domingo, 28 de fevereiro de 2010

ANA HATHERLY

SEM AMOR
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Viver sem amor
É como não ter para onde ir
Em nenhum lugar
Encontrar casa ou mundo.
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É contemplar o não - acontecer
O lugar onde tudo já não é
Onde tudo se transforma
No recinto
De onde tudo se mudou.
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Sem amor andamos errantes
De nós mesmos desconhecidos
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Descobrimos que nunca se tem ninguém
Além de nós próprios
E nem isso se tem.

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A corrida solitária da rapariguinha pelas ruas de Sifnos é uma imagem célebre da história da fotografia. Data de 1961 e é seu autor Henri Cartier-Bresson. Ana Hatherly é uma poetisa e ensaísta portuguesa (n. 1929), de marcado pendor experimentalista. A rapariguinha não corre à procura do amor. Mas um dia correrá. Não anda errante. Mas um dia poderá andar.

OUTROS PORTUGUESES

Teve ontem lugar, no Espaço Celeiros, em Évora, o encontro “Novas Culturas, Novos Futuros”, uma iniciativa promovida pela MultiCulti - Culturas do Mediterrâneo, pelo Campo Arqueológico de Mértola e pela Pédexumbo, parceiros da Rede Portuguesa da Fundação Euro-Mediterrânica Anna Lindh.
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O momento alto do encontro coube ao documentário Retratos: Portugal e os Portugueses Vistos pelos Imigrantes, da autoria de Luísa Homem. Um filme sensível e contado na perspectiva dos outros. Um filme que é, também, um documento político, a ser visto agora e dentro de uns anos, quando formos confrontados com novas realidades sociais e com tensões, agora mal perceptíveis, dentro da sociedade portuguesa.
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Pude constatar sem surpresa e ainda que com um pouco de amargura, enquanto moderador do debate, cinco coisas básicas:
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1. Continuamos cheios de boas palavras e de boas e inócuas intenções;
2. O fosso entre as elites bem pensantes e com um discurso muito à esquerda e muito flower-power, mas à margem da realidade, e as pessoas que sentem a rudeza de viver num país e numa cultura diferentes, são mais que visíveis;
3. Os entrevistados no filme têm uma visão acutilante, rigorosa e politicamente definida sobre nós, os outros portugueses;
4. Os entrevistados no filme, e a forma como nós não os conhecemos, são o espelho da nossa má consciência e da nossa incapacidade política;
5. Por mais que jovens supostamente radicais venham dizer horríveis e petulantes banalidades sobre a não validade de conceitos como "país", "origem", "europeu" etc., et pluribus unum é, só, o lema do Benfica.
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Fotograma do filme de Luísa Homem
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Próximas iniciativas deste interessantíssimo projecto:
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19 de Março - Centro Nacional de Cultura (Lisboa)
16 de Abril - Escola Básica 2,3 Miguel Torga (Amadora)
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Ver:
http://falredeportuguesa.blogspot.com/

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

ARQUEOLOGIA EM ALQUEVA

Foi uma excelente iniciativa da EDIA e testemunha bem a importância do património arqueológico da nossa região. Na sessão que me coube moderar, a desta manhã, foram apresentados resultados muito interessantes sobre necrópoles islâmicos - uma realidade desconhecida entre nós até há 30 anos - e sobre as intervenções em curso no sítio de Torre Velha (Serpa). Ou muito me engano ou ainda ouviremos mais vezes o nome deste sítio.
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Um pormenor que não é pormenor: o investimento da EDIA nestes domínios atinge 14 milhões de euros.
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FELLINI

Espalhafatoso e excessivo, Federico Fellini (1920-1993) marcou a segunda metade do século XX com os seus filmes. Este excerto pertence ao início de 8 1/2, nono classificado na lista da Sight and Sound. Poucos cineastas se poderão gabar de terem origem a um adjectivo (feliniano) e muito poucos se conseguiram manter originais e inventivos até ao fim. Menos considerado na altura entre o público intelectual que Visconti, por exemplo, o facto é que as obras de Fellini suportam bem a prova do tempo. Gosto de quase todos os seus filmes, em especial deste, da Dolce Vita (1960), de Amarcord (1973) e do crepuscular E la nave va (1983). Dois elementos decisivos na sua obra estão aqui presentes: o onirismo e o vento.
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quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

CUIDADINHO, BÁRBARA REIS...

