quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

PORQUANTO...

É bem conhecida aquela história do mourense a quem o taxista perguntou “a sua casa é aqui para a esquerda, não é?”. “Para a esquerda nunca! Vire à direita!”. E assim se deram voltas e mais voltas até chegar a casa, virando sempre à direita.

A vida é feita de recordações e de factos que lembram outros factos.

Foi assim: vou eu e faço pisca à direita e saio da rotunda e vai uma patrulha da PSP atrás de mim e alto e pára o balho! “O senhor não desfez o pisca, os seus documentos etc e tal”. Pois é, não tinha desfeito o pisca, eu a andar em frente e o sacana do pisca a piscar. E logo à direita. E à frente da polícia, assim como se fosse uma provocação, não era obviamente, mas nestas coisas nunca se sabe o que pensam os outros. Reconheci que sim, que o sacana do pisca dizia que era para a direita. E que o automático não funcionou e que o pisca faz assim um barulhinho maricas (depois disto o Rafael nunca mais me empresta o carro), que eu nem ouvi, mas o guarda (acho que era guarda, mas nisto das hierarquias sou uma nódoa) tinha razão. A gente pede desculpa. Chega? Não chega, ah, ah, boa piada, ó pra ele tão humilde a pedir desculpa. O que vem a seguir? Pedagogia? Uma chamada de atenção? Uma carolada? O quê? Vou ser multado por isto? “O sr. vai ser autuado, por infracção ao artigo etc. etc.”. Aí desligo e deixo de ouvir enquanto puxo a carteira à procura dos 60 euros. Ias em segunda e a trinta? Não fosses. Fosses mais depressa, que pagavas o mesmo. Passam-me o papel para assinar. Aí fico enternecido. O texto começava com uma conjunção coordenativa explicativa. Daquelas que já não se usam: “porquanto o condutor após ter efectuado a manobra da viatura para a direita manteve a sinalização da mesma”. Em tradução livre, o gajo virou e não desfez o pisca. Bom depois daquilo, deu-me vontade de o desfazer, mas ao pontapé. Só que o carro é do Rafael e depois ele zangava-se comigo…

Para a próxima desfaço o pisca, claro que sim sr. guarda. Até porque se na escala de coimas um gajo em segunda e a trinta e por distracção (ias distraído? não fosses) leva 60 euros o que acontecerá numa ultrapassagem a duzentos numa lomba? Pelotão de fuzilamento? Trabalhos forçados na Guiana? Fica-me ainda a vaga esperança que na próxima vez que me distrair, está-me sempre a acontecer este raio das distracções, a tal coisa da coima venha em forma de soneto. E de preferência com uma conjunção coordenativa explicativa.

Moral da história: nunca devemos fazer pisca à direita. Só e sempre para a esquerda.


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Crónica publicada no jornal A Planície em 1 de Fevereiro de 2008

16 comentários:

Antonio Caeiro disse...

concordo contigo, camarada Santiago,
mas á tanta gente neste pais a fazer pisca á esquerda e a virar sempre à direita!

Antonio Caeiro

Anónimo disse...

Esse episódio aconteceu em Moura? Quis ser "esperto" e conduzir como um condutor civilizado e pagou por isso. Dou-lhe o meu humilde conselho, faça como os seus conterrâneos, que são uns artistas em estacionar a menos de 5 metros das curvas, em estacionar em locais de saída de veículos, em cortar as curvas, em não utilizar os piscas, em estacionar sem pagar nos locais onde o pagamento é obrigatório...

AM disse...

Na cidade de Moura já presenciei o contrário, isto é, um agente da PSP a assistir passivamente sem actuar (cumprir o seu dever)perante uma viatura em estacionamento proibido e a prejudicar a circulação do trânsito.
Passou-se nos fins de 2009 na esquina do BES quando se sobre a Rua dos Correios (não recordo a toponímia). Tive de fazer manobras e subir o passeio com o carro e a meio das manobras parei o carro e dirigo-me ao agente da autoridade a lembrar a infracção a olhos vistos. Passados cerca de 30 minutos, volto a passar na zona e ainda continuava tudo na mesma, apenas com uma pequena alteração: o agente estava agora deslocado uns metros da prependicular à rua dos correios para não continuar a ver a infracção lesiva da normal circulação do trânsito.
Vá lá advinhar porquê, uns actuam por ninharias outros fecham os olhos a grandes infracções.

Anónimo disse...

