Obra de José Canudo, deste ano de 2025.
Para ficar num lugar amado, e mais a sul.
Uma peça do Laos, do princípio do século XX. Está na Casa da Ásia - Coleeçao Francisco Capelo. O entramado geométrico faz lembrar o padrão das cerâmicas berberes e as mantas da região de Mértola. O meu amigo Cláudio Torres dava-nos, nas aulas (1983... 1984...) uma interessante perspetiva teórica sobre os modos de produção e o seu reflexo nas artes tradicionais. Infelizmente, nunca passou à escrita essas estimulantes ideias.
A pichagem da GREVE GERAL, fotografada às 18:01 de dia 4 de dezembro, remete para as letras do cartaz da primeira greve geral, a de 12.2.1982 (foi no meu primeiro ano de faculdade e lembro-me bem do impacto que teve...).
Vivam os direitos dos trabalhadores.
A iniciativa da Embaixada de Itália recupera a memória das sessões de outrora, realizadas naquele mesmo local (o fantástico Palácio dos Condes de Pombeiro) e dinamizadas por Domingos Caldas Barbosa (Lereno Selinuntino).
Ao longo de seis quartas-feiras assim foi. Os convidados são "desafiados" a participar ativamente. Ontem (a quarta foi à terça, excecionalmente) coube-me "atuar". Apresentei uma obra quase esquecida do escultor italiano Quirino Ruggeri, que se encontra numa ilha tropical e que deve ser uma das últimas obras mussolinianas ainda existentes.
Eram uma vez um francês, um italiano, um norte-americano e um iraniano. Parece o começo de uma daquelas anedotas, mas não é. Estes quatro senhores são os únicos que ganharam os mais prestigiados prémios do Cinema: Leão de Ouro (Veneza), Urso de Ouro (Berlim) e Palma de Ouro (Cannes). Quando e com que filmes?
Henri-Georges Clouzot (1907-1977):
Manon (1949) - Veneza
O salário do medo (1953) - Berlim e Cannes
Michelangelo Antonioni (1912-2007)
A noite (1961) - Berlim
Deserto vermelho (1964) - Veneza
História de um fotógrafo (1967) - Cannes
Robert Altman (1925-2006)
M.A.S.H. (1970) - Cannes
Bufallo Bill e os índios (1976) - Berlim
Short cuts (1983) - Veneza
Jafar Panahi (n. 1960)
O círculo (2000) - Veneza
Taxi (2015) - Berlim
Foi só um acidente (2025) - Cannes
Pela parte que me toca, sou um convicto altmaniano! Embora "Foi só um acidente", ontem visto, seja poderoso.
O blogue existe há 17 anos (!). A partir de janeiro mudarei o registo.
Hoje é dia de continuar e de preparar a semana.
Martin Parr faleceu ontem. Sem disso saber, escolhi uma das suas fotografias para ilustrar um texto meu.
Volto a Parr, ao seu maravilhoso sentido da cor e ao seu olhar sardónico sobre os britânicos.
Tem-se tornado quase fastidiosa a chuva de melhores disto e melhores daquilo: a melhor praia, a melhor bica, o melhor pastel de natal, a melhor marisqueira, o melhor por do sol, o melhor trail etc. Um pesadelo de coisas melhores.
Fui, há meses, a uma cidade muito conhecida, um pouco longe daqui. No regresso “foste ao sítio tal? E ao bar xis?” E eu não, nem a um nem a outro, sou pouco de andar em rebanho. E isto agrava-se com a idade.
Qual é o melhor vinho do mundo?, eis a questão. Há vinhos astronomicamente caros, isso sim. Uma garrafa de Romanée-Conti, de 1945, foi vendida por 480.000 euros; uma garrafa do norte-americano Screaming Eagle, de 1992, chegou aos 455.000 euros. Preços obscenos. Ao pé deles, o Barca Velha a 900 euros quase parece uma coisa de saldos.
