Foi esse comentário de um mourense nas redes sociais que me chamou a atenção. Viva Salazar!, alguém escreveu. Viva Salazar! Claro que viva. Viva Salazar, o que lançou toda uma juventude para o braseiro das guerras em África. Viva Salazar!, sobre quem pesa a morte de 10 mil militares portugueses, que pereceram nessas guerras, “mortos ao serviço da Pátria”. Viva Salazar!, o da PIDE, o dos campos de concentração do Tarrafal e de S. Nicolau. Viva Salazar!, o que prendeu dezenas de milhares de pessoas por razões políticas. O que cortou vidas, que expulsou do Ensino Superior gente distinta, que mandou matar pessoas às mãos cheias (os entusiastas de Salazar saberão quem foram Catarina Eufémia, Bento Gonçalves, Humberto Delgado, José Dias Coelho?). Viva Salazar!, o melífluo que chegou a catedrático sem ter defendido uma tese de doutoramento. Viva Salazar!, o que empurrou para a emigração em França cerca de um milhão de portugueses. Viva Salazar!, o que empurrou os nossos compatriotas para os “bidonvilles”. Viva Salazar!, o tacanho, que promoveu e manteve a Censura, a tal que proibia jornais, livros, filmes e peças de teatro. Viva Salazar!, pois claro. Viva a taxa de analfabetismo de 26% em 1971 (3% em 2021). Viva a Educação do fascismo, em que o Ensino Superior era só para alguns: 49.500 estudantes no Ensino Superior em 1971 (433.000 em 2021). Viva a taxa de mortalidade infantil de 52 por mil em 1971 (4 por mil em 2021). Viva Salazar!, o que deixou um país atrasado e sem infraestruturas. Viva Salazar, mais a taxa de cobertura de esgotos de 17% em 1971 (86 % em 2021). E mais a taxa de cobertura de rede de águas ao domicílio, que era de 40% em 1971 (96% em 2021). Viva Salazar!, e todos estes exemplos do país atrasado e sem condições que nos deixou. Viva Salazar!, mais uma Saúde que era pior, mas muito pior!, do que é hoje. Viva Salazar!, mais um Portugal em que havia 94 médicos por 100.000 habitantes (564 por 100.000 habitantes em 2021). Viva Salazar!, cujo regime garantia, em 1971, 66 anos de esperança de vida (82 anos em 2021). Viva Salazar!, pois claro! Tantas razões que há para celebrar o regime fascista, não é verdade? Ah, mas havia respeito e era tudo gente séria! Então não era... Podemos começar pelo escândalos de pedofilia nos anos 60. E podemos continuar com a promiscuidade entre empresas e Estado. Com a “pequena” diferença que era tudo abafado e trabalhado às escondidas. Viva Salazar? Repito o que já aqui escrevi: poderia falar no número de gimnodesportivos, na prática desportiva, nos equipamentos culturais, no ensino da música, na investigação científica, na qualidade das publicações universitárias, no papel do poder autárquico desde 1974. Poderia falar, e detalhar, a melhoria das condições de vida das pessoas.
A Democracia é isto: as pessoas poderem dize disparates sem sentido como “Viva Salazar”. E uma pessoa poder escrever o que entende sem ir parar a Caxias, ao Aljube, a Peniche ou ao Tarrafal. Perceberam, caros saudosistas?
Fotografia (Alfredo Cunha): Amadora, antes do 25 de abril
Crónica em "A Planície"