Pois é, é tudo por acaso. Mas no seu lugar, Bárbara Reis, directora do diário Público, eu teria mais cuidado. Não é por nada, claro. É só por uma questão de prudência. Mas a vida está difícil, os empregos estão pela hora da morte e esta fotografia é uma desgraça. E você, Bárbara Reis, até é uma jornalista talentosa e autora de crónicas inteligentes. E tem um ar de pessoa simpática. Não a conheço pessoalmente mas peço-lhe, suplico-lhe, que não volte a publicar fotos do nosso primeiro com este ar de meio-Quasimodo. É que isto está mesmo mau e nunca se sabe quem pode vir a ter problemas na vida...
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PORQUANTO...

É bem conhecida aquela história do mourense a quem o taxista perguntou “a sua casa é aqui para a esquerda, não é?”. “Para a esquerda nunca! Vire à direita!”. E assim se deram voltas e mais voltas até chegar a casa, virando sempre à direita.

A vida é feita de recordações e de factos que lembram outros factos.

Foi assim: vou eu e faço pisca à direita e saio da rotunda e vai uma patrulha da PSP atrás de mim e alto e pára o balho! “O senhor não desfez o pisca, os seus documentos etc e tal”. Pois é, não tinha desfeito o pisca, eu a andar em frente e o sacana do pisca a piscar. E logo à direita. E à frente da polícia, assim como se fosse uma provocação, não era obviamente, mas nestas coisas nunca se sabe o que pensam os outros. Reconheci que sim, que o sacana do pisca dizia que era para a direita. E que o automático não funcionou e que o pisca faz assim um barulhinho maricas (depois disto o Rafael nunca mais me empresta o carro), que eu nem ouvi, mas o guarda (acho que era guarda, mas nisto das hierarquias sou uma nódoa) tinha razão. A gente pede desculpa. Chega? Não chega, ah, ah, boa piada, ó pra ele tão humilde a pedir desculpa. O que vem a seguir? Pedagogia? Uma chamada de atenção? Uma carolada? O quê? Vou ser multado por isto? “O sr. vai ser autuado, por infracção ao artigo etc. etc.”. Aí desligo e deixo de ouvir enquanto puxo a carteira à procura dos 60 euros. Ias em segunda e a trinta? Não fosses. Fosses mais depressa, que pagavas o mesmo. Passam-me o papel para assinar. Aí fico enternecido. O texto começava com uma conjunção coordenativa explicativa. Daquelas que já não se usam: “porquanto o condutor após ter efectuado a manobra da viatura para a direita manteve a sinalização da mesma”. Em tradução livre, o gajo virou e não desfez o pisca. Bom depois daquilo, deu-me vontade de o desfazer, mas ao pontapé. Só que o carro é do Rafael e depois ele zangava-se comigo…

Para a próxima desfaço o pisca, claro que sim sr. guarda. Até porque se na escala de coimas um gajo em segunda e a trinta e por distracção (ias distraído? não fosses) leva 60 euros o que acontecerá numa ultrapassagem a duzentos numa lomba? Pelotão de fuzilamento? Trabalhos forçados na Guiana? Fica-me ainda a vaga esperança que na próxima vez que me distrair, está-me sempre a acontecer este raio das distracções, a tal coisa da coima venha em forma de soneto. E de preferência com uma conjunção coordenativa explicativa.

Moral da história: nunca devemos fazer pisca à direita. Só e sempre para a esquerda.


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Crónica publicada no jornal A Planície em 1 de Fevereiro de 2008

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

BISSAU IV - CARNAVAL

Saí de Bissau muito antes do Carnaval começar. A festa já tinha, contudo, "tido início". Já estavam em funcionamento as mais de 300 (!) tasquinhas que, durante semanas, dão animação à cidade. Foi aí que o Carlos Leles e o Fernando Arlete me iniciaram nas provas do vinho de palma. Uma experiência radical e para ser repetida.
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Pelas descrições que me fizeram e pelas imagens que consegui ver foi/é, decerto, um Carnaval como deve ser. Com improvisação e criatividade. Sem alas de baianas, nem mestres salas e portas bandeiras, nem sambistas trôpegas, tudo copiado à pressa e sem graça. É por isso que, quando olho para os nossos "carnavais", fico deprimido. Valham-nos aquelas festas populares que, de forma improvisada, se fazem, e onde têm lugar verdadeiras e desregradas celebrações.
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Mais fotografias deste autor em:
www.flickr.com/photos/gumbe/

