sábado, 28 de fevereiro de 2009

MOURA ORGULHA-SE!

Homenagem ao Dr. José Maria Pós-de-Mina

A recente nomeação do Dr. José Maria Prazeres Pós-de-Mina, Presidente da Câmara Municipal de Moura, pela organização norte-americana OneWorld, como uma das dez personalidades do ano que, a nível mundial, mais se distinguiram na área dos direitos humanos, justiça social e desenvolvimento sustentável, deu ao concelho de Moura uma grande projecção nacional e internacional.
Consideramos que a associação do nosso concelho à criação de melhores condições de vida para as gerações futuras, a que o nome de José Maria Prazeres Pós-de-Mina fica indissoluvelmente ligado, constitui um forte motivo de orgulho para toda a população do concelho de Moura.
Por essa razão, entendeu um grupo de pessoas constituir uma Comissão Promotora com o intuito de promover um jantar de homenagem ao Dr. José Maria Prazeres Pós-de-Mina, no próximo dia 6 de Março, através do qual a população possa expressar o seu reconhecimento a uma personalidade do concelho cujo trabalho na área das energias renováveis foi internacionalmente valorizado, e para a qual convidamos todos aqueles que se quiserem associar. As inscrições podem ser efectuadas em qualquer Junta de Freguesia do Concelho até dia 3 de Março.

Comissão Promotora: Amílcar Mourão, António Martins, Célia Gomes, Daniel Rodrigues, Francisco Honrado Pereira, Gertrudes Barros, Joaquim Santos, José António Oliveira, José Manuel Lima d'Oliveira. Luís Raposo, Maria Jesus Mendes, Paula Ventinhas, Zélia Parreira

Informações:
92 63 63 657 / 96 53 53 418 / 96 41 44 048



Três breves notas:
1. O título da iniciativa é magnífico. Não sei quem é o/a autor(a), mas que é muito bom, lá isso é.
2. A Comissão Promotora tem um toque de diversidade (a vários níveis) que se saúda e é, para mim, motivo de especial regozijo.
3. No dia 6 de Março lá estarei.

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

1973, UNS DIAS ANTES DO NATAL

Há sempre, nesta altura do ano, quem venha recordar os natais dos tempos de infância. As idas à Missa do Galo, os cânticos, a neve. Nascido numa família laica nunca fui à Missa do Galo nem lá em casa se celebrava o natal religioso. Nem quase o outro, que as prendas no sapatinho tinham um significado muito diferente do de hoje. Sem que o soubéssemos era um natal pagão, o assinalar do solstício, a família reunida e nada mais.
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De todos os natais lembro-me, com pormenor, do de 1973. Apenas desse. A avó Luzia piorava de mês para mês e fomos visitá-la a Madrid, onde vivia desde há muitos anos. Em Navalcarnero, a 70 kms. da capital começou a nevar, e foi essa a primeira das três ou quatro vezes em que até hoje vi neve. Era dia 19 de Dezembro, fazia muito, muito frio, e nada fazia prever o que se avizinhava.
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No dia seguinte de manhã, a Avenida Menendez Pelayo era um pandemónio de carros da polícia. “Mataram o primeiro-ministro”, dizia-se em cada loja e em cada esquina. A pouco mais de dois quilómetros da casa da avó Luzia, um comando da ETA acabara de fazer voar o carro do almirante Luis Carrero Blanco, o novo homem forte do regime.
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Pudémos ir ver o sítio pouco depois. A espectacular operação deixara marcas bem visíveis. Cem quilos de explosivos colocados sob o pavimento da rua tinham aberto um gigantesco buraco no pavimento da calle Claudio Coello. Supremo requinte, tinham-se dado ao pormenor de pintar um traço vermelho na parede para controlarem o momento em que o Dodge blindado do almirante passava sobre o explosivo. Durante meses, tinham escavado um túnel sob a rua (eram escultores, diziam à vizinhança para justificarem o som das pás e picaretas) até ao momento em que Carrero Blanco saiu da missa e o enorme carro negro foi pelos ares, sobrevoou o telhado do convento, num salto de dezenas de metros, e tombou com fragor no claustro onde Carrero estivera minutos antes. O tio António, padrasto do meu pai, levou-me até lá em silêncio. Combatera na guerra civil pela Falange e talvez, no íntimo, suspeitasse que aquele insólito voo do almirante simbolizava o fim de uma época.
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No fundo da cratera repousava uma coroa de flores. Há coisas que um miúdo de dez anos jamais esquece: aquele buraco lamacento junto à esquina com a calle Maldonado, as fotos do carro caído de lado e amassado no pátio do claustro, a ausência de Franco no funeral (“síndrome gripal” garantia o Ya, jornal do regime, mas toda a gente dizia que o velho estava borrado de medo), o frio da rua naquela primeira manhã de Inverno.
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O regime desfazia-se. Nos meses seguintes os taxistas madrilenos permitiam-se mesmo um humor negro de gosto duvidoso. Quando alguém pedia para ir para ir à calle Claudio Coello era brindado com a pergunta “E a que altura o levo?”.
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Estranhamente, não recordo que prenda tive nesse natal nem se havia presépio ou não. O atentado marcou aquela quadra sem que os anos apaguem tantos e tantos pormenores inúteis.
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Apesar do envolvimento da ETA os anos seguintes levantaram, como sempre sucede, teorias conspirativas, como a da suposta participação da CIA. No meio de tudo nunca se descobriu a identidade do “homem da gabardina branca” que terá entregue, à entrada de um hotel, os horários e os caminhos usados por Carrero Blanco. A pessoa que o poderia identificar foi assassinada por um comando de extrema-direita em 1978, o que só veio adensar o mistério.
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Nos anos seguintes as coisas mudaram. Portugal em 1974, a Espanha pouco depois, encontraram as rotas da liberdade. O meu último natal em Madrid foi em 1974, no nº 63, 4º F, da Menendez Pelayo. O cancro venceu a avó Luzia pouco tempo depois e Madrid deixou de ser sinónimo de casa mas sim outra cidade onde passei a ir apenas de tempos a tempos. E não tanto quanto gostaria. Na calle Claudio Coello, em frente ao nº 104, está hoje uma placa que assinala a morte de Carrero, num acontecimento que marcou a história de Espanha e que marcou de modo indelével os meus dias de infância.

