quinta-feira, 20 de agosto de 2020

A CRUZ E O MARTÍRIO

Um grupo de franciscanos foi martirizado em Marrocos, no início de 1220. Esse foi o ponto de partida para um projeto que devia ter sido de uma forma e depois foi de outra. Que foi, afortunadamente, acolhido no Museu Nacional de Arte Antiga, onde da ideia inicial se passou a outra, bem mais abrangente e interessante.

Por entre as oscilações que estes processos sempre conhecem, há uma peça firme. A cruz do próprio MNAA, assim descrita por Joaquim Caetano no site Discover Islamic Art

Cruz flordelisada, com intersecção da haste e dos braços em quadrado, nó esférico achatado e haste tubular de encaixe. A decoração do campo da cruz é formada por uma fita contínua que contorna o perímetro de toda a peça e forma no seu interior losangos e triângulos preenchidos por motivos geométricos e florais. Nos cantos do quadrado onde se inscreve o centro da cruz desenham-se quatro octifóleos. O reverso é igualmente delimitado por uma fita, sendo os braços e a haste, preenchidos por entrelaçados geométricos de inspiração vegetalista. No centro forma-se uma grande circunferência decorada com entrelaçados geométricos, bastante complexos, formando múltiplos centros, que constituem o mais típico elemento islâmico da decoração da cruz. Não só a decoração, como a forte probabilidade de o metal ter sido extraído de uma mina norte-africana, parecem documentar nesta peça um trabalho de artista das comunidades islâmicas peninsulares, cristianizado ou não, mas trabalhando obviamente para os reinos cristãos ibéricos.

Este tipo de cruzes tinha uma dupla função, servindo como cruz de alçar, utilizada em procissões e funerais, mas podia igualmente ser assente em bases e funcionar como elemento do aparelho litúrgico do altar.

Uma peça de primeira linha para um projeto bem assente no martírio.

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