Do lado do mar, sobre a estrada escarpada, as fachadas mantêm ainda muito da sua glória passada. Neoclássico, neogótico, neoveneziano, ruínas neo-qualquer coisa como o crânio de Voltaire em criança. Essa mania da citação arquitectónica, da imitação, das cidades cosmopolitas. Grandes ritmos verticais de pedra dourada ou rosa. Dejectos, chuvas de água de lavar roupa caem das janelas. Cariátides cariadas, Atlantes, pilastras e frontões partidos. Na ponta das cordas sobem cestos que um hortelão, na rua, encheu de legumes. Loggias com guilhochês, cúpulas fendidas. Baixos-relevos onde já não galopam mais do que uma ou duas patas de cavalo deixando a marca de um cavaleiro desaparecido, onde dançam a máscara, o braço drapeado, brandindo uma cítara, de um corpo volatilizado. Persianas fechadas, gelosias de tabuinhas. Escadarias monumentais atulhadas, à sombra das quais tacteia toda uma multidão. Maquinarias negras, acobreadas, de ascensores avariados, ferros forjados em desalinho. Uma floresta de colunas decapitadas, tendo por tecto o céu. Nomes antigos que se apagam, GRAND CAFÉ DO COMÉRCIO E DA BOLSA, CABELEIREIRO DE SENHORAS, ELLINIKON KOURION, PICCADILLY HOTEL, CAFÉ MEMPHIS, CINEMA RIALTO. Para quem a contempla do mar, Alexandria deve oferecer mais ou menos o seu rosto durrelliano de "Babilónia estilo Boulle". À medida que nos aproximamos, os traços começam a mexer, a nitidez das linhas corrompe-se: a ruína pulveriza subtilmente a máscara da riqueza.
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Lembrei-me hoje deste excerto do livro O meu chapéu cinzento - pequenas geografias, de Olivier Rolin (n. 1947). Depois de o ter lido, e ter revisitado Pharos e Pharillon, fiquei com uma daquelas certezas inabaláveis que um dia irei a Alexandria. Pelo que leio e me contaram é uma cidade demasiado generosa para que a possamos disfrutar na solidão e de uma só vez.
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A forma como Rolin conclui a frase deixa-me dúvidas. O envelhecimento das cidades, tal como o de algumas pessoas, acrescenta-lhes, e se outras coisas se perderam, charme e calor. É uma lei cuja veracidade tenho podido constatar, mais que uma vez.
Lembrei-me hoje deste excerto do livro O meu chapéu cinzento - pequenas geografias, de Olivier Rolin (n. 1947). Depois de o ter lido, e ter revisitado Pharos e Pharillon, fiquei com uma daquelas certezas inabaláveis que um dia irei a Alexandria. Pelo que leio e me contaram é uma cidade demasiado generosa para que a possamos disfrutar na solidão e de uma só vez.
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A forma como Rolin conclui a frase deixa-me dúvidas. O envelhecimento das cidades, tal como o de algumas pessoas, acrescenta-lhes, e se outras coisas se perderam, charme e calor. É uma lei cuja veracidade tenho podido constatar, mais que uma vez.
3 comentários:
"Alexandrie" se a minha memória não me falha foi um dos grandes titulos de uma canção interpretada nos anos 80 pelo saudoso Claude François de nacionalidade egipcia considerado um cantor pop françês. A.P
Lindo... e mais uma vez lhe "surrupiei" um post. Espero que não se importe!
Patrícia Bruno
http://pbruno2.blogspot.com/
Mesmo nada! Usou e usou muito bem!
Obrigado.
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