Caro Santiago
esta está demais, gostei muito mas um dia eu pisquei para a esquerda, distrai-me e fui multada...
Moral da história: nunca devemos fazer pisca à esquerda. Só e sempre para a direita.

Sílvia Ramos

Anónimo disse...

Acho que o Henry Charriére foi bater com os costados à Ilha do Diabo porque foi apanhado numa "operação Stop" em Selmes, sem o papelinho verde do seguro automóvel assinado. Por essa infracção gravíssima que descreveste, até acho que o sr. agente da autoridade foi muito complacente.

J.G. Valente

Antonio Caeiro disse...

concordo contigo, camarada Santiago, mas neste pais à tanta gente que faz pisca à esquerda e vira sempre para a direita!

um abraço
Antonio Caeiro

Eduardo Lérias disse...

Um episódio engraçado (para quem não foi autuado) caracterizado de forma ímpar!
A actuação das Forças de Segurança será sempre criticada no nosso país! Por um lado haverá sempre a sensação de quem foi alvo de autuação de que a falta poderia ser alvo de reprimenda e actuação pedagógica, por vezes "praguejando" interiormente porque é que o vizinho do lado não foi autuado quando fez o mesmo ou pior!
Por outro lado, quando a actuação é passiva e/ou pedagógica perante uma situação que na nossa escala de valores não lhe caberia tal atitude, ficará sempre a sensação de falta de profissionalismo (e de outras coisas).
É difícil encontrar uma forma de encontrar um equilíbrio, ou seja, agradar a "Gregos e Troianos". O pior é que por vezes nem a uns nem a outros...

PS: também tinha pelo menos umas três histórias idênticas para caricaturar - e que também sairam do bolso!

Santiago Macias disse...

É engraçado que a republicação desta historieta tenha motivado tantos comentários.

Pondo as coisas nos seus devidos termos:
1. Fui autuado três vezes, ao longo de vinte anos (estacionamento, excesso de velocidade e o bendito pisca).
2. Não tinha razão para protestar, nem protestei.
3. Paguei as multas, sem esperar por amnistias.
4. No caso que relatei acho que houve, no mínimo, algum excesso de zelo. Uma coisa é uma falta motivada por distracção, que não pôs em causa a integridade de quem quer que fosse, outra é uma negligência grosseira. Ainda assim, paguei no momento e sem perdas de tempo.
5. O episódio ocorreu em Beja.
6. Amiga Sílvia: não é por nada, mas várias vezes te vi fazer pisca à esquerda e virar à direita!

Obrigado a todos!

R III R disse...

É por isso que eu não faço pisca, viro para a esquerda e para a direita e ainda não fui multado por isso. Cabe a quem manda a tarefa de proporcionar o melhor caminho, tanto para a esquerda como para a direita, o importante é não interromper o transito para evitar e desagradáveis apitadelas.

Rui P. Bebiano disse...

Esta história traz-me à lembrança um episódio passado vão para ai uns 30 anos. Estava eu e um grupo de estudantes a conspurcar uma parede da Escola Politécnica ou, em linguagem de "esquerdalho", a "pintar um mural", quando nos aparece um autêntico pelotão de polícia, a tal da segurança pública. Identificação para aqui, perguntas para ali, e lá estou eu a satisfazer a curiosidade do cívico sobre a minha morada. "Rua Antero de Quental, 55" , respondo eu. "Ouça lá, Quental ou Quintal?" interroga ele. Assim como que a dizer: "oh amigo você está a gozar comigo ou quê?!"

Porquanto não me espanta o fraseado da multa.

E na hora de escolher é virar à esquerda. Sem piscar!

Anónimo disse...