Esta crónica foi publicada no jornal A Planície mas não tenho aqui a data...




O almirante Luís Carrero Blanco (1903-1973) foi o último primeiro-ministro do franquismo. O ditador faleceu menos de dois anos depois. E Arias Navarro já não conta nesta história.

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

SONHO DE UMA TERÇA-FEIRA GORDA

Eu estava contigo. Os nossos dominós eram negros, e negras eram as
nossas máscaras.
Íamos, por entre a turba, com solenidade,
Bem conscientes do nosso ar lúgubre
Tão contrastado pelo sentimento de felicidade
Que nos penetrava. Um lento, suave júbilo
Que nos penetrava... Que nos penetrava como uma espada de fogo...
Como a espada de fogo que apunhalava as santas extáticas!
E a impressão em meu sonho era que se estávamos
Assim de negro, assim por fora inteiramente de negro,
Dentro de nós, ao contrário, era tudo claro e luminoso!

Era terça feira gorda. A multidão inumerável
Burburinhava. Entre clangores de fanfarra
Passavam préstitos apoteóticos.
Eram alegorias ingénuas, ao gosto popular, em cores cruas.

Iam em cima, empoleiradas, mulheres de má vida,
De peitos enormes – Vénus para caixeiros.
Figuravam deusas – deusa disto, deusa daquilo, já tontas e seminuas.

A turba, ávida de promiscuidade,
Acotovelava-se com algazarra,
Aclamava-as com alarido.
E, aqui e ali, virgens atiravam-lhes flores.

Nós caminhávamos de mãos dadas, com solenidade.
O ar lúgubre, negros, negros...
Mas dentro em nós era tudo claro e luminoso!
Nem a alegria estava ali, fora de nós.
A alegria estava em nós.
Era dentro de nós que estava a alegria,
A profunda, a silenciosa alegria...

Poema de Manuel Bandeira, que teve a sorte de nunca ter encontrado as brigadas de bons costumes da PSP. De resto, e como se sabe, "não existe pecado do lado de baixo do Equador".


A fotografia retrata, segundo imagino, um momento de Carnaval. Não tenho a data mas faz parte do "período brasileiro" do grande fotógrafo Pierre "Fatumbi" Verger (1902-1996). Pierre Verger fixou-se em S. Salvador da Bahia em 1946. A partir daí continuou a fazer inúmeras viagens, mas foi no Brasil que, cada vez mais, foi vivendo. Criou a Fundação Pierre Verger, à qual legou todo o magnífico espólio de imagens. Mais informações em:

http://www.pierreverger.org

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

A ORIGEM DO MUNDO

Poucos livros terão tido tanta importância na minha vida como Para compreender a pintura: de Giotto a Chagall, de Lionello Venturi (1885-1961), lido no Verão de 1980, trinta anos passados sobre a data da primeira edição. Venturi era um historiador e crítico de arte com uma posição social e política bem definida. E o seu livro é um dos mais belos manifestos de libertação que jamais li. E não esqueço, e cito de memória, depois de todos estes anos, as vibrantes páginas de crítica à atitude académica de pintores como Ernest Meissonier (1815-1891), a quem acusava de representar homens sem alma, ou como Jean-François Millet (1814-1875), cujo Angellus interpretava como um acto de submissão ante os poderosos. Assim como recordo com toda a clareza o entusiasmo de Venturi ante um quadro como Os britadores de pedra de Gustave Courbet (1819-1877) e toda a luta que lhe estava subjacente. Com Venturi comecei a compreender as leis básicas da perspectiva, do enquadramento, das diagonais. Mas também, e sobretudo, a importância do papel social da Arte.
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Gustave Courbet era um socialista pouco dado a respeitar as convenções. Concebeu A origem do mundo em 1866, e o mínimo que se pode dizer é que a crueza do seu naturalismo estava, à partida, fadada à imortalidade (o quadro está hoje exposto no Musée d'Orsay, em Paris). Quase me espanta que, quase 150 anos volvidos, os oficiais do Santo Inquisição, agora travestidos com a farda cinza da PSP, percam tempo a apreender livros cuja capa é o quadro de Courbet.
a
Só não me espanta por completo porque, há cerca de duas décadas, uma fotografia de Mapplethorpe, provocatoriamente intitulada Man in Polyester Suit (1980), causou enorme celeuma. Que incluiu a sua remoção de uma exposição num museu norte-americano.

A História repete-se. Cabe-nos manter vivo esse ideal de uma Arte que questiona os poderosos, todos os poderosos, e o direito a uma liberdade de expressão sem constrangimentos.

