Tenho menos uns 7 ou 8 anos que este meu amigo. Agora não é assim tão significativo. Nos tempos de juventude, sim. Discordamos amigavelmente em quase tudo o que tenha a ver com política e com a visão da sociedade. Ele é liberal assumido, eu um comunista relapso. Cruzámo-nos num restaurante de Alvalade, há umas semanas. Às tantas, aproximou-se da mesa onde me encontrava e mostrou-me um fotografia do telemóvel. Era ele, em 1972 ou 1973, por aí. De frondosa e desordenada melena (ninguém diria, tendo em conta o aprumado executivo dos nossos dias), de boina à Che e óculos de massa. Só consegui balbuciar um "oh, pá...", antes de desatar a rir.
Ficámos de almoçar um dia destes. "Temo" uma daquelas refeições com prolongamento e desempate por "penalties" (salvo seja). Entretanto, e como sei que gosta de poesia e é poeta, aqui fica, da extraordinária Cecília Meireles, esta Canção. Que tem a ver com o sonho. E com a necessidade da utopia. Sempre.
Canção
e o navio em cima do mar;
— depois, abri o mar com as mãos,
para o meu sonho naufragar.
Minhas mãos ainda estão molhadas
do azul das ondas entreabertas,
e a cor que escorre dos meus dedos
colore as areias desertas.
O vento vem vindo de longe,
a noite se curva de frio;
debaixo da água vai morrendo
meu sonho, dentro de um navio...
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