Em 15 anos fui multada duas vezes:
- A primeira porque diligentemente (como determina a lei) fui comprar o selo do carro com os documentos exigidos e, tendo-me esquecido, momentaneamente, de os colocar no local do costume apanharam-me a circular com o selo no sítio mas dois documentos obrigatórios a circular na pasta errada; a segunda porque estando com alguns problemas de estacionamento – situação que, na minha opinião, terá que ser repensada, a curto prazo, em muitas localidades – estacionei no lado esquerdo (como é óbvio…) numa rua de sentido único, conjuntamente com outros tantos conterrâneos que, diariamente, o continuam a fazer nesse local. Infelizmente para mim, deve ter sido sexta-feira 13, dia em que me calhou o bilhete premiado, com direito até a jackpot, porque o prémio nem chegou a ser dividido com os restantes apostadores (sorte a deles…!). Também não reclamei nem tinha por onde reclamar, embora tivesse ficado sempre aquele travo a multa imerecida na primeira e a de perseguição pessoal na segunda. Tinha como provar? Não. Se nem as escutas com as confissões mais evidentes são prova do que quer que seja neste país de impolutos prevaricadores… Estava em transgressão? Sim. Em evidente violação da lei. Mas Lei nunca foi sinónimo de Justiça. Agente de Autoridade nunca foi sinónimo de discernimento ou de aplicação correcta da Lei quanto mais de Justiça... Prefiro pensar que casos como os relatados são excepções à regra. Como em todas as profissões há os maus, os razoáveis e os bons profissionais e, dentro dos maus, há os que se perdem em preciosismos contraproducentes, os que precisam das multas para atingir objectivos de serviço e carreira, os que relaxam fechando os olhos às transgressões e aos crimes que jorram sangue… e haverá, porventura, os que imploram clemência, dão uma boa engraxadela ou sugerem (lhe) o pagamento de parte da multa à “legitimada” autoridade.
Pergunto-me que sociedade estamos a construir? Que valores estão a ser transmitidos às gerações mais novas? O que queremos atingir a esta velocidade vertiginosa onde já não sobra tempo para pensar no verdadeiramente essencial nesta única e irrepetível vida que nos foi, momentaneamente concedida? E damos por nós a pensar num amontoado de problemas a resolver quando, simplesmente, deveríamos estar atentos ao acto de conduzir de forma responsável. Espero que os maiores culpados por esta situação de demência e esgotamento generalizados não tenham, um dia, que confrontar-se com o esquecimento de um filho no banco traseiro do automóvel… em nome do progresso, da modernidade, da flexibilidade no trabalho ou do lucro rápido sem olhar a meios… Porque a história voltará a repetir-se com este ou outros tristes desfechos. Nesse dia, também poderá ser demasiado tarde e sem direito a reclamações ou segundas oportunidades. Demasiado tarde para perceber quem somos e em que direcção nos estamos a conduzir…

BB

Anónimo disse...

O Vosso problema é ~piscarem para o lado errado, mas são todos uns moralistas do caraças.
Divulgam as vezes que foram multados, umas com, outras sem razão, certo? Podiam dizer quantas vezes infrigiram a lei e os agentes deixaram passar a infracção sem lavarem a respectiva.
São cá uns moralistas.

Santiago Macias disse...

Sempre tive um certo fascínio por comentaristas carregados de azedume.

Pela parte que me toca não tenho o hábito de pregar moral. Era só o que faltava. E também não peço favores. Era só o que faltava (bis).

Anónimo disse...

Para o Anónimo das 13h40:
Nunca pedi "favorzinhos" quando sei que pisei o risco. Nada como transgredir, pagar e não ficar a dever "favorzinhos" duvidosos.
Há, porém, quem faça deslizar cartões para não ser autuado e os que infrigem as regras mais elementares, inclusivé autoridades no desempenho das funções. Não é preciso ver na tv o "Nós por Cá".
Pela minha parte não quis generalizar (pelo contrário) nem moralizar, porque moralistas são os que nunca assumem que erram mas teimam em pregar o "Sermão do Santo António aos Peixes".
Se a pessoa que é ou a entidade que representa são exemplos de perfeição, parabéns...registe a fórmula antes que mais alguém a descubra.

BB

Anónimo disse...

Estacinou no lado esquerdo numa via de sentido unico e foi multada?
Mas olhe que parece que isso é permitido. Veja lá que deve ter existido ai mais qualquer coisa.
E se não concordava podia ter contestado.
E historias são historias.
E sabores são sabores.

Anónimo disse...

Parece que isso é permitido?
Olhe que não,olhe que não...
Um dia destes ainda lhe sai a Lotaria da Páscoa sem saber porquê.
Já agora para não incorrer nesse "dissabor" fica esclarecido: Para permitir o estacionamento no lado esquerdo da via, ainda que seja de um só sentido, é necessário haver um sinal que indique que se pode estacionar no lado esquerdo. O Código refere que o estacionamento se faz sempre no sentido de rodagem e à direita da via, e nunca diz que se pode estacionar no lado esquerdo sem haver sinalização para o efeito.

Como vê não ia contestar apenas para gastar latim. Não sei onde é que leu que eu não concordei com a multa.
Se quiser insistir noutra versão da minha história, é um problema seu.


BB