BES PHOTO 2009 - PATRÍCIA ALMEIDA

A esta hora ainda não consegui ter informações sobre o vencedor deste ano do BES PHOTO. A iniciativa é uma das mais ousadas no nosso panorama fotográfico. Dos três projectos seleccionados escolho eu este, de Patrícia Almeida (n. 1970). Não é o mais radical ou avant-garde, mas tem um estilo Woodstock que me tocou pela sua ingenuidade. A série All beauty must die mostra-nos essa juventude cheia de acne e despreocupada, que passa na sua totalidade para as fotografias. Faça-se então o contraponto com o artificialismo do projecto Portobello que, a despeito do nome, temos dificuldade em situar geograficamente... Será o Verão igual em todas as praias de turismo de massas?
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Páginas a ver:
www.patriciaalmeida.com
www.museuberardo.com
www.bes.pt/besphoto

domingo, 21 de fevereiro de 2010

NEWSPEAK

Regressemos a Orwell. Regressemos a 1984. Por causa da newspeak ou novilíngua. Da qual Luís Figo parece ser adepto. Ontem manifestou o seu desagrado por se ver envolucrado na trapalhada do processo da PT. O verbo envolucrar existe, mas não com o sentido que Figo lhe quis dar.
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Envolucrado, na interpretação que o ex-futebolista lhe quis dar, parece mais a junção de envolvido com encalacrado. Deve ser isso.
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sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

O MAUSOLÉU DE HALICARNASSO

Não é que falar de ensino superior me tenha suscitado pensamentos "fúnebres", mas uma revisão do kitsch na arquitectura e no património levou-me, em linha recta, ao Mausoléu de Halicarnasso. Depois de já aqui ter apresentado uma reconstituição, ao vivo, do Partenon, nada melhor que mostrar um monumento que já não existe...
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Trocando por miúdos: das chamadas Sete Maravilhas do Mundo Antigo (uma criação do século II a.C.) só chegaram até nós as Pirâmides de Gizé. As outras foram destruídas e refeitas a partir de várias descrições, mais ou menos precisas (v. imagem de cima). Não sabia da existência de uma versão deste túmulo do século IV a.C., destinado a ser a morada eterna do rei Mausolo e de Artemísia, sua irmã e esposa (ena!). Deparei com o edifício da imagem de baixo, para meu espanto e gáudio, em Pittsburgh, em Abril de 2004. É um memorial dedicado à Guerra Civil e com uma exposição tão pirosa quanto a ideia de reproduzir um monumento da Antiguidade.
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La cerise sur le gâteau: no dia em que lá fui decorriam as primárias do Partido Democrata. O ambiente é muito diferente do das nossas mesas de voto; quem se ocupava de tudo eram umas velhinhas amabilíssimas, com um ar pouco profissional e um inequívoco estilo de chá e bolachas. Os votos eram metidos numas máquinas gigantescas que faziam um estrondo que ecoava pelos corredores. Passeei por ali sem que ninguém, votantes ou delegados, se mostrasse incomodado com a bisbilhotice. Ganhou John Kerry.
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quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

BOLONHA

Não há ainda muito tempo andava muito boa gente histericamente entusiasmada com o processo de Bolonha e com a adaptação dos cursos ao esquema de 3 + 2 de Bolonha. Nunca partilhei do entusiasmo - muitos colegas poderão testemunhá-lo - e tive a certeza que iríamos entrar num período de retrocesso. Posso agora dizer: pronto, já está!
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Tendo feito a licenciatura, e o mestrado, no século passado, posso ser algo suspeito nas minhas opiniões. Ao acabar ontem de corrigir os exames da disciplina de Introdução à arquitectura islâmica, do Mestrado em Arquitectura da Universidade de Évora, dissiparam-se todas as dúvidas. Aqui vão alguns tópicos, fruto de anos de trabalho, dentro e, sobretudo, fora das universidades:
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1. Os alunos saem do secundário com uma preparação cada vez mais sumária e insuficiente. Os filhos da educocracia reinante não sabem escrever e, pior ainda, lêem muito pouco. São frequentes, em estudantes de anos mais avançados, os erros de palmatória em matéria de ortografia e de sintaxe. Não consigo traduzir em palavras o desespero que sinto nessas alturas.
2. Os semestres passam-se a correr e sem a possibilidade de se desenvolver um trabalho minimamente estruturado e consequente. Muitos alunos optam, à partida, por se prepararem para o exame (a ideia de "exame" num mestrado nunca me encaixou completamente, confesso).
3. O sistema de passagem de disciplinas anuais a semestrais, consumado há já longos anos, não trouxe nenhuma vantagem sensível ao sistema de aprendizagem. Pior ainda, passou-se de um sistema em que se privilegiava a realização de trabalhos de investigação ao longo do ano lectivo para um esquema em que os alunos são, de forma mais ou menos evidente, dirigidos para as frequências e para os exames. Imperam a sebenta e um sistema de repetição de ideias onde a criatividade está ausente.
4. Mesmo nos mestrados se assiste a uma multiplicação de disciplinas, que deixam pouquíssimo espaço para o desenvolvimento de uma investigação digna desse nome. Desgraçadamente, já me apareceram trabalhos onde na bibliografia surgem referências à wikipedia. Umberto Eco deu uma entrevista sobre alguns dos malefícios da net. Duvido que tenham eco as suas preocupações.
5. As dissertações de mestrado ressentem-se de tudo isso. A Profª Iria Gonçalves exasperava-se com as nossas falhas nas vírgulas e, no meu caso, com um estilo por vezes pouco académico de escrita. Se ela soubesse como isto está agora...
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Conclusão: quando, no outro dia, contei aos meus alunos que no Mestrado em História Medieval da Universidade Nova tínhamos apenas quatro seminários (dois por ano!) fui olhado com a curiosidade de quem vê uma espécie em vias de extinção. Estarei a ficar velho?
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Bolonha não tem culpa de ter dado o nome a um aborto. Estas são as mais célebres torres medievais da cidade.