UM BONECO CHAMADO OSCAR

O que têm em comum Alfred Hitchcock, Luis Buñuel, Jean-Marie Straub, Wim Wenders, Jean Rouch, Gene Kelly, Sergei Eisenstein, Jean Renoir, Sergio Leone, Michelangelo Antonioni, Kenji Mizoguchi, Jim Jarmusch, Pier Paolo Pasolini, Theo Angelopoulos, Yasujiro Ozu, Fritz Lang, Jean-Luc Godard, Ingmar Bergman, Frederick Weisman, Robert Flaherty, Akira Kurosawa, Ken Loach, Robert Bresson, Paul Thomas Anderson, Vittorio de Sica ou Andrei Tarkovsky? Nenhum deles ganhou um prémio americano chamado oscar. A maior parte deles nunca teve, sequer, uma das tais famigeradas nomeações. Foi, contudo, graças a eles que a Arte do Cinema se afirmou e, a cada dia, continua a alargar horizontes.
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Orson Welles ganhou um pelo argumento de Citizen Kane, Stanley Kubrick outro pelos efeitos visuais (apenas e só) de 2001: uma odisseia no espaço, Francis Ford Coppola está declarado como morto pela Academia desde 1979 (a despeito desse genial falhanço que foi Do fundo do coração). A lista poderia prolongar-se.
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Os oscars são importantes? Como técnica de vendas, sim. Para o Cinema, raramente.
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Para quem tiver curiosidade, veja-se uma das mais respeitadas listas dos melhores filmes jamais realizados. É a da revista britânica Sight and Sound (a lista é renovada apenas de 10 em 10 anos - a última edição data de 2002):

domingo, 22 de fevereiro de 2009

SUBTERRÂNEOS DE ALFAMA

A melhor maneira de passear pela Lisboa antiga é a pé. Por isso despachei o carro no estacionamento das Portas do Sol. O sistema é sofisticado: colocamos o carro numa plataforma, fechamos as portas e saímos. Um elevador leva o carro por ali abaixo. Para o reavermos pagamos, o cartão identifica a viatura (fiquei com a secreta esperança que me entregassem um Jaguar, mas não...) e o elevador volta a pôr o carro à superfície.
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Sofisticado e até um bocadinho chique. Mas não totalmente seguro. À entrada um aviso previne (e juro que não é brincadeira minha) "não deixe seres vivos dentro da viatura". Fiquei intrigado mas resisti a fazer indagações sobre os terríveis segredos que os subterrâneos de Alfama encerram. Serão vampiros sedentos de sangue humano? Haverá zombies? Por Deus, o que se esconderá no subsolo de Lisboa que leva a tal conselho?

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

NO CAIRO

A meio do projecto Discover Islamic Art fui convocado para uma reunião no Cairo. Os primeiros dias foram dramáticos. Trabalhava-se na sala de congressos do hotel de manhã à noite. Sem sequer sair à rua. A partir do terceiro dia fui "adoptado" por uma colega egípcia e pelo marido, que era economista e passava pelo local da reunião para a recolher. O Amr passou a levar-me pela noite do Cairo, de bar em bar, fumando narguilé e conversando das coisas da vida. Fomos a esplanadas ver futebol, passámos horas sem conta no El Fishawy, o mais célebre café de Khan el-Kahlili. Habibi, chamava-me às tantas o empregado, e uma vez que me tinha tornado cliente habitual.
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Quando regressava ao hotel, noite dentro, a televisão passava clips musicais das vedetas do Médio Oriente (a música ocidental é tão invulgar no Levante como uma palmeira no Ártico). O êxito do momento era este Etazalt el-Gharam, da libanesa Majida el-Roumi. Até hoje o Cairo permanece sinónimo da Ayda e do Amr, do el-Fishawy, do narguilé e da voz doce da bela Majida.
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Desgraçadamente shuf, shuf, habibi, shuf (olha, olha, meu querido, olha) é o limite do meu conhecimento de árabe neste clip.



Majida el-Roumi é uma mulher do Mediterrâneo. Nasceu em 1956, no Líbano, no seio de uma família católica grega. O seu prestígio, na margem sul deste nosso mundo, é imenso.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

E JÁ QUE É CARNAVAL...

Bom, a fotografia é para aí de 1980 ou de 1981. O grupo é 100% mourense. E até lá estão dois políticos actuais. Viva o Carnaval!

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

TODOS OS SÁS LEÕES DO MUNDO

Do Público de hoje:
Um dos advogados de Júlio Monteiro, Sá Leão, disse não haver "dados novos", mostrando-se convicto de que, em relação ao seu cliente, "o caso fica por aqui". Sá Leão adiantou ainda que Júlio Monteiro foi ouvido pelos dois procuradores do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), encarregados do caso, Vítor Magalhães e Pais Faria, e por quatro inspectores da PJ. Pompeu de Sá Leão y Seabra, bispo de Malange
O realizador de filmes eróticos Sá Leão (aqui com Cicciolina)
a
Parto do princípio que sejam pessoas diferentes...

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

O POLITÓLOGO, HUGO CHÁVEZ E A VENEZUELA

A vitória de Hugo Chávez no referendo venezuelano causou uma torrente de comentários. De entre estes, os meus preferidos são os dos politólogos profissionais. Na segunda-feira de manhã, o que estava de serviço à Antena Um alinhavou um chorrilho de banalidades, com particular destaque para as lapalissadas “a Venezuela está dividida ao meio” e “Chávez tem o apoio de metade mais pobre da população” (sério? ninguém diria…), terminando com a despeitada sentença “se fosse daqui a dois meses, e com o petróleo mais baixo, não ganhava”.

Mais insólita foi a afirmação de que Chávez é um fenómeno isolado e sem consequências. O que me leva a concluir que há politólogos profissionais que são de uma crassa ignorância quanto à história recente da América Latina. Pior que isso, ignoram-se, ou faz-se por ignorar, o que são as condições sociais de todo um continente e de que modo o imperialismo norte-americano se tem esforçado para as manter. Não há politólogo que apague a consciência política de todo um continente e conviria aos zelosos comentadores saberem que foram e o importante papel político que tiveram Salvador Allende (no Chile), Velasco Alvarado (no Peru) ou Juan José Torres (na Bolívia). Ou quem são Daniel Ortega (na Nicarágua), Evo Morales (na Bolívia) ou Rafael Correa (no Equador).

