disto”. Entendi que isso seria um “sprint” em direção ao precipício. E isto porque as comissões de festas que existem em todo o concelho, felizmente à margem do poder político-partidário!, são um dos melhores exemplos de capacidade de organização e de mobilização daquilo que hoje se chama “sociedade civil”. E têm as comissões uma flexibilidade e uma informalidade que uma estrutura pesada como uma Câmara Municipal jamais poderá almejar.

 

Não havia comissão. Isso não era, e era!, um problema da Câmara Municipal. Fiz um par de contactos e falei com um grupo de antigos festeiros. Tinham de “repegar” na festa. Houve uma reunião na sala de sessões. O ambiente era de fria simpatia. Não queriam voltar a fazer o duro percurso que já conheciam. Mas também não queriam deixar Moura sem festa. Depois de muita insistência, lá se avançou. A Comissão arrancou. Com calma e pragmatismo. Era um grupo grande, unido pela amizade. E pela competência. A partir de certa altura pensei “temos Festa”. Tivemos. Com um orçamento muito mais baixo que em anos anteriores. Mas não com menos brilho e não com menos entusiasmo. Mais ainda, depois daquele esforço todo e daquela contenção toda, ainda deixaram dinheiro em caixa para a comissão seguinte. A experiência que tive com aquela Comissão de Festas foi coisa inédita. Nunca tal me tinha acontecido. Nem voltou a acontecer.

 

Que defendo? Como sempre, que as autarquias devem estar em pano de fundo, para apoiar. Mas não devem querer assumir o papel de “donas do concelho”. Não podem, nem devem, tudo querer controlar. Devem criar espaço para que as pessoas, autonomamente, se organizem. Caso contrário, a partir do momento em que a Câmara assumir a organização deste tipo de celebração, isso será o fim da festa, tal como a conhecemos. E deixará no ar outra pergunta: se é assim em Moura, também poderá ser assim em todas as localidades do concelho... É isso que queremos?


À memória do José João Correia, que fez (e fará sempre) parte dessa inolvidável Comissão de 2016.


Crónica em "A Planície"




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