MÉRIDA

A avaliar pela ausência de comentários, a matéria fotográfica não é a que mais interessa a quem passa aqui pela Avenida. Menos mal que o autor do blogue gosta de fotografia.
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Esta tem uma pequena história: na Primavera de 2002, em plena "crise criativa", e a um passo de abandonar o projecto de tese, fugi para Mérida durante quatro dias. Para quem se interessa pelo passado islâmico é assim meio contraditório ter passado tantas horas dentro do Museu Romano. Mas precisava do silêncio e de um sítio fotogénico para me servir de pretexto. Esta fotografia foi das últimas a serem feitas. Já só me restavam rolos de baixa sensibilidade (salvo erro, o Delta 100). Resolvi testá-los, e à velha Nikon FM2, enquanto esta vigilante do museu se passeava para trás e para a frente. A definição, e a própria fotografia, não são nada por aí além, mas a sombra do gradeamento dá algum dramatismo à imagem.
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Sobre o Museu de Mérida, um belo projecto de Rafael Moneo (imagem em baixo, do blog uma espécie de coiso) ver:
http://museoarteromano.mcu.es/
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quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

ORNELLA VANONI

No outro dia, uma amiga, das mais antigas e queridas, acusou-me de "grande sentimentalão". Um manifesto exagero. No entanto, e à boleia disso, aqui fica este êxito com 40 (quarenta) anos, do Ornella Vanoni (n. 1934). A canção surge quase no fim do filme Ocean´s Twelve. É bem bonito este encontro. Mesmo se a Ornella parece, com aquele penteado, a Angela Davis em versão branca.
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ANIMAÇÃO NÃO VAI FALTAR

Por ordem alfabética temos:
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Aníbal Cavaco Silva
Fernando Nobre
Manuel Alegre
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Ainda falta o candidato do PCP. E falta saber se o Bloco apoia mesmo Alegre ou avança com candidato próprio.
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Para já:
Cavaco Silva leva vantagem, mesmo sem se mexer muito. A candidatura de Fernando Nobre é a versão soarista-2010 da velha canção "A vingança serve-se fria". Alegre não vai lá, e com o apoio do Bloco menos ainda. O eleitorado do grande centro não vai muito com o estilo pregador televisivo de Louçã. Preparem-se que o ano vai ser longo. E que isto vai ser giro, vai...

VEJAM ATÉ AO FIM...

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TIREM DEPOIS AS CONCLUSÕES.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

NUNO FERRARI

Chamava-se Nuno Ferreira, mas ficará para a posteridade como Nuno Ferrari. Nasceu em 1935, faleceu em 1996, foi jornalista de A Bola e era um extraordinário fotógrafo. Vi-o muitas vezes, na Luz, em Alvalade, no Restelo, correndo literalmente atrás das jogadas e fotografando com uma enorme classe. Muitas das melhores imagens do nosso jornalismo desportivo são dele.
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A mania da fotografia - uma mania que só ofende as finanças caseiras - devo-a a uma exposição de Nuno Ferrari, em Moura, na Festa de Nossa Senhora do Carmo, em 1970 ou em 1971. Retenho dessa mostra uma extraordinária imagem de um jogo entre o Sporting e o Benfica. Dois jogadores disputam a bola, que tentam cabecear. Na fotografia estão só eles, captados da cintura para cima, sobre um fundo de chapéus de chuva negros. Todo o esforço, toda a vontade de vencer, naquele dia de chuva intensa, couberam no enquadramento magistral de Nuno Ferrari.
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Juntamente com esta fotografia de Eusébio, no Mundial de 1966, fica uma recordação da King Regula, a máquina que o João tinha comprado em Angola e que, às vezes, me deixava experimentar. Era um aparelho simples, mas com um belíssimo fotómetro e com uma lente de fazer inveja a muita sucata que por aí anda.
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CIDADE ALFACINHA

