sexta-feira, 17 de julho de 2020

MANTOS DE LUZ

A fotografia de cima é de ontem à noite, em Moura. Houve celebração, nas Festas em Honra de Nossa Senhora do Carmo, em tempos de pandemia. A ideia foi muito feliz e resulta lindamente. Cobrir o chão com luz dá aquele tapete e ilumina o tempo que há-de vir.

A de baixo pertence ao projeto Caligrama, que a artista plástica Eva Lootz montou no Khan Assad Pasha, na cidade velha de Damasco, no Outono de 2003.

E, de Fernando Pessoa,

NÃO QUERO IR ONDE NÃO HÁ A LUZ,


Não quero ir onde não há a luz,
Do outro lado abóbada do solo,
Ínfera imensa cripta, não mais ver
As flores, nem o curso ao sol de rios,
Nem onde as estações que se sucedem
Mudam no campo o campo. Ali, no escuro,
Só sombras múrmuras, êxuis de tudo,
Salvo da saudade, eternas moram;
Região aos mesmos íncolas incógnita,
Dos naturais, se os tem, desconhecida.
Ali talvez só lírios cor de cinza
Surgirão pálidos da noite imota.
Ali talvez só gelo com as águas,
Como a cegos, serão, e o surdo curso,
No côncavo sossego lamentoso,
Se acaso à vista habituada aclare,
Será como um cinzento tédio externo.

Não quero o pátrio sol de toda a terra
Deixar atrás, descendo, passo a passo,
A escadaria cujos degraus são
Sucessivos aumentos de negrume,
Até ao extremo solo e noite inteira.

Para que vim a esta clara vida?
Para que vim, se um dia hei-de cair
Da haste dela? Para que no solo
Se abre o poço da ida? Porque não
Será sem fim (...)

Sem comentários: