segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

ANTES QUE ME ESQUEÇA...

E antes que o ano acabe. Só para dizer que um dos meus motivos de diversão neste ano, pouco divertido, de 2012, foi/é o facto de um dos homens no epicentro das negociatas da área governamental e presidencial se chamar Fernando Fantasia. Fantasia? Não gosto de ironias a partir dos nomes das pessoas, mas que este é um nome extraordinário lá isso é.

O resto não dá assim tanta vontade de rir. O resto é um jogo de máscaras, de silêncios, um permanente carnaval veneziano.

Até amanhã, já em 2013. Nem me atrevo a dizer "bom ano!"...

domingo, 30 de dezembro de 2012

LISTEN VERY CAREFULLY, I SHALL SAY ZIS ONLY ONCE!

Passaram 30 anos. Ouvi hoje de manhã, na Antena 1. A série Allo! Allo! estreou na BBC no dia 30 de dezembro de 1982. Acompanhou parte do meu percurso final na faculdade, animando as noites de sábado (ou de domingo?). Uma ideia genial, personagens delineados com brilhantismo e uma série para a história da TV. Momentos memoráveis: as intervenções de Herr Flick, as "canções" de Edith, a soldado Helga de sangue quente, as entradas em cena do capitão Bertorelli e a fantástica declaração de Michelle Dubois "Listen very carefully, I shall say zis only once!".

 
 The fallen Madonna with the big boobies, do inexistente pintor holandês Van Klomp.

ARTE ISLÂMICA - 9/10

Penúltimo momento de uma visão parcial e parcelar da arte islâmica. Não é que este tópico seja inédito no blogue (v. aqui). Mas o perigo em que os mosaicos da mesquita de Damasco estão justificam a referência. Os mosaicos, do séc. VIII d.C., são uma peça maior da arte do planeta. São arte islâmica na medida em que estão no pátio de uma mesquita. São-no também pelas representações dos jardins do Paraíso, cuja feitura tanto entusiasmava o califa al-Walid. Mas têm, também, uma expressão que não é exclusivamente islâmica, na medida em que os artesãos eram "importados" da corte bizantina. Tal como os que trabalharam em Córdova. Ibn Abd al-Munim al-Himyari faria um curioso comentário a esse propósito, dizendo que os mosaicos foram encomendados aos cristãos, porque os árabes não os saberiam fazer...


Um dos mais interessantes levantamentos destes mosaicos data de 1929. Foi empreendido por iniciativa de Victor Eustache de Lorey. Está, de novo, visível no Louvre.

sábado, 29 de dezembro de 2012

TOMAI LÁ DE VÍTOR FIGUEIREDO

Nova tentativa nos caminhos da arquitetura que se fez/faz no Alentejo. Neste caso, com menção expressa a um projeto de Vítor Figueiredo (1929-2004), que abrangeu um quarteirão de habitação social, em Mértola. Desenhos retilíneos nas fachadas, casas que se interpenetram, com um hábil aproveitamento do espaço e a redução ao mínimo do desperdício. As habitações, de r/c e 1º andar, não chegam aos 80 m2. Mas parecem ter muito mais. Nas traseiras há pátios que criam saudáveis relações de vizinhança. Falo por experiência própria.


Na Casa Defronte 

Na casa defronte de mim e dos meus sonhos,
Que felicidade há sempre!

Moram ali pessoas que desconheço, que já vi mas não vi.
São felizes, porque não sou eu.

As crianças, que brincam às sacadas altas,
Vivem entre vasos de flores,
Sem dúvida, eternamente.

As vozes, que sobem do interior do doméstico,
Cantam sempre, sem dúvida.
Sim, devem cantar.

Quando há festa cá fora, há festa lá dentro.
Assim tem que ser onde tudo se ajusta —
O homem à Natureza, porque a cidade é Natureza.

Que grande felicidade não ser eu!

Mas os outros não sentirão assim também?
Quais outros? Não há outros.
O que os outros sentem é uma casa com a janela fechada,
Ou, quando se abre,
É para as crianças brincarem na varanda de grades,
Entre os vasos de flores que nunca vi quais eram.
Os outros nunca sentem.

Quem sente somos nós,
Sim, todos nós,
Até eu, que neste momento já não estou sentindo nada.

Nada! Não sei...
Um nada que dói...

Álvaro de Campos, in "Poemas"

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

WILD THING

Não é um "filme de Natal"? Não é, mesmo nada. Mas tem graça esta história do banqueiro que se apaixona por uma miúda reguila. Um conto de fadas ao estilo de Nova Iorque.

Something wild (1986), de Jonathan Demme, teve bastante sucesso na época. Na verdade, a única coisa que recordo no filme é o originalíssimo genérico final. Cantado ao vivo pela jamaicana Sister Carol. Que dança quase sem se mexer. E quase só com recurso a um sensual jogo de cintura. Aqui fica este filme da semana, com um especial voto de Bom Ano para um velho amigo que me está sempre a falar de jogos de cintura. Embora ele se refira à política.

