São assim algumas tempestades. Surgem subitamente, ameaçando deixar um rasto de destruição à sua volta. Quando menos se esperava, eis que as escavações no claustro da Sé de Lisboa ganham um pouco desejável protagonismo. Porque são notícia por razões de que ninguém gosta.
Fui ontem interpelado, por ser "da área" (arqueologia) e "da época" (islâmica) a escrever umas linhas sobre o tema. Verdade se diga que me remeti, nos últimos dias, a um deliberado silêncio, mesmo entre colegas, enquanto procurava coligir informação.
Li, entretanto, um ponderado e útil texto de Luís Raposo, que subscrevo e do qual retiro estes excertos:
"Os vestígios da antiga mesquita, por baixo da Sé de Lisboa, devem ser preservados. Aliás, existe ali uma longa diacronia, que se inicia na Idade do Ferro e compreende por exemplo um troço magnificamente conservado da antiga via que conduzia ao teatro romano, que também mereceriam ser musealizados.
Desconheço as circunstâncias técnicas específicas que ali existam e permitam conservador visível isto e não aquilo. A não ser conservado visível, o melhor é voltar a aterrar, mas não destruir.
(...)
Esperemos que prevaleça o bom-senso."
O que penso de tudo isto, e tendo acompanhado o arranque deste processo, em 1990?
1. Que Luís Raposo tem razão ao dizer que, caso não seja possível conservar é melhor cobrir, mas não destruir;
2. Que esse princípio é válido tanto para as estruturas da mesquita, como para quaisquer outras;
3. Que deve ser explicado no local (aos colegas, aos políticos, ao arquiteto, ao proprietário do imóvel etc.) o que está em causa, o que deve ser preservado na íntegra e o que deve ser coberto, o que deve ser musealizado ou não;
4. Que devem ser criadas condições, e estabelecidos prazos, para uma divulgação do que foi trazido à luz do dia (seja uma publicação destinada ao grande público, seja outra de caráter mais técnico), ainda que de forma parcial;
5. Que deve ser evitada a "caça às bruxas". Independentemente das falhas que possam ter ocorrido, trazer à colação o histórico recente de pouco nos serve, se o que está em causa é preservar / proteger / valorizar aquilo que verdadeiramente importa;
6. Que o diálogo e o debate aberto e sereno irão, seguramente, contribuir para ultrapassar este momento menos bom.
Espero, naturalmente, que prevaleça o bom-senso desejado por Luís Raposo. E que este exemplo sirva para que, futuramente, se evitem tomadas de decisão precipitadas ou ditadas pela conveniência das circunstâncias.
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