terça-feira, 20 de março de 2018

ENTRE ARTEMONAS E ALJEZUR

A fotografia de Artur Pastor é anterior à de Cartier-Bresson. Não se trata, portanto, de uma emulação. Uma senhora idosa que desce, aparentemente com cuidado. Uma rapariguinha que voa, rua acima. Um Mediterrâneo íngreme e "contido". As fotografias são de uma ilha grega e de uma vila algarvia. O poema é sobre a nossa região. Porque terras nossas são todas elas.

Alentejo

Folheia-se o caderno e eis o sul
E o sul é a palavra. E a palavra
Desdobra-se
No espaço com suas letras de
Solstício e de solfejo
Além de ti 
Além do Tejo.

Verás o rio e talvez o azul
Não o de Mallarmé : soma de branco e de vazio
Mas aquela grande linha onde o abstracto
Começa lentamente a ser o
Sul.

Outro é o tempo
Outra a medida.

Tão grande a página
Tão curta a escrita

Entre o achigã e a perdiz
Entre o chaparro e o choupo

Tanto país 
E tão pouco

Solidão é companheira
E de senhor são seus modos
Rei do céu de todos
E de chão nenhum

À sombra de uma azinheira
Há sempre sombra para mais um

Na brancura da cal o traço azul
Alentejo é a última utopia

Todas as aves partem para o sul
Todas as aves : como a poesia.

Manuel Alegre



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