A peça já não está em cena, mas não é essa a questão que agora interessa. A Cornucópia apresentou no S. Luís a peça A cidade, uma colagem de textos de Aristófanes, um autor que viveu há 2500 anos. A cidade é alfacinha, porque há contornos claramente lisboetas na adaptação. A cidade é também portuguesa (e universal), porque as preocupações com o governo da polis não mudaram e porque há temas que permanecem espantosamente actuais. Sobretudo, porque a utopia da cidade perfeita nos persegue. 2500 anos e nem uma só ruga. Uma peça de Aristófanes entra agora na bicha das leituras: Assembleia de Mulheres, na qual elas tomam o poder.
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A Cornucópia rejuvenesceu-se, integrando no elenco jovens estrelas do universo televisivo. O resultado é positivo, embora o tom revisteiro (quase tenho vergonha em confessar que sempre abominei o género) seja exagerado.

domingo, 14 de fevereiro de 2010

LIVRARIAS DE PARIS

O mundo muda a cada instante. Muitas vezes gostamos da mudança. Outras vezes nem por isso. Mantenho fidelidade incondicional às livrarias. É das poucas fidelidades, para além do SLB, que me atrevo a jurar. Gosto das livrarias que não mudam. Nem de rua, nem de arrumação, nem de funcionários. E que ficam assim para a eternidade. Conheci em Paris várias livrarias dessas, em especial entre 1997 e 2005, onde as minhas finanças se afundavam, sem pena nem arrependimento. Continuo a comprar livros de História, de Fotografia e de Arte. Mas alguns dos sítios não têm o mesmo charme.
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As Presses Universitaires de France fecharam, já há anos, a livraria do Boulevard Saint-Michel. É agora uma casa de roupas. A Maisonneuve et Larose, cujo catálogo de estudos islâmicos fui comprando ao longo de anos, está devoluta. Parece que vai ser um restaurante. Tinha a divertida particularidade de nunca ter facturas como Deus manda. Davam aos clientes um papel manhoso, com um carimbo. Acho que aquilo não valia nada, mas sempre me servia para a contabilidade doméstica. Mas a minha preferida era a Geuthner, na Rue Vavin, uma antiga casa editora em cuja livraria se amontoavam livros antigos, velharias, raridades, preciosidades e uma ou outra coisa recente. Entrava-se por um portão, depois de tocar à campainha. Passava-se um corredor, entrava-se num pátio e empurrava-se a porta. A porta tinha um sininho que anunciava a nossa entrada, porque os empregados eram invisíveis. Tudo aquilo um ar de filme de espiões, ou de livro de Graham Greene. Alguns dos melhores livros de arqueologia islâmica lá de casa são "fruto" de elaboradas pesquisas nas prateleiras da Geuthner. Comprados no meio da conversa com um funcionário, profundo conhecedor dos temas e que se entretinha a dizer mal do patrão...
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A Geuthner mudou de sítio. Não fui lá mas aposto que o charme não é o mesmo. De certeza que não é o mesmo.
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Memória sentimental: a Maisonneuve et Larose era aqui...

sábado, 13 de fevereiro de 2010

CÉU PLUVIOSO

As nuvens são tão espessas que se diriam formarem,
para cá da abóbada celeste, fumo de madeira verde.
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A chuva é fina como limalha de prata,
derramada sob um solo de âmbar.
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Por um momento o sol brilha
como escrava que se mostra ao comprador.
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Agora que a chuva regressou, é altura de recordar este belo poema de Ibn Ammar (século XI), na tradução de António Borges Coelho. Que casa bem com a fotografia de Dennis Stock (1928-2010), com um solitário James Dean passeando numa rua cheia de chuva.

BISSAU III - 25 ANOS DEPOIS

Ainda os reconheceria? Ainda se lembrariam de mim? Estariam muito diferentes? Estaríamos muito diferentes? Os reencontros com o passado nem sempre são felizes e muitas vezes desliguei o telefone quando a marcação do número ía a meio. Até ganhar coragem.
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Bissau trouxe-me, por isso, a recordação de dias felizes. Sim, recordávamo-nos todos uns dos outros. 25 anos depois, 20 quilos mais tarde. Não pertenciam todos à mesma rede social (chamemos-lhe assim) da Faculdade de Letras. Mas a Filomena Miranda, o Domingos Semedo e o Pedro Milaco são os mesmos colegas fraternos, simpáticos e descontraídos de quem guardava as melhores memórias. Tal como o Leopoldo Amado ou a Filomena Martins, que estão em Cabo Verde e que gostaria de rever um destes dias. Em Bissau recuperei o paradeiro de colegas senegaleses e mauritanos de quem perdera o rasto. Costumavam convidar-me - o único europeu numa multidão africana - para ir jantar com eles ao Murganhal, na espécie de república onde viviam. O jantar era coisa para acabar às seis da manhã, a horas de apanhar o primeiro autocarro...
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Não vou, seguramente, arriscar esperar mais 25 anos antes de os voltar a reencontrar. De certeza absoluta.
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sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