AMOR SEM SAÍDA

O João, furioso anti-comunista, fazia sempre troça das Câmaras Municipais do PC. Por questões toponímicas. Os pavilhões desportivos eram da Amizade, as ruas da Paz, os festivais da Fraternidade. Como sou amigo dele, e o João é bem mais velho, reagi sempre fleumaticamente. Até porque sempre achei que o João tinha alguma razão neste capítulo dos nomes kitsch.

No outro dia, lembrei-me dele. Andava perdido na Quinta do Conde. Encontrei a Rua da Alegria. E a da Amizade. Mais a do Sossego (!). E, claro, a da Harmonia. Bem como a poética da Saudade. Mas eu procurava, com um raio!, a Rua do Amor. Foi a mais difícil de encontrar, porque ninguém sabia onde ficava. Ao cabo de muitas voltas, lá a encontrei. É uma rua sem saída.

Ou seja, a Rua do Amor é pouco conhecida, é difícil de encontrar e não tem saída. A rapaziada da psicanálise tem nestas coisas pano para mangas.

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

CIDADES DE BEJA


Antes que acabe o ano, aqui vai um textinho sobre um projeto de que gosto bastante e que é considerado "outstanding" e "excellent", naquelas classificações que hoje fazem o gáudio onanista dos burocratas.

A escavação decorre desde 1996 ou 1997, sob a tutela da Universidade de Coimbra e sob a direção da Maria da Conceição Lopes. Ao longo dos anos, fui vendo passar por ali colegas dedicados e a quem ganhei amizade e respeito: o Ricardo, o André, o Martino, a Ana e tantos outros. A cidade de Beja ganhou um templo (cf. supra a excecional reconstituição de José Luís Madeira). Melhor dizendo, uma das cidades de Beja. As outras estão em cima, em baixo e ao lado. Esta cidade de Beja é uma oportunidade única. Para a Ciência e para a cidade em si. E mesmo que os burocratas do "outstanding" e "excellent" se ponham à frente, parte importante do esforço está em vias de se concretizar. Assim as cidades - as de hoje, as da política, do património, da sociedade civil - de Beja o queiram.

Este post é, claro está, para a Maria da Conceição Lopes. E para a persistência mantida ao longo destes mais de 15 anos.



Modelo tridimensional da estação arqueológica da cidade de Beja (Portugal), efectuado através de varrimento Laser 3D pela empresa "artscan - 3D scanning".

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

BOUTINADE

Era um casal pouco vulgar. Ele tinha trejeitos efeminados. Ela um certo toque masculino. Isso bastou para que um amigo meu, que tem tanto de inteligente quanto de viperino, comentasse (isto passou-se há uns bons anitos): "o casamento entre homossexuais não é proibido; o que é proibido é o casamento entre pessoas do mesmo sexo...".

Christine Boutin, política francesa no ativo, vem declarar que  "les homosexuels peuvent se marier, mais il faut qu'ils se marient avec une personne d'un autre sexe". O meu amigo falava a brincar, Mme. Boutin fala a sério. E isso faz alguma diferença.

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

OS FILHOS DO PADRE

Só depois daquele meu tio ter falecido soube da história. Na realidade, não era meu tio, mas sim das minhas primas. Para o caso, tanto dava.

Era um português raiano, um comerciante de andar rápido, tom ríspido e gestos de pouca paciência. Viveu em Paymogo dezenas de anos, falando sempre um castelhano pior que mau. Mas que toda a gente entendia.  Gostava de o ir esperar à saída da Plaza de San Mateo, já perto do fim da aldeia, na zona do cinema de inverno. Ao fim da tarde, ele chegava com a carrinha, vindo de Huelva, e parava, para me levar até casa, na Calle Calvo Sotelo (hoje Calle del Santo).

Há poucos anos alguém me disse "sabes que ele era filho de um padre...". Não sabia, mas a situação estava longe de ser inédita. A parte curiosa é que o padre vivia com a governanta e os filhos da governanta numa casa de uma pacata vila alentejana. Se o caso era motivo de falatório não sei. Mas os hábitos lassos do sul permitem isso e muito mais. A parte divertida da história tem a ver com a proibição, ditada pelo padre, que os petizes assistissem à missa. É que, ao vê-lo no lugar principal da igreja, todo paramentado, os miúdos não resistiam e começavam aos gritos "pai! pai! pai!" e acenavam com entusiasmo. Ainda que fossem só filhos da governanta e mesmo tendo em conta a liberalidade do sul, isso já era demais...

Não será uma grande história de Natal. Mas é verdadeira.