A minha simpatia por esta fase festiva e de plena consciência social de Hugo Chávez é evidente. E é claro que, falando só na Venezuela, bastariam recordar os consulados sinistros de Pérez Jiménez e de Carlos Andrés Pérez, que roubou tudo quanto pôde, para eu próprio optar pelo lado do povo e da justiça.

Já agora, e para aqueles que desconheçam o brilhantíssimo currículo do presidente colombiano Alvaro Uribe, que pesquisem o tema. Infelizmente, o tema Uribe parece interessar pouco aos nosso media...

RENFE



Outro dos meus anúncios preferidos. O da RENFE (caminhos-de-ferro espanhóis), feito nos inícios dos anos 90. Nada de palavras, apenas o som, a luz e o jogo da lentidão de uns e da rapidez de outros. São ideias tão directas, simples e fáceis de apreender que qualquer pessoa as capta. A publicidade no seu melhor.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

MANUAL DE INSTRUÇÕES

A primeira televisão da família foi comprada, talvez em 1968, talvez em 1969, ao sr. Manuel Alfaiate. “É simples, o botão roda para a direita e liga, para a esquerda desliga”. Na realidade havia mais dois botões: o do meio controlava mais luz menos luz, o da direita mais som menos som. “Se houver problema diga qualquer coisa”. Não houve e o His Master’s Voice durou catorze anos. Já toda a gente tinha tv a cores e ainda o João dizia “enquanto esta durar não se compra outra”.
A
Senti uma pouca comum nostalgia da Rua Nova da Estação e da minha primeira tv quando no outro dia me tornei proprietário de um DVD Home Theatre System. Passaram-me para as mãos uma caixa enorme com um aparelhómetro lá dentro, um comando à distância, uma garantia europeia e cinco volumes de instruções. Abri um ao acaso. Diagramas e mais esquemas, folhas e folhas de ordens imperativas. Só me apercebi que estava no livro errado quando li qualquer coisa como “zestaw rozpoczyna odtwarzanie”. Era a versão polaca, pelo menos parece polaco. Dediquei-me então à tarefa de decifrar o volume em português. A diferença do português electrónico em relação ao polaco electrónico não é por aí além…
A
Ao cabo de duas horas, o DVD já funcionava. Um pouco pelo menos. Faltava, pequeno detalhe, o som, apesar das cinco-poderosas-cinco colunas. Pus o volume da tv no máximo para compensar. “Ena, agora sim, temos som” diziam os putos entusiasmados, enquanto o velho televisor se esganiçava e trepidava com a distorção. Mais um quarto de hora e consegui pôr as colunas a funcionar. As laterais, que a do centro estava muda. Reiniciei o sistema. Encostei o ouvido à coluna do centro. Agora sim. Quer dizer, mais ou menos sim. Agora não funcionavam as laterais. O manual da Sony (96 páginas!) mandava-me ir da página 10 para a 17 depois para a 59 e depois regressar à 10. Desliga e volta a ligar. Agora há som mas a imagem está a preto e branco. Já é uma e meia da manhã. Volto ao manual. Leio frases estranhas: “nos DATA CD/ DATA DVD que contêm ficheiros de vídeo DivX para além de faixas de áudio MP3 ou ficheiros de imagem JPEG, o sistema só reproduz os ficheiros de vídeo DivX”. O que é que raio isto quererá dizer?
A
De repente, já passa das duas, funciona tudo. Empurro o móvel contra a parede. Desaparecem a imagem e o som. Volto à casa da partida, como no Monopólio. Dou um berro e acordo os miúdos. Protestos do andar de cima. Mexo em todas as fichas e todos os botões ao mesmo tempo. Afinal era só a ficha SCART que estava fora do sítio. Não sei o que é a ficha SCART mas o Manuel é que me disse dois dias depois que era a ficha SCART que se tinha desligado.
A
São quase três da manhã e estou exausto. O manual de instruções vai para a gaveta mais funda. Os exemplares em inglês, francês, espanhol e polaco vão direitinhos para o balde dos recicláveis. Bem vistas as coisas, o livreco em português podia ter o mesmo destino. Quando o despertador toca às sete amaldiçoo o DVD e só tenho alento para pensar “ao menos o tio Podger* não tinha que estar na Câmara antes das nove da manhã…”. Saio de casa com saudades de ver o Daktari, e o Calimero e o Skippy e aqueles filmes todos que davam no His Master’s Voice a preto e branco. Que não tinha manual mas durou, mesmo sem instruções em polaco, para cima de uma eternidade.
s
* Personagem do livro Três homens num bote de Jerome K. Jerome (há exemplar na Biblioteca Municipal – vejam como o tio Podger pendura um quadro…)
A minha velha tv era mais ou menos assim, com aqueles selectores redondos e tudo. Quando chovia viamos o telejornal às risquinhas, como aquelas gravatas fora de moda.
Este texto foi publicado no jornal A Planície de 1 de Dezembro de 2007.

domingo, 15 de fevereiro de 2009

SÓCRATES REELEITO COM VOTAÇÃO ALBANESA

96,43% dos votos não é nada mau. Ainda longe, contudo, do profissionalismo dos 99,98% de Enver Hoxha.
A
Sempre me causou confusão nos países de partido único este raio de imprecisão: quem seriam os 0,02% que não estavam de acordo? Mas quem, Deus meu?

UM POEMA PARA ESTE DOMINGO

Um barco
atracado ao cais
é sempre
um sonho preso.

