quinta-feira, 3 de setembro de 2015

ARQUITETURA NEOÁRABE EM BAFATÁ

Foi a surpresa maior de ontem. Depois de um dia onde as surpresas não faltaram (na reunião de câmara chegou-se ao ponto de me atribuir um texto que nunca escrevi, no que foi o momento borgesiano do meu mandato autárquico), a mais agradável de todas foi esta bela fotografia de Alfredo Cunha. Um edifício neoárabe na Guiné-Bissau? Sim, com merlões de inspiração omeia, com uma porta de arco em ferradura apontado, bordejado pelo desenho de arcos polilobulados. Um desenho culto e de ressonâncias académicas.

Onde raio fica isto? Bissau não é, Cacheu também não, Bolama também não. Nem Bula, nem Canchungo. Encontrei depois a resposta: é Bafatá. Azar meu, nunca fui para Leste. OK, num próximo roteiro ficam Mansoa, Bafatá e Gabu.

Quem será o autor de tão insólito e bonito edifício?


A Espantosa Realidade das Cousas


A espantosa realidade das cousas 

É a minha descoberta de todos os dias. 

Cada cousa é o que é, 
E é difícil explicar a alguém quanto isso me alegra, 
E quanto isso me basta. 

Basta existir para se ser completo. 

Tenho escrito bastantes poemas. 
Hei de escrever muitos mais. Naturalmente. 

Cada poema meu diz isto, 
E todos os meus poemas são diferentes, 
Porque cada cousa que há é uma maneira de dizer isto. 

Às vezes ponho-me a olhar para uma pedra. 
Não me ponho a pensar se ela sente. 
Não me perco a chamar-lhe minha irmã. 
Mas gosto dela por ela ser uma pedra, 
Gosto dela porque ela não sente nada. 
Gosto dela porque ela não tem parentesco nenhum comigo. 

Outras vezes oiço passar o vento, 
E acho que só para ouvir passar o vento vale a pena ter nascido. 

Eu não sei o que é que os outros pensarão lendo isto; 
Mas acho que isto deve estar bem porque o penso sem estorvo, 
Nem idéia de outras pessoas a ouvir-me pensar; 
Porque o penso sem pensamentos 
Porque o digo como as minhas palavras o dizem. 

Uma vez chamaram-me poeta materialista, 
E eu admirei-me, porque não julgava 
Que se me pudesse chamar qualquer cousa. 
Eu nem sequer sou poeta: vejo. 
Se o que escrevo tem valor, não sou eu que o tenho: 
O valor está ali, nos meus versos. 
Tudo isso é absolutamente independente da minha vontade. 

Alberto Caeiro, in Poemas Inconjuntos

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