Não sou grande bebedor – embora já tenha dado jeito a algumas pessoas dizer o contrário… - e também não sou um conhecedor. Gosto dos vinhos de Penedès, dos alentejanos, dos da Beira Interior, dos durienses, dos californianos, de alguns exotismos madeirenses e açorianos e por aí se fica a minha geografia…
Vem isto a propósito do mais extraordinário vinho que bebi até hoje. Fui há muitos anos, mais de 30, na Corte Azinha, uns cinco quilómetros a nordeste da Corte do Pinto, no concelho de Mértola. Várias vezes me tenho perguntado o que esperávamos encontrar, o Miguel Rego e eu, na Corte Azinha. Era inverno e o dia estava frio. A pessoa com quem fomos falar – porque teria informações sobre sítios arqueológicos, mas afinal não tinha nada por aí além... – recebeu-nos com calorosa cordialidade. Era um “homem do campo”. Parecia-me muito velho mas, provavelmente, seria mais novo do que eu sou hoje. Não me lembro da face, mas recordo-me que era magro, morenamente mediterrânico e, porque é que lembro disto?, usava chapéu. Convidou-nos a entrar e fez questão de nos oferecer um copo de vinho. Foi buscar um garrafão, sim!, à maneira antiga, e encheu-nos os copos com a delicadeza e a cerimónia de quem está a servir um Romanée-Conti. Do vinho recordo-me com nitidez, sim, lembro-me do tom carrascão, de marcada rudeza. Mas a simpatia e a boa vontade em nos ajudar fez com que aquele vinho simples se transformasse no melhor dos nectares. A conversa continuou, mansamente, às vezes com poucas palavras, com o gosto de falar de coisas da vida, com o vinho a temperar a manhã fria. Da arqueologia pouco se adiantou, mas o calor do vinho chegou-nos à alma. Tenho-me lembrado muitas vezes desses momentos.
Falei há dias com o
Miguel sobre esta nossa improvável expedição. Os anos vão passando e, com
firmeza, se me vai vincando a certeza de que aquele foi o melhor vinho que já
bebi. Não me falem em castas, nem em “frutados”, nem em “finais prolongados”. Sem
o calor humano não há vinhos que valham a pena. Aquele vinho, um pouco áspero,
foi o melhor vinho do mundo. Continua, pelo fator e pelo calor humanos, a sê-lo.
Até hoje.
A crónica saiu em "A Planície". A fotografia data de 1999 e é de Martin Parr. Intitula-se Reines de la Nuit (sipping wine). É a melhor fotografia de alguém a beber um copo de vinho.
Em Portugal, quase tudo tem um toque revisteiro ou de farsa.
Recordo um episódio do início dos anos 70. Houve um assalto a uma igreja em Lisboa (na Sé Catedral, se não me falha a memória). Roubaram a caixa das esmolas. À saída, lavaram as mãos na pia da água benta com sabonete Cadum. Nem numa comédia de Mario Monicelli se imagina algo assim.
Há seis meses (foi em 6 de junho) assaltaram uma ourivesaria e fugiram numa trotineta. Até hoje.
Faz hoje um século que nasceu um dos mais completos facínoras da América Central, Anastacio Somoza Debayle (1925-1980).
Somoza, que era presidente e filho e irmão de ex-presidentes, tinha o apoio dos norte-americanos. Até ao dia em um dos elementos da sua Guarda Nacional assassinou, a sangue frio, um jornalista da cadeia ABC. O acontecimento, ocorrido em 20.6.1979, foi filmado e difundido em todo o mundo. Anastacio Somoza durou menos de um mês no poder. Os sandinistas não lhe perdoaram e foram atrás dele. No dia 20 de setembro de 1980, em Asunción, no Paraguai, atacaram o carro com bazucas. O primeiro tiro falhou, o segundo acertou. Não sobrou grande coisa...
Aqui bem perto (270 metros, em linha reta, a partir do Panteão), na Rua Leite de Vasconcelos. Uma máscara algo sínica.
Uma amiga da Coimbra telefona-me "então és citado no livro sobre o partido dos fachos?". Pois não fazia a mínima ideia. Mandou-me um fotografia. O texto tem um par de incorreções (y como no?, diz-se em Espanha...), a começar pelo facto de a pessoa que migrou para o Chega ter sido "assessora dos vereadores". Nunca foi tal. Dava apoio administrativo a quem secretariava as reuniões de câmara. Algo de muito diferente.
"não gostou da gestão do sucessor, Santiago Macias", leio no livro. Fiquei feliz com o desgosto.
"Por dentro do Chega" é um livro de Miguel Carvalho. Para ser lido dentro de dias.
Há várias coisas que nunca percebi num célebre (e muito bom) filme de Alain Tanner. Uma delas é o título... A imagem mais forte que tenho de Lisboa é a cor dourada. Um amarelo ouro e palha que se vê ao final do dia. Uma amiga que hoje foi para norte mandou-me esta fotografia, dizendo ter sido a mais bela descolagem de sempre. Há momentos assim. E recordo este mesmo tom, num final de tarde da primavera de 1992, ao chegar de Roma. Que não é menos dourada, diga-se.