SOL

Acabo de comprar o jornal SOL. É coisa que faço raramente. Nunca gostei muito da forma nem de muitos dos conteúdos. A banalidade de espreitar pelo buraco da fechadura, como diz o outro, não me motiva por aí além. Achei, contudo, que comprar o jornal era o mínimo a fazer. Por causa de uma coisa chamada liberdade.
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CÉSAR BARRETO

Nestes dias de clima opressivo em que nos querem meter lembrei-me, quase sem querer, do César Barreto. Conheci o César quando se preparava a exposição Lusa - a matriz portuguesa. Ele tinha sido encarregue da produção do material fotográfico do catálogo. É um homem de espírito livre e aguçado sentido criador. A tarefa que lhe foi atribuída era realizada com brilhantismo e boa disposição. Mas também com uma descontracção e uma nonchalance que punha os nervos da Conceição e da Ana Isabel em franja. As peças mais precisosas eram manipuladas de uma forma que escapava aos manuais dos conservadores de museus. Tudo se resolveu, no meio de alguns gritos e do imperturbável sorriso do César.
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Acabei por establecer com ele, nas tardes passadas no improvisado estúdio que se montou no antigo cofre-forte do Banco do Brasil, uma simpática relação de amizade. Esta imagem do seu querido Rio de Janeiro está publicada no catálogo que me ofereceu.
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quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

MATCH OF THE DAY

SOL - 1
SÓCRATES - 0

NELSON MANDELA

Fez hoje vinte anos. O mundo nunca mais foi o mesmo depois da libertação de Nelson Mandela. A opressão e o "apartheid" foram derrotados nessa tarde de Fevereiro de 1990. Pelo que fez antes e, sobretudo, por tudo o que fez depois Nelson Mandela está muitos quilómetros acima de quaisquer outros políticos do século XX.
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Seis anos antes os SPECIAL AKA fizeram sair este hino à liberdade do líder histórico do ANC. O ska tem este tom de festa que antecipava o que se iria passar. Ouvi o disco vezes sem conta, até o vinil parecer um terreno lavrado.
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quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

TODOS PELA LIBERDADE

Amanhã é dia de blogomanif. O avenida da salúquia 34 solidariza-se com a iniciativa.
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SERENATA À CHUVA

A entrada deste filme (nono lugar ex-aequo) na lista dos dez melhores filmes de sempre é recente. Serenata à chuva esteve no "top" em 1982 e regressou depois em 2002. Esta sequência, que dá o título ao filme, é a mais célebre de todas. A cena do maluco apaixonado dançando à chuva é difícil de esquecer, tal como a outra sequência em que Kelly dança com Cyd Charisse. Mas aqui os olhos do público, e os do próprio Kelly, prendem-se, antes de mais, às pernas esculturais da bailarina.
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Pessoalmente prefiro outro filme de Kelly, Um americano em Paris, mas este último foi dirigido por Vincente Minnelli. Serenata à chuva é um filme em 1952, realizado pelo próprio Gene Kelly e por Stanley Donen.
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terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

SIGHT AND SOUND

Qual é o melhor filme do mundo? Quais são os melhores filmes do mundo? A resposta - uma das respostas, melhor dizendo - é dada de 10 em 10 anos, desde 1952, pela revista britânica Sight and Sound. Cineastas e críticos de muitos países (nenhum português, sorry) votam e elegem. Uma passagem pelas diferentes escolhas dá-nos a medida das flutuações dos gostos, que são também flutuações estéticas, políticas, sociais etc. A lista de 2002 é a mais politicamente correcta de todas. Faltam ali filmes, creio eu, mas não sou cineasta nem crítico.
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Esta iniciativa deve-se boa parte da sua celebridade ao espírito empreendedor de Penelope Houston, editora da revista entre 1956 e 1990. É a autora de O cinema contemporâneo, ensaio sobre o cinema do pós-guerra. Foi editado há muitos anos na Ulisseia (salvo erro) e tornou-se um dos livros mais importantes da minha juventude. O estilo gracioso e flamboyant de Penelope Houston é uma lição de escrita e de comunicação. E pelas suas páginas passa um profundo conhecimento da História do Cinema.
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Não há nenhum filme português no top ten. Ainda assim Charles Tesson, editor dos Cahiers do Cinema, considera Francisca, de Manoel Oliveira, um dos dez melhores filmes de sempre.
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A partir de amanhã começarei a divulgar aqui na avenida excertos dos dez melhores filmes.
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Site da revista: www.bfi.org.uk/sightandsound/