Luís Filipe Maçarico

sábado, 14 de fevereiro de 2009

TEMPESTADE NO PARAÍSO

De início, ninguém deu importância ao caso. Uma situação de conflito, algures nas Caraíbas Francesas: greves e agitação. Nada de relevante, numa Europa atolada em problemas.
a
Hoje, o Público deu-lhe destaque de primeira página anunciado que a agitação social faz tremer Paris. O antetítulo é, porém, mais significativo: "turismo ameaçado". As duas semanas passadas na Martinica em 1994 deram-me uma brevíssima, mas impressiva, visão do problema. Que radicava, e radica, em dois factores principais: em primeiro lugar, há 10 por cento de população branca que detém 90 por cento da riqueza, numa mistura de luta de classes e de luta de raças, como justamente sublinhava o jornalista do Libération Antoine Guiral; em segundo lugar, continuamos, todos nós, a olhar essas antigas colónias com mentalidade colonial. No fundo, são excelentes sítios para férias paradisíacas, com água tépida, vegetação luxuriante e gente simpática (os habitantes da Guadeloupe menos, ainda assim). Mas nada mais.
a
No fundo, a única surpresa é que os poderes das metrópoles se surpreendam por estas cíclicas explosões. Esquecendo-se que os vulcões podem estar adormecidos, mas não mortos. E esquecendo também que, em 1980, os independentistas kanakas puseram a ferro e fogo a Nova Caledónia.
a
A raíz do problema é sensivelmente a mesma, em dois locais tão distantes. E o cerne da questão, nestes DOM-TOM (departamento ultramarinos-territórios ultramarinos), está muito para além da simples questão do turismo ameaçado.

Fotografia de Elliott Erwitt, datada de 1950, realizada algures na Carolina do Norte. A imagem é tão violenta como a situação que retrata. A excelência da obra de Erwitt (n. 1928) passou pelos caminhos da denúncia social mas está longe de se circunscrever a este domínio. Uma perspectiva mais circunstanciada está disponível em http://www.elliotterwitt.com

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

HERMANOS VARGAS

A primeira vez que me cruzei com os Hermanos Vargas foi nas páginas da Aperture. Apesar de fascinado com as fotos nocturnas de Arequipa, deram em nada várias pesquisas na net assim como as buscas nos ficheiros de bibliotecas especializadas. Não havia um único livro publicado. O ano passado cheguei mesmo a contactar um amigo peruano, eminente sismólogo na Universidade de Lima, que pôs meio Peru à procura de um livro que, de facto, não existia.
Afortunadamente, em meados de 2008, a Fundação Seoane (A Coruña) anunciou a montagem de uma exposição sobre os Hermanos Vargas.
a
Carlos e Miguel Vargas Zaconet nasceram em Arequipa em 1885 e 1887, respectivamente. O estúdio de arte Hermanos Vargas esteve aberto até 1958. Deixaram mais de 10.000 negativos, de onde se destacam os trabalhos realizados entre 1910 e 1930. São retratos e imagens de festividades, fotografias de artistas, militares e individualidades da época. São, sobretudo, as enigmáticas imagens nocturnas da cidade natal. Aqui fica uma pequena amostra, a começar por um auto-retrato da dupla.
a
Tentei, em vão, encontrar o catálogo da exposição comprado na Coruña. Perdemos com facilidade aquilo que, por vezes, tanto procuramos. A assombração dos Vargas continua a pairar por aqui.
Mais dados em:







quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

PEPE MARCHENA



Quando íamos a caminho de Paymogo o João insistia sempre em cantar os fandangos das serranias de Huelva. Como o João canta pessimamente sempre liguei a tradição do flamenco aos momentos de tortura sonora que faziam dueto com o estado da estrada de Cabezas Rubias. Os anos passaram, a casa da Calle Camioneta foi vendida e Paymogo é apenas o sítio onde toda a família um dia viveu.
O tempo se encarregou de corrigir a minha injusta imagem de uma das mais belas sonoridades do mundo. Lá em casa têm agora lugar no pódio Paco Toronjo (1928-1998), El Cabrero (n. 1944), Juanito Valderrama (1916-2004) e este inclassificável Pepe Marchena (1903-1976), cuja voz e cujo temple me causam arrepios e uma inexprimível emoção. O João continua, contudo, a cantar pessimamente.

Não sei qual a data do registo. Presumo que seja da fase final da vida de Pepe Marchena. Acompanha-o à guitarra Benito de Mérida.

AZEVEDO E SILVA

O respeitoso membro de azevedo e silva
nunca perpenetrou nas intenções de elisa
que eram as melhores. Assim tudo ficou
em balbúrdias de língua cabriolas de mão.

Assim ficou tudo até que não.

Azevedo e silva ao volante do mini
vê a elisa a ultrapassá-lo alguns anos depois
e pensa pensa com os seus travões
Ah cabra eram tão puras as minhas intenções

E a elisa passa rindo dentadura aos clarões.
e
e
Há muitos anos atrás (inícios de 1986) Alexandre O'Neill foi à Faculdade de Letras de Lisboa. A ideia era uma sessão de poesia, ou algo semelhante. Durante três horas O'Neill falou, leu, recitou, disse mal e disse bem. Foi cáustico e poético, ternurento e impiedoso. O'Neill, o mais e o menos português de todos nós, divertiu-se. Recordo claramente que não leu este poema. E que também não falou das suas outras vidas, como a de publicitário. Mas tenho a certeza que aquela tarde de Inverno foi uma das mais importantes da minha vida. E eu até nem lá fui para ouvir o O'Neill mas sim outro autor. O qual, benza-o Deus, até ficou calado, limitando-se a dizer, de tempos a tempos, para o poeta: "Continua que a malta está a gostar".

