quinta-feira, 14 de fevereiro de 2019

NOS SUBTERRÂNEOS DA NOTÁVEL VILA

Uma recente fotografia de Mário Romero Machado no facebook levantou uma série de questões. Todas interessantes, ainda que nem sempre com o devido enquadramento histórico. A fotografia, tirada a partir do Museu Gordillo, mostrava a Escola Conde Ferreira. Surgiram depois questões relacionadas com um subterrâneo existente no local. Entre outras hipóteses, falava-se em "termas romanas".

Vamos aos factos que conheço sobre o sítio. Outros haverá, seguramente.

Em 1970, obras realizadas nas oficinas da Auto Geral de Moura (entre as Ruas do Sequeiro e da Estalagem) puseram a descoberto um conjunto de sepulturas. Defendemos, o Artur Goulart de Melo Borges e eu, que se tratava de parte do cemitério islâmico de Moura. Os dados são topográficos, de orientação das inumações e de descrição do rito funerário.

Em 1987, obras de construção da garagem da APPACDM deixaram à vista uma entrada no subsolo que dava passagem para um túnel. Tornou-se depois claro que era uma estrutura perfeitamente definida, escavada no calcário da nossa terra. Tinha uma caleira perfeitamente definida e ia terminar na esquina da Rua da Estalagem com a Praça, tendo um monte de entulho, proveniente de uma habitação, no seu término. Participaram nessa breve sondagem, e peço desculpa por qualquer lapso, Isabel Martins, António Cunha, José Estevas, Carlos Rico, Susana Correia e Cláudio Torres.

Olhando um pouco de volta, e tendo em conta a cota dos terrenos e a localização da muralha seiscentista (meio torta e sem cumprir os cânones...), e tendo também em conta o aparelho da própria caleira, não foi difícil concluir:

1. Que a canalização é posterior à muralha, tendo sido feita já depois do abandono da fortaleza, ocorrido inícios do século XIX;
2. De facto, não seria possível a abertura de minas numa zona como aquela, que corresponde ao fosso da fortificação. Uma canalização inviabilizaria a presença da chamada "estrada coberta", que se sabe ali ter existido;
3. Provavelmente, a canalização foi construída para algum lagar que existiu nas imediações. Em que época? Arriscaria dizer que em meados do século XIX. O uso deve ter sido curto.

Nunca ali houve quaisquer termas, romanas, ou de qualquer outra época. O sítio ficou esquecido, até 1987.

O arranque das obras da APPACDM e a falta de meios técnicos, à altura, para se registar, levou a que se optasse pelo encerramento do túnel. Que não foi destruído e continua a ter acesso.

Do ponto de vista histórico, é um pequeno apontamento, que não adianta nada de substancial à história local.
Do ponto de vista turístico, o potencial parece-me ainda menor.


Verde - localização aproximada dos vestígios do cemitério islâmico
Vermelho - traçado aproximado da canalização
Azul - traçado aproximado da muralha do séc. XVII

1 comentário:

Hugo Fialho disse...

Muito interessantes, estes apontamentos da história.
Eu presenciei em 1987 alguns momentos das escavações na escola, tendo sido encontrados também nesse ano, algumas sepulturas onde é presentemente a garagem e a entrada do túnel. Recordo-me igualmente de ter entrado no túnel(sem autorização) e ter percorrido o mesmo até onde era possível. Talvez a associação a termas se deva a uma pequena abobada redonda que ali existia, alinhada verticalmente com um recipiente redondo, embutido no chão do túnel que parecia um "lava pés".