domingo, 18 de dezembro de 2011

OBITUÁRIO A SUL


Talvez seja um pouco desproporcionado juntar num só texto a referência ao desaparecimento destas duas figuras da cultura. É que se Cesária Évora (1941-2011) ganhou o estatuto de estrela mundial, muito por força da promoção que os franceses lhe deram, já Joãosinho Trinta (1933-2011) era, sobretudo, conhecido no Brasil.

Cesária Évora popularizou, urbi et orbi, as mornas. Em Portugal, e até ela aparecer, a música cabo-verdiana era coisa de emigrantes e de militantes musicais e políticos encostados à esquerda. Cesária teve o reconhecimento que nunca tiveram o precocemente desaparecido Frank Mimita, ou Bana, ou Ildo Lobo com os seus Tubarões. Menos ainda os Bulimindo, que se dedicavam ao funaná. As mornas, pé na tchom, têm a alma de Cabo Verde. Mas a sua sonoridade é bem a da mestiçagem. Viva Cesária!

No mesmo dia desapareceu também o célebre carnavalesco Joãosinho Trinta. Foi um dos que mais contribuiu para dar ao Carnaval do Rio o seu formato atual. Esteve longos anos à frente da Beija-Flor, de Nilopolis, com grande sucesso. Confesso que só me recordo com clareza de um dos seus desfiles. Refiro-me à bronca ocorrida em 1990, quando a escola, que acabou por ficar em 2º lugar, se apresentou com o tema Todo o mundo nasceu nu. Uma provocação aos critérios que interditavam a genitália desnuda (adoro esta expressão, dá sempre a ideia que anda ali mão, honni soit qui mal y pense, de jurista). Mas a frase que mais gosto de Joãosinho Trinta tem a ver com a justificação dada para o luxo dos seus desfiles: "O povo gosta de luxo; quem gosta de miséria é o intelectual". Impreciso, mas divertido.


1 comentário:

Lucrecia disse...

Joãozinho Trinta era de fato muito conhecido e querido no Brasil. Quanto a frase.O povo gosta de luxo; quem gosta de miséria é intelectual. se refere aos intelectuais que costumam descrever a vida das pessoas que vivem nas periferias sempre os colocando em situação de inferioridade e incapacidade totais. O luxo se refere aos dias de carnaval, quando esta mesma periferia se une e produz, ela mesma, o carnaval que é visto pelo mundo. E tudo é feito com esmero e perfeição para que os desfiles sejam sempre grandiosos.Cesária Évora eu conheci a pouco tempo por causa de uns amigos de Cabo Verde. A música é muito agradável e em alguns aspectos assemelha-se a música brasileira.Vão fazer falta, os dois.