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

DE COMO O MEDITERRÂNEO DESAPARECEU À HORA DE ALMOÇO

E eis que, à hora de almoço, o Mediterrâneo desapareceu. Era uma daqueles programas televisivos de divulgação, sérios e científicos. Com gráficos e placas tectónicas, aparelhos estranhos e cientistas com ar de cientistas. Onde se explicava que as plcas tectónicas se movem e que, ao ritmo actual, um Mediterrâneo um dia há-de desaparecer. A Grécia cola-se à Líbia, a Espanha à Argélia e a Marrocos.
"Estou convencido que a Terra é muito extensa e de que habitamos somente a porção dela que vai do [rio] Phasis até às colunas de Hércules, espalhados pelo litoral como formigas ou rãs em torno de um lago." (Platão, Fedon). Um dia já não será assim. Talvez nesse dia caiam as barreiras que nos separam.
Quando vai chegar esse dia? Dentro de uns 50 milhões de anos. Podemos respirar, entretanto.
DUBROVNIK

BONIFACIO

AI MUITO ME TARDA O MEU AMIGO NA GUARDA

Os projectos foram despachados depressa? Ou mesmo muito depressa? Não me parece que o problema esteja aí. Oxalá se conseguisse que em todos os sítios os projectos fossem despachados muito, mas mesmo muito, depressa. A questão crucial nos projectos atribuídos a Sócrates é saber quem, de facto, os fez. Das três uma: 1) era ele o autor e ponto final; 2) há dúvidas na autoria e, nesse caso, estamos perante um daqueles problemas de atribuição, como sucede em tantas pinturas da Idade Média (será que podemos dizer "obra atribuída à Escola de José Sócrates"?); 3) Houve batota ou, no mínimo, balbúrdia (a somar ao nevoeiro que envolve a sua licenciatura).
E, no entanto, o pior é mesmo a "arquitectura" produzida pelo PM (a imagem foi tomada de empréstimo no "31 da armada"). Que revela todo um estilo, todo um gosto, toda uma cultura. É o pato-bravismo em toda a sua elegância e magnificência, o labreguismo arquitectónico em toda a sua máxima extensão. Sócrates é um homem com sorte. A ofensa estética não dá prisão nem, sequer, uma simples multa. Sorte a dele. Azar o nosso.
Como nem tudo em mau na Guarda aqui fica um poema que a professora de literatura do 10º ano nos lia, com uma voz doce e pausada, e que fez mais pelo gosto de todos nós pelos textos que todos os conteúdos concebidos pelos nossos educocratas.
Ai eu coitada! Como vivo
en gran cuidado por meu amigo
que ei alongado! Muito me tarda
o meu amigo na Guarda!
e
Ai eu coitada! Como vivo
en gran desejo por meu amigo
que tarda e non vejo! Muito me tarda
o meu amigo na Guarda!

Cantiga de amigo atribuída a D. Sancho I

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

ESTÁ BEM... FAÇAMOS DE CONTA

"Façamos de conta que nada aconteceu no Freeport. Que não houve invulgaridades no processo de licenciamento e que despachos ministeriais a três dias do fim de um governo são coisa normal. Que não houve tios e primos a falar para sobrinhas e sobrinhos e a referir montantes de milhões (contos, libras, euros?). Façamos de conta que a Universidade que licenciou José Sócrates não está fechada no meio de um caso de polícia com arguidos e tudo. Façamos de conta que José Sócrates sabe mesmo falar Inglês. Façamos de conta que é de aceitar a tese do professor Freitas do Amaral de que, pelo que sabe, no Freeport está tudo bem e é em termos quid juris irrepreensível. Façamos de conta que aceitamos o mestrado em Gestão com que na mesma entrevista Freitas do Amaral distinguiu o primeiro-ministro e façamos de conta que não é absurdo colocá-lo numa das "melhores posições no Mundo" para enfrentar a crise devido aos prodígios académicos que Freitas do Amaral lhe reconheceu. Façamos de conta que, como o afirma o professor Correia de Campos, tudo isto não passa de uma invenção dos média. Façamos de conta que o "Magalhães" é a sério e que nunca houve alunos/figurantes contratados para encenar acções de propaganda do Governo sobre a educação. Façamos de conta que a OCDE se pronunciou sobre a educação em Portugal considerando-a do melhor que há no Mundo. Façamos de conta que Jorge Coelho nunca disse que "quem se mete com o PS leva". Façamos de conta que Augusto Santos Silva nunca disse que do que gostava mesmo era de "malhar na Direita" (acho que Klaus Barbie disse o mesmo da Esquerda). Façamos de conta que o director do Sol não declarou que teve pressões e ameaças de represálias económicas se publicasse reportagens sobre o Freeport. Façamos de conta que o ministro da Presidência Pedro Silva Pereira não me telefonou a tentar saber por "onde é que eu ia começar" a entrevista que lhe fiz sobre o Freeport e não me voltou a telefonar pouco antes da entrevista a dizer que queria ser tratado por ministro e sem confianças de natureza pessoal. Façamos de conta que Edmundo Pedro não está preocupado com a "falta de liberdade". E Manuel Alegre também. Façamos de conta que não é infinitamente ridículo e perverso comparar o Caso Freeport ao Caso Dreyfus. Façamos de conta que não aconteceu nada com o professor Charrua e que não houve indagações da Polícia antes de manifestações legais de professores. Façamos de conta que é normal a sequência de entrevistas do Ministério Público e são normais e de boa prática democrática as declarações do procurador-geral da República. Façamos de conta que não há SIS. Façamos de conta que o presidente da República não chamou o PGR sobre o Freeport e quando disse que isto era assunto de Estado não queria dizer nada disso. Façamos de conta que esta democracia está a funcionar e votemos. Votemos, já que temos a valsa começada, e o nada há-de acabar-se como todas as coisas. Votemos Chaves, Mugabe, Castro, Eduardo dos Santos, Kabila ou o que quer que seja. Votemos por unanimidade porque de facto não interessa. A continuar assim, é só a fazer de conta que votamos."
Texto do jornalista Mário Crespo, publicado no Jornal de Notícias de hoje.
Conclusão demasiado fácil: "eles" perderam a vergonha, a compostura, a noção da decência e todos, mas todos os valores a que a mais elementar ética política obriga. Pior ainda, são "eles" quem governa este jardim à beira-mar plantado...

