sábado, 1 de julho de 2023

O QUE É SER DIRETOR DO PANTEÃO NACIONAL?








A pergunta é-me feita, sobretudo em Moura, de forma recorrente. Escrevi um pouco sobre as minhas funções à frente do monumento na crónica de 1 de janeiro de 2022. Ao fim de 27 meses à frente do Panteão, julgo poder avançar um pouco mais, em forma de decálogo e satisfazendo curiosidades:

 

1.     O cargo

A nomeação decorreu de um concurso internacional. Ganhei o concurso e comecei a trabalhar. Sem traçar profundos esquemas teóricos nem tentar “disrupções” (uma das grandes e disparatadas modas), nem roturas. Arma número um: o pragmatismo, a atenção à realidade e aos problemas do quotidiano.

2.     O edifício do Panteão Nacional

O edifício coloca problemas significativos: a) ao nível da conservação; b) ao nível da mobilidade; c) pela falta de adequação física a funções de programação cultural que são necessárias; d) pela imagem de “monumento para velhos”. Parte da renovação física passa pelas verbas do PRR. Dos outros desafios temos tentado tratar. Em breve, entrará Eça de Queiroz no Panteão Nacional. Um novo desafio.

3.     Exposições

As exposições são uma das pedras de toque do monumento. Desde abril de 2021 montámos, quase sem custos, seis exposições de maior dimensão. A que juntámos outras intervenções no âmbito de uma iniciativa intitulada “Modos de ver”, em que mostramos obras de arte relacionadas com o monumento. No próximo ano haverá Amália e Fausto Giaccone. E arte urbana.

4.     Programação musical

Lançou-se um ciclo intitulado “Música no Panteão”, que já vai na segunda edição, com assinalável sucesso de público. Estabeleceu-se uma parceria com a Antena 2, que garante a divulgação dos concertos. A esses ciclos juntam-se outras iniciativas, com destaque para os concertos do Coro Gulbenkian ou projetos como o de Pan Dai Jing ou de Eugenio Ampudia. A visibilidade do monumento cresceu, graças a isso, de forma significativa.

5.     Investigação científica

Um monumento tem de cumprir objetivos no domínio da investigação. Sempre recusei a ideia de se “festivalizar” o património, sem uma componente de estudo. Fui à procura de teses de mestrado existentes sobre o monumento. Selecionei seis, que serão editadas sob a forma de um cubo em material reciclado, com um código QR em cada face. Uma maneira inovadora de chegar a novos públicos.  Estamos a apoiar um doutoramento e esperamos fazer mais ainda neste domínio.

6.     Edições

Para além das teses, outras edições tomaram forma: o catálogo bilingue “Panteão & Pantheon”, o catálogo da exposição “Thalassa! Thalassa!”, o livro “Mulheres Mecenas” e o opúsculo “Gente da Batalha”, com fotografias de António Barreto. Preparam-se mais cinco livros (sobre Sidónio Pais, Guerra Junqueiro, Eusébio, etc.), para os próximos meses.

7.     Comunicação

Como chegar ao público e como alargar públicos? Com mailing lists, renovando as redes sociais (instagram e facebook) e criando novos canais (youtube e twitter). Houve resultados sensíveis nessa matéria, qua acabaram tendo um efeito de dominó. Mais informação gerou mais interesse que deu origem a uma procura mais intensa do monumento. Sucederam-se as entrevistas e as reportagens: da RTP, da TVI, da SIC, do “Público”, do “Rádio Observador”, do “Sapo 24” etc. “Estivémos” na Eurovisão e, no outono, estaremos no “Le Figaro”.

8.     Equipa

A equipa é curtíssima e empenhada: três técnicos superiores (eu incluído), dois administrativos e cinco funcionários de bilheteira e vigilância. Com uma esforçada dezena de pessoas se trabalha. Os resultados são visíveis, creio eu.

9.     Parcerias

Todas as possíveis. Embaixadas (Cabo Verde, França, Polónia, Itália, Grécia), empresas (Servilusa, El Corte Inglés, Urios, Banco Carregosa, Caixa Geral de Depósitos, Porto Editora, NOS etc.), Câmaras Municipais (Lisboa, Serpa, Silves, Freixo de Espada à Cinta) fundações (Gaudium Magnum, Gulbenkian), Imprensa Nacional, PSP, Exército Português, Antena 2 etc. Não vivemos isolados e recusamos um papel passivo.

10.  Público

Tudo isto resultou num significativo acréscimo de público. De 48.000 entradas em 2021, ano atípico em fase de recuperação da pandemia, para 150.000 em 2022 (o 3ª melhor ano de sempre). Os quase 90.000 visitantes no primeiro semestre deste ano apontam para o melhor ano de sempre, em 2023.

 

O que é ser diretor do Panteão Nacional, caros leitores e conterrâneos? Tudo isto. Sei o que ando a fazer? Sim. Faço as coisas com o mesmo empenho que tinha em Moura, quando era presidente da câmara. Preocupando-me com resultados e não com folclore, palcos e fogos de artifícios. Recusando facilitismos e sorrisos de crocodilo só para parecer fraterno. Trabalhando com preparação e, desculpem esta imodéstia, com conhecimento. O cargo é temporário e a vida é breve. Mas enquanto se está, é para ser a sério. Com as portas mesmo abertas e a alma ainda mais.


Crónica hoje, em "A Planície"


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