Crónica de hoje, em "A Planície", com uma obra de Álvaro Fialho, no Ateneu Mourense, em pano de fundo.
Terminava
o verão de 2010 quando me pus a caminho de Nice. Ia participar num encontro
sobre História e Arqueologia da Idade Média, patrocinado por uma fundação. Que
tinha sido fundada por Anne Gruner Schlumberger, senhora de uma fortuna
inimaginável (Schlumberger é sinónimo de plataformas petrolíferas, ok?).
O
encontro não teria público, para minha enorme surpresa. Seriamos nós a falar
uns com os outros. Quando agora revejo o programa, não me recordo que estivesse
assim tanta gente, mas aparentemente esteve. Éramos uns 20 e estivemos
enclausurados na luxuosa herdade durante quase uma semana. Os pormenores do que
por lá se passou são desnecessários. O facto para mim mais relevante foi uma
simples frase, que me foi disparada num desses dias por Antonio Malpica Cuello,
o frenético professor e arqueólogo de Granada. Textualmente, “a lo largo del
tiempo, y cuando empezamos a envejecer, pensamos en volver a los sítios de
donde hemos salido”. A frase pareceu-me meio estranha, na altura. O António
tinha então 60 anos, eu ainda não tinha chegado aos 50. Vivia por esses tempos
entre Moura e Mértola, e sentia as duas terras como os meus sítios de origem.
Uma
década passou e o António está à beira da jubilação. O meu próprio futuro, que
me parecia tão distante, está agora à distância de um braço. Opções
profissionais levaram-me, em 2018, a uma curva em 180º. Para trás ficavam quase
três décadas entre Moura e Mértola. O distanciamento lisboeta trouxe desafios novos
(aos 55 ainda não era tempo de parar, muito longe disso) e trouxe uma certeza.
Longínqua e decisiva. Não é tanto a ideia que um dia, assim a saúde o permita,
regressarei, regressaremos ao eixo Moura-Mértola (com Trás os Montes pelo
meio). É a convicção funda que Moura me continua, nos continua, presente. Com
regularidade certa, os trabalhos de investigação histórica e arqueológica se
atravessam no caminho. Um livro sobre a Mouraria, outro sobre ossos islâmicos
que virá, os estudos sobre toponímia, ainda e sempre a arqueologia no Castelo
de Moura. Porquê assim, com tantos outros caminhos? Porque, “a lo largo del
tiempo, y cuando empezamos a envejecer, pensamos en volver a los sítios de
donde hemos salido”. A verdade é essa.
Neste
verão, começarei a regressar um pouco mais. Porque a vacina já está, porque não
há o confinamento duro de 2020, oxalá as coisas assim se mantenham, porque
tenho saudades da paisagem original. O compromisso político também me fará
estar ainda um pouco mais. Agora e sempre. Porque há coisas que não se negam, a
começar pela amizade a sério. O André merece esse empenhamento, a minha
paisagem original também.
Depois
assim continuaremos. Entre as nossas vidas profissionais, os amigos de Moura e
a casa de Mértola, os projetos de investigação que serão concretizados (o da
água é um, o do Carmo é outro, mais o castelo) e as paisagens originais que nos
fazem falta. E de onde, na verdade, nunca saímos. Com Trás os Montes lá ao
fundo.
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