Vista da Calle del Santo, tirada a partir do castillo. Sobre Paymogo: http://www.paymogo.org/

PUNCH-LINE

Tout va avec, diz-se em França, quando as coisas combinam.

O caso Artur Baptista da Silva é o punch-line da crise. Carregado de títulos e de cargos (professor, alto funcinonário da ONU) prestou umas declarações sobre a crise. Alguém ouviu e disse para com os seus botões "eh, pá sim senhor e tal, aqui está um tipo que diz umas coisas acertadas". Vai daí o senhor começa a ser chamado para opinar e torna-se uma overnight sensation. Afinal era tudo - os títulos, a ONU etc. - falso. O que não quer dizer que as opiniões sejam falsas e erradas. Ou são? Ele é um burlão? E os outros, são exatamente o quê?

Artur Baptista da Silva é o Billy Ray Valentine destes tempos. What do you think, Artur Baptista da Silva?  (v. o efeito destas coisas no filme Trading places - a partir do segundo 50).


De Mário-Henrique Leiria, com um abraço de Boas Festas para Artur Baptista da Silva:

O QUE ACONTECERIA
SE O ARCEBISPO DE BEJA
FOSSE AO PORTO
E DISSESSE QUE ERA NAPOLEÃO

Toda a gente acreditava que era. O presidente da Câmara nomeava-o Comendador. Iam buscar a coluna de Nelson, tiravam o Nelson e punham o arcebispo lá em cima. E davam-lhe vinho do Porto.
Então o arcebispo dizia:
- Sou a Josefa de Óbidos.
Ainda acreditavam que era, embora menos. O presidente da Câmara apertava-lhe a mão. Iam buscar o castelo de Óbidos, tiravam os óbidos e punham o arcebispo na Torre de Menagem. Além disso, davam-lhe trouxas d’ovos.
Nessa altura, convicto, o arcebispo de Beja afirmava:
- Sou o arcebispo de Beja.
Não acreditavam. Davam-lhe imediatamente uma carga de porrada. E punham-no no olho da rua. Nu.

domingo, 23 de dezembro de 2012

COOPERATIVA AGRÍCOLA DE MOURA E BARRANCOS CRL


A Cooperativa Agrícola de Moura e Barrancos foi a derradeira entidade a ser distinguida com o prémio "Mourense do ano". No final de 2013 já não haverá Junta de Freguesia de Santo Agostinho, tal como hoje a conhecemos.

A Cooperativa, fundada em 1954, é um entidade de referência a nível local e a nível nacional. Produz azeites de reconhecida qualidade e leva longe o nome de Moura. Fiz, por isso, questão de me deslocar a Moura, na sexta à noite, para estar presente na cerimónia de entrega do prémio. Pela importância que a Cooperativa tem e por razões de ordem sentimental. A sede atual fica nas antigas instalações da Sociedade dos Azeites, na Rua das Forças Armadas. Onde vivi parte da minha infância. Até 1972, para ser preciso. O meu avô materno era o porteiro da empresa e o meu tio trabalhava no escritório, dirigido pelo sr. Batarda. Quarenta anos depois, ainda há por lá funcionários desse tempo.

Parabéns à Cooperativa Agrícola de Moura e Barrancos!

Ver: http://coopmourabarrancos.pai.pt/

sábado, 22 de dezembro de 2012

À SOMBRA DE HEFESTO


O sítio é perfeitamente adequado. A antiga oficina de um ferrador enquadra os trabalhos em ferro de Francisco Hermenegildo. O Gildo é um moço da minha idade, grande fã de carros e de motas antigas. Aliou o gosto pelo objetos ao trabalho físico nos metais. Com ferro e fogo é o título da exposição, onde há magníficas peças. Irónicas, religiosas ou politicamente marcadas, têm diferentes enfoques e motivações. É curioso não se perceber, de forma evidente, a inspiração ou a "escola" do Gildo. Era esse sentido de liberdade que Dubuffet clamava para a "arte bruta". Algo mais fácil de atingir pelo Gildo do que por ele mesmo, decerto.

Até 7 de janeiro de 2013, no Pátio dos Rolins, em Moura.

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

DIZ QUE AFINAL É LOGO À TARDE


Hoje de manhã cedo fui ao barbeiro. Pente 7, para estar apresentável. Foi então que entrou alguém e disse, despreocupadamente "parece que, afinal, ISTO só acaba logo à tarde". Há pessoas que não levam nada a sério...

Tendo em conta que pronto!, já está! e sem ter sabido a resposta a "qual é o sentido da vida?", até me permiti interromper a redação do final do capítulo 4 do livro sobre o castelo de Moura e ter estes momentos de ócio. Coisas que a gente pode fazer num dia assim. Então, até amanhã ou algo parecido a isso.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

SPORTING - SECONDO LEONARDO


Não têm conta as variações sobre o tema Última Ceia, feitas a partir do modelo criado por Leonardo da Vinci, em Santa Maria delle Grazie, em Milão. Há-as para todos os gostos e algumas, benza-as Deus, são bastante pesadas. Segundo ouvi dizer.