TODO O OURO DE BIZÂNCIO

Todo o ouro e todo o azul. Foi por causa da exposição De Byzance à Isntabul, que esteve patente no Grand Palais, em Paris, que me lembrei de um pequeno e utilíssimo livro intitulado Tout l'or de Byzance. O seu autor, Michel Kaplan, conduz-nos pelo passado da cidade, traduz fontes escritas e dá-nos as primeiras pistas sobre uma das cidades mais importantes da nossa civilização. Não foi por acaso que Peter Brown afirmou em tempos que "devemos mais a Justiniano que a Roma."
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A releitura de excertos do livro leva-me a reproduzir imagens de dois sítios diferentes e, afinal, tão próximos. Em cima temos a Collegiata de San Gimignano, em Itália, onde encontramos o cromatismo alternado dos arcos formeiros, tão cara aos ambientes do Oriente, que encontramos na arqueitectura transalpina, e que os otomanos se encarregaram de difundir pela bacia do Mediterrâneo. Na imagem de baixo reproduz-se a cúpula de uma mesquita de Istanbul, a Yildiz Hamidiye, de finais do século XIX.
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O que as une? O ouro das estrelas sobre a abóbada celeste. A ideia do infinito sobre nós. E, sim, é verdade que nas mesquitas, mesmo nas mais recentes - e antes da histeria contemporânea - encontramos estes pontos de contacto com as igrejas. São maneiras de representar o mundo que remontam a muitos séculos antes de Cristo e que perduraram até nós.
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O livro de Michel Kaplan continua à venda e custa a insignificância de 14 euros. Ver: www.gallimard.fr

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

CARNAVAL

Quando ontem uma colega me sugeriu que nos encontrássemos na próxima segunda-feira respondi-lhe que até me dava jeito, porque vou estar em Lisboa. Mas alertei "olha que é segunda-feira de Carnaval". Respondeu-me "Carnaval é todos os dias, nesta terra".
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Bem observado.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

CARDEAL CEREJEIRA

Manuel Gonçalves Cerejeira (1888-1977) foi cardeal e patriarca de Lisboa. Doutorou-se em História com um trabalho notável, sobre Clenardo, e foi o primeiro cardeal a usar o avião para se deslocar a um conclave, o que elegeu o dúbio Pio XII, em 1939. Em termos de modernidade por aí se ficou
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O cardeal Cerejeira foi também fiel aliado de Oliveira Salazar. Sob a égide de Cerejeira, a igreja tornou-se parte integrante do fascismo, ora de forma activa (veja-se o papel destinado às missões no processo de colonização), ora de forma passiva, fingindo não ver a repressão e agindo com aquele cinismo tão característico de alguns círculos do poder. Cerejeira pairou sobre o século XX português com a arte e engenho melífluos. Até depois do 25 de Abril tal presença se fez sentir. Foi uma charge à sua figura que esteve na origem do primeiro acto censório do Portugal livre, quando o Gen. Galvão de Melo mandou cortar uma emissão televisiva na qual o cardeal, e outras figuras do fascismo, eram parodiadas.
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Passou-me ao lado a homenagem de que o Cardeal Cerejeira foi alvo, há pouco mais de dois meses. O assunto foi agora reavivado numa coluna do diário I. Há uma estátua em Almada, celebrando Cerejeira, um dos obreiros do Cristo-Rei, "farol divino, uma mensagem de amor, uma grandiosa profissão de Fé!" (cf. site do santuário). Poderia acrescentar-se que a obra é, também, uma homenagem imorredoura ao kitsch na arquitectura...
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Pois bem, a Câmara de Almada (CDU) associou-se à homenagem, considerando a estátua um elemento de valorização do concelho. Com palavras de entusiasmo: "Este é um momento importante para a nossa terra. Portugal está mais rico e a nossa cidade também". É pena. Na terra onde há homenagens, bem mais discretas, a heróis do Povo Português como Alfredo Diniz era escusada tanta excitação. Valha-nos uma coisa: a estátua é péssima.
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sábado, 6 de fevereiro de 2010

SILENZIO CANTATORE

Amenizemos então a tarde, que o dia tem sido difícil. Os papéis à volta da mesa acumulam-se e um texto que devia estar concluído não está. A canzone napoletana é sempre um bom auxílio. Este Silenzio cantatore em particular, uma conhecida canção de amor de 1922 (autores: Libero Bovio/Gaetano Lama), é uma das minhas favoritas.
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A gravação é de 2008. A interpretação é do grande tenor Josep Carreras (n. 1946).
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ALBERTO GIACOMETTI E A SOMBRA DA TARDE