LE SEIZIÈME
















A Fátima, que não é marroquina mas tem temperamento de berbere, foi viver para Paris há uns anos. A princípio num subúrbio classe média, depois num apartamento dentro da cidade, depois num bonito andar do 16ème, o bairro chique de Paris. Que o é não tenho dúvidas. Quando a fui visitar, tive um momento de hesitação. Olhei em volta: do lado esquerdo estava um stand da Ferrari, do lado direito o da Bentley. Aí, não tive dúvidas: "é aqui". De resto, as votações em Sarkozy (cerca de 90 %) não permitem grandes dúvidas sobre a ausência do proletariado no 16ème.
Lembrei-me disto ao ver ontem Mickey Rourke a festejar o seu prémio com champanhe Taittinger. É que, ao chegar a casa da Fátima, me pus a folhear o boletim muncipal, tendo comentado: "olha que giro; o presidente da câmara do teu bairro chama-se Taittinger, isto aqui é tão fino que até adoptam os nomes do champanhe". Aí, a Fátima riu-se e disparou: "não, parvo, é ao contrário; ele é o dono e foi a família quem deu o nome à marca". Pois...

Enfim, vivam o Mickey Rourke mais o seu prémio, vivam Monsieur Taittinger mais o seu néctar.

domingo, 8 de fevereiro de 2009

FRANCISCO PINTO MOREIRA - fotógrafo

Grifo (Gyps fulvus)

Abelharuco (Merops apiaster)

Papa-figos (Oriolus oriolus)

Guarda Rios (Alcedo atthis)

Coruja das torres (Tyto alba)
Francisco Pinto Moreira reside em Moura e é fotógrafo. Quando há uns anos se iniciou neste métier pensei, de início, que seria um hobby mais ou menos passageiro. Rapidamente mudei de ideias quando vi o Pinto Moreira à procura de equipamento, comentando vantagens e pontos menos fortes desta e daquela lente. Mais a sério o levei quando percebi que muitas das fotografias eram resultado de longas esperas, por vezes em frias madrugadas de Inverno. Mais surpreendido fiquei quando pude verificar, com aquele prazer que sentimos quando um amigo nosso se sai bem em qualquer coisa, que as fotografias são mesmo muito boas. A cor e a luminosidade que delas se desprende só podia ter lugar no sul. E estas aves são bem do sul. E a paixão do Pinto Moreira pela natureza vai merecer, um destes dias, mais que uma simples referência num blogue.
Uma visão um pouco mais abrangente do seu trabalho está disponível em:

sábado, 7 de fevereiro de 2009

UM MAPA BORGESIANO

Todos os anos, por esta altura, o semanário Expresso oferece aos leitores um mapa de Portugal patrocinado pela OPTIMUS. Más-línguas dizem que o mapa é pessimus, um trocadilho fácil e de gosto duvidoso. A oferta é profundamente borgesiana, e que ninguém tente convencer-me do contrário. Duvido que Jorge Luís Borges usasse mapas de estradas ou tivesse sequer, por razões evidentes, tirado uma carta de condução. Mas teria gostado de saber da existência deste mapa. Nele abundam povoações que não existem ou simples montes alentejanos que foram promovidos à categoria de vilas. Perdemo-nos num labirinto de incertezas, viajamos por entre sítios que nunca nasceram. Um breve exemplo: caminho entre Vales Mortos e Aldeia Nova de S. Bento tem duas grandes povoações pelo meio - Venda Cruz da Cigana e Cruzeuiro -, pelas quais passo todas as semanas sem as ver. O conto Tlon, Uqbar e Orbis Tertius, escrito por Borges há muitos anos tem agora neste mapa um digno sucessor. E ganhamos uma certeza: há mundos que existem e não vemos, há realidades fantásticas que estão para lá do nosso conhecimento.
Obrigado Expresso! Obrigado Optimus!

SOBRE CADEIRAS













Quando, em Setembro de 1986, iniciei funções na Câmara de Moura foi-me dada a possibilidade de escolher uma cadeira no mercado local. Em vez disso, rumei a um daqueles misteriosos depósitos camarários onde há de tudo um pouco. Encontrei um cadeira igualzinha à que está em cima, à esquerda. Tinha pertencido a um presidente de câmara dos anos 40 do século XX. A peça era, nem mais nem menos, o modelo LC07 concebido por Le Corbusier (1887-1965). Cromados e cabedal, conforto, estética despojada e simplicidade. A perfeição numa máquina de sentar. Adoptei a cadeira e não mais a deixei até sair de Moura.
A cadeira do lado direito é o modelo LC02. São ambos da segunda metade da década de 20 do século passado. Como tudo o que tem indiscutível qualidade, a idade não é com elas. Quem não souber destes detalhes achará apenas que são "cadeiras modernas". O que não deixa de ser verdade.

BRITISH AIRWAYS - 1989


O anúncio da British Airways não é o mais belo da História da Publicidade. Esse lugar do pódio está reservado a um simples exercício de animação de palavras que a Royal Mail encomendou a Oliver Harrison. A partir da canção Amore baciami, na voz de Nuccia Bongiovanni, as palavras vão surgindo e dá vontade de escrever longas cartas de amor. A ideia era, afinal, a de promover o Dia de S. Valentim. Excertos desse anúncio estão disponíveis no youtube (não consegui o original, por mais voltas que desse) em http://www.youtube.com/watch?v=Plx3-HGuKY4. Sempre é melhor que nada.
Em relação ao anúncio da companhia de aviação, e para além dos espalhafatosos meios de produção, note-se a participação de Malcom McLaren (antigo manager dos Sex Pistols) e do grego Yanni, que adaptaram o conhecido Dueto da Flor da ópera Lakme de Léo Délibes. O qual terá, imagino, dado várias voltas no túmulo...
Pormenor final: os dois anúncios datam de finais dos anos 80.

