sexta-feira, 7 de novembro de 2014

D'AQUÉM E D'ALÉM

Durante muitos anos, olhei para o escudo, lá no alto da muralha, e pensei "deve ser coisa do tempo de D. Manuel". Inferia que o monarca quisera deixar a sua marca nas obras efetuadas no castelo, em inícios do século XVI. Pensva eu que aquela arreata que D. Manuel carregava junto ao nome - pela Graça de Deus, Rei de Portugal e dos Algarves, d'Aquém e d'Além-Mar em África, Senhor da Guiné e da Conquista, Navegação e Comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia - tinha também, remotamente, tocado a minha terra.

Inferia erradamente.

Um belo dia, resolvi usar uma teleobjetiva, a partir do Convento do Carmo. Pensamento imediato: "ora bolas! aquilo não é nada D. Manuel! é mais antigo". Consegui entretanto uma fotografia decente desta peça, absolutamente extraordinária, e que vem lançar mais dados para o debate que o enigma da datação da torre de menagem e muros adjacentes constitui.

Ora bem:

1) O início das obras ("refazimento do alcácer") é decidido por volta de 1320;
2) Quando Duarte Darmas passa por Moura, em 1510, a torre está terminada.

Dois séculos é um lapso enorme, em arqueologia medieval. Pedi ajudas várias. Segundo um especialista, o brasão poderá ser um pouco posterior a meados do século XIV. Há aspetos  de organização planimétrica que aproximam a torre de Moura da de Beja, de finais do mesmo século. Portanto...

Parece plausível que as obras tenham sido iniciadas antes de meados do século XIV e se tenham prolongado por algumas décadas. Admitir uma cronologia fernandina para o seu término não me parece disparatado. Tal como também não se pode excluir a possibilidade de uma obra concretizada em várias fases. Mas sempre segundo um mesmo plano, conforme o prova a coerência de talhe dos silhares.

4 comentários:

Maria Ramalho disse...

Oi Santiago,
tenta mostrar um pouco mais à volta para se ver o aparelho e possíveis roturas.

beijo

Unknown disse...

Caríssimo:
eu percebo pouco do tema, mas diria que o simples facto de os escudos laterais se encontrarem deitados e não na vertical aponta claramente uma cronologia pré-manuelina para a peça.
Ao que julgo saber, a partir do rei Manuel a iconografia das armas de Portugal passa a ter os cinco escudos na vertical, ao contrário da anterior disposição cruciforme. Assim o encontramos em todos os "forais novos", no portal dos Jerónimos e mais num longo etc que me dispenso de enumerar. Abraço
Carlos Fabião

José Faria disse...

Estou em crer que seja obra dionisina, mais consistente com a obra de Beja, até porque julgo ter sido Dom Dinis e não Dom Manuel quem endireitou os escudos. Mas não me deixa de ser estranha a aparente ausência integral de erosão, a juntar ao não menos estranho desenho dos castelos.

José Francisco disse...

Os cinco escudos na vertical passaram a ser utilizados na iconografia das armas de Portugal a partir do reinado de D. João II, quando este decidiu organizar de uma forma mais metódica as Armas do Reino.Virou os escudetes laterais pondo-os de pé e limitando também o numero máximo de castelos abertos para sete.