O mercado das artes agitou-se esta semana com um novo recorde na compra de uma escultura. L' homme qui marche I, concebida em 1961 pelo artista suiço Alberto Giacometti (1901-1966), foi vendida por 74,4 milhões de euros e pertencia ao Commerzbank alemão.
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A Sotheby's refere o anónimo comprador como um "investidor". As obras de arte dos consagrados, sujeitas a flutuações e a modas, vão sendo vendidas a preços cada vez mais astronómicos e são vistas como activos pelas empresas. E, ao contrário das acções, nunca desvalorizam. Walter Benjamim tinha meia razão quando escrevia sobre a democratização da Arte por via dos meios mecânicos de reprodução. Todos nós temos hoje reproduções de conhecidas pinturas ou fotografias nas nossas casas. Mas isso não diminuiu, contudo, o endeusamento das peças únicas e originais.
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O percurso de Giacometti é marcado pela originalidade do seu verticalismo e por uma forte carga expressionista, ainda que o conjunto da sua obra seja difícil de catalogar ou de etiquetar. O facto de Giacometti ter, em tempos, dito que não esculpia figuras humanas, mas sim as sombras que elas produzem, remete-nos para outra realidade. O Museu Guarnacci, em Volterra, tem em lugar de destaque uma escultura etrusca poeticamente conhecida como L'ombra della sera (A sombra da tarde). Foi encontrada em 1879 e data do século II a.C. Alberto Giacometti conheceu estas e outras produções da cultura etrusca. O facto não lhe retira mérito. Mas deixa-nos a pensar sobre o genial autor da peça de Volterra.
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Sobre L'ombra della sera: http://ombradellasera.com/

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

JÁ SE PÔS O SOL...

... e são 23 horas.
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Até este momento nem o primeiro-ministro, nem o presidente do supremo, nem o procurador-geral apresentaram a demissão.
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De diferentes formas, e em diferentes graus, todos eles nos mentiram ou omitiram factos importantes. De forma deliberada e intencional.
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Num país sério, ou a sério, já se teria feito mais e melhor que mandar abrir um inquérito por causa da divulgação das escutas. Se isto fosse um país sério ou a sério, bem entendido...

CRIMETHINK

"Thoughtcrime is death. Thoughtcrime does not entail death, Thoughtcrime is death.... The essential crime that contains all others in itself."
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Tony Blair leu George Orwell, evidentemente. Na segunda metade do século XX toda a gente o lia. Bem sei que a definição dada por Orwell tinha a ver com o desafio da ortodoxia. No entanto, a noção que todos os crimes começam com um pensamento assenta como uma luva a Tony Blair. Até porque, na história real, Blair não é acusado, mas sim acusador. É isso que lhe permite dizer "a decisão que tomei - e francamente voltava a tomar - foi de que se houvesse alguma possibilidade de ele [Saddam Hussein] desenvolver armas de destruição maciça nós deveríamos pará-lo".
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O Iraque é o primeiro massacre global da História apoiado numa hipótese. Que foi vendida a todo o planeta como uma verdade irrefutável.
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PIET MONDRIAN

Piet Mondrian (1872-1944) nasceu no seio de uma família calvinista. O pai desaprovava claramente as tentações artísticas do jovem Pieter. Este só muito lentamente abraçou a carreira artística.
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Participou em diversos movimentos artísticos de vanguarda, em especial na década de 20, destacando-se na sua obra o geometrismo das composições e o uso insistente das cores primárias. Mondrian tornou-se uma figura de primeira linha das artes plásticas da primeira metade do século XX. Dir-se-ia, contudo, que a austeridade do calvinismo nunca foi inteiramente esquecida, pelo menos se tivermos em conta o rigor e o formalismo das suas telas. Imagens para serem vistas em dias de luz perfeita e exacta.
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Composição com Amarelo, Azul e Vermelho (1937-42), Tate Gallery, Londres
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Em Dias de Luz Perfeita e Exacta
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Às vezes, em dias de luz perfeita e exacta,
Em que as cousas têm toda a realidade que podem ter,
Pergunto a mim próprio devagar
Por que sequer atribuo eu
Beleza às cousas.
Uma flor acaso tem beleza?
Tem beleza acaso um fruto?
Não: têm cor e forma
E existência apenas.
A beleza é o nome de qualquer cousa que não existe
Que eu dou às cousas em troca do agrado que me dão.
Não significa nada.
Então por que digo eu das cousas: são belas?
Sim, mesmo a mim, que vivo só de viver,
Invisíveis, vêm ter comigo as mentiras dos homens
Perante as cousas,
Perante as cousas que simplesmente existem.
Que difícil ser próprio e não ver senão o visível!
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Alberto Caeiro in "O Guardador de Rebanhos" (poema XXVI)