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

UMA GAFFE E UMA PRENDA

O texto de ontem sobre o poço da morte tinha uma gaffe notável, que preferi manter. Ao referir-me à lei de Newton mencionei-a como sendo de Nelson...
Veio-me à memória o que contava o diplomata e toureiro norte-americano Barnaby Conrad (sim, leram bem, diplomata e toureiro!) a propósito de um episódio ocorrido durante a rodagem de um filme do grande Billy Wilder (1906-2002) e quando alguém confundiu este com William Wyler: "Somebody went up to Billy Wilder and said, “Oh, Mr. Wyler.”And he says, “Wilder.” But he said, “What’s the difference? Manet. Monet.”
Mais, o meu amigo Pinto Moreira descobriu esta preciosidade e enviou-ma:

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

O GRANDE NELSON

“Há belhetes na belheteira” anunciava a lata pintada em frente ao poço da morte. O poço da morte foi a minha ruína e quando chegou o último dia de feira não sobrou um tostão dentro da carteira de plástico preto com o emblema do Benfica. Era linda a minha carteira de plástico preto com o emblema do Benfica e nunca percebi porque é que lá em casa só eu gostei dela. 12$50 (uns seis cêntimos) foi o investimento, logo no primeiro dia, embora me tivessem dito para não comprar nada no primeiro dia de feira, porque era o dia dos aldeanos.

Com o que sobrou comprei o primeiro de vários belhetes. Subia-se por uma escada exterior, do lado direito do poço da morte. Cada degrau era um passo mais no caminho da angústia. Mais um passo, mais ansiedade, e a expectativa de esperar que não fosse naquele dia o fim do Grande Nelson. Ingmar Bergman gostaria de conhecer o poço da morte e a angústia de Nelson, mas na Suécia de certeza que não há poço da morte.

O poço era uma parede vertical em madeira, com uma pequena inclinação junto à base. Do varandim, nós, os outros, podíamos ver o Grande Nelson desafiar a morte. Primeiro entravam os filhos de Nelson em bicicletas a pedais, pedalando furiosamente, primeiro inclinados, depois completamente na horizontal, desafiando a lei do outro nelson. À distância de 30 anos impressiona a temeridade dos rapazes, que a certa altura se cruzavam num bailado arriscado. Talvez fossem temerários, mas nada superava o Grande Nelson. A moto fazia um barulho terrível, como se fosse explodir a cada aceleração. Era um bocadinho de espectáculo para dar mais uma justificação ao belhete, mas nós ficávamos ainda com mais respeito. Depois sim. O Grande Nelson arrancou. Parede acima, parede abaixo. Uma pirueta, depois outra. Nós angustiados, no varandim em volta do poço, o Grande Nelson de sorriso rasgado, a morte derrotada com tanta audácia, as leis da física esmagadas com tanta coragem. Mas o grande momento estava para vir. Quase no final da actuação o Grande Nelson puxou de uma bandeira nacional, tapou a face e abriu os braços. Ele e a moto continuaram, poço acima, poço abaixo. Depois parou a moto, tirou o capacete e os óculos à major Alvega. Olhou para nós, à matador. Aí o poço quase veio abaixo. A malta deu-lhe a ovação que ele, nesse altura já quase imortal, queria e merecia. Eu fiquei à beira das lágrimas, com tanta angústia, tanta emoção e tanto patriotismo. Desci as escadas do lado esquerdo do poço da morte jurando que todos os dias da feira iria prestar homenagem ao Grande Nelson. E fui.

No dia 10 a feira acabou. Nunca mais vi o Grande Nelson. Nem o poço da morte, nem a inesquecível lata que anunciava os belhetes e a belheteira.

Não consegui qualquer referência sobre o grande Nelson. A fotografia foi arranjada na net e reporta-se a um poço da morte algures no Brasil. A crónica foi publicada no jornal A Planície de 1 de Junho de 2006.

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

BUSQUE AMOR NOVAS ARTES

Busque Amor novas artes, novo engenho
Pera matar-me, e novas esquivanças,
Que não pode tirar-me as esperanças,
Que mal me tirará o que eu não tenho.

Olhai de que esperanças me mantenho!
Vede que perigosas seguranças!
Que não temo contrastes nem mudanças,
Andando em bravo mar, perdido o lenho.

Mas, enquanto não pode haver desgosto
Onde esperança falta, lá me esconde
Amor um mal, que mata e não se vê,

Que dias há que na alma me tem posto
Um não sei quê, que nasce não sei onde,
Vem não sei como e dói não sei porquê.


É possivel "ilustrar" um soneto com imagens? Para mais, quando estamos perante um dos mais belos que Luís de Camões produziu? Provavelmente não.

A imagem destas tulipas, do fotógrafo Robert Mapplethorpe (1946-1989), apenas faz companhia ao soneto de Camões porque também ela transborda de lirismo e sensualidade.

EXPLICANDO A FOTOGRAFIA...

O meu amigo MPP enviou-me esta mensagem "Atão e... mudásti!? O fundo azul com riscado branco é que tá mal."
Ora bem, o fundo azul e branco tem uma explicação. É que a fotografia foi "picada" de outra, muito maior e que aqui mostro.
Dois factos curiosos: o autor da imagem é um conhecido fotógrafo (de centro-direita, digamos, para ele não se zangar comigo) de um conhecido jornal de Lisboa. A fotografia foi uma demonstração da mais pura amizade.
Ao mostrar as primeiras provas a uma querida amiga, também do centro-direita (digamos..) comentou: "vocês têm muito bom aspecto, nem parecem comunas". Há preconceitos e ideias feitas que o tempo não vence.
Apesar da minha camisa de músico porto-riquenho ganhámos as eleições.