O Sporting acaba de publicar esta. Godinho Lopes está no lugar de Cristo. Que depois da ceia foi para o Getsemani. Pode ser que não se tenham lembrado disso... Já há alguma polémica e é de crer que, nos próximos dias, o tom suba.

A única coisa que lastimo é que não tenha sido o Benfica a ter a ideia.

Q.E.C.

Há coisas inexplicáveis. Pergunto: quem é que se terá lembrado de renomear o QREN como QEC (Quadro Estratégico Comum), designação que irá vigorar entre 2014 e 2020? Dispenso-me de explicar o porquê da pergunta. Que isto vai ser um fartote, lá isso vai.

Para o autor de tão luminosa e inspirada ideia aqui vai, com votos de Boas Festas, La lampe philosophique, de René Magritte.

TALASSOTERAPIA - 1/10

Agora que o inverno começa é outra vez tempo de falar de luz e de sol. Até 20 de março passarão por aqui 10 quadros sobre o mar. A partir da magnífica exposição, As idades do mar, que a Fundação Gulbenkian alberga, até quase ao fim de janeiro. Este The English Channel as seen from the Dorsetshire Cliffs, de John Brett, de luz vibrante, tem lá lugar de merecido destaque.


Mesmo que não conheças nem o mês nem o lugar
caminha para o mar pelo verão
(Ruy Belo)

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

OS VIZINHOS DO SENHOR ALFREDO





















O cinema tem presença regular no blogue

Neste caso não é um filme, mas é uma referência cinéfila. Este videoclip (nos anos 70 dizia-se tele-disco) dos Rolling Stones é uma citação mais que óbvia de um dos melhores Hitchcock (Janela Indiscreta, que passou por aqui em 25 de maio de 2010). Como música, não é o melhor Stones. Acho eu. Mas como ideia resulta muito bem.

Aqui fica, em homenagem a mestre Alfred, numa quarta-feira em que estou mergulhado na reta final da redação de um livro de título longo e parto difícil: Escavações arqueológicas no castelo de Moura: 1989-2012.

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

MARCO NUMÍSIO CALVÍCIO E LÚCIO NUMÍSIO ARRO


A Marco Numísio (?) Calvício, de setenta anos, a Lúcio Numísio (?) Arro, de quarenta e um anos – Emília Ânula, filha de Quinta, ao marido e ao filho; Marco Numísio (?) Máxumo, ao pai e ao irmão mandaram fazer. Rogamos, transeunte, que digas: que a terra vos seja leve!
 
Placa pertencente ao muro de uma construção medieval. Recolhida no início dos trabalhos de acompanhamento da obra do edifício de receção ao turista, no castelo de Moura. Encontra-se no Museu de Moura.

A lápide foi hoje publicada no Ficheiro Epigráfico, nº 103. Autores: José d'Encarnação, José Gonçalo Valente, Vanessa Gaspar, Maria da Conceição Lopes e Santiago Macias.

Disponível em: 

FADO


Aconteceu há uns 15 anos, em Mértola. A associação de trabalhadores da Câmara Municipal mobilizou-se para organizar um jantar, para angariação de fundos. Alguém se lembrou de um mocito de Beja que, segundo lhe tinham dito, tinha algum jeito para o fado. Da ementa do jantar passou a constar o inefável caldo verde, mais o incontornável chouriço (alguém me pode explicar porque é que raio fado rima com caldo verde e chouriço assado?). Fizeram-se doses industriais de arroz doce. Espalhou-se propaganda e passou-se a informação. E aguardou-se pela enchente. Só que... nada. Ninguém apareceu, para além dos organizadores. Nem um só cliente. O jantar ficou às moscas e não houve fados. Talvez porque o nome do moço não dissesse nada a niguém e as pessoas achassem que não valia a pena.

O que é que a história tem de "invulgar"? É o que fadista chamava-se/chama-se António Zambujo. É só isso.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

PRIMEIRAS LEITURAS: MAJOR ALVEGA

Nunca fui um grande leitor de BD. Embora goste de BD e tenha gostos heterodoxos. Os livros de cobóis nunca me tentaram. Mas nos tempos da escola primária lia as aventuras do Major Alvega e as de Luís Euripo. Em particular, as do grande aviador luso-britânico (um achado da censura, esta ideia de aportuguesamento dos nomes) entusiasmavam-me, com os seus combates quase sempre vencedores.

O meu fornecedor era o Chico, um pouco mais velho e que morava na rua de cima (a Vasco da Gama). Coisas de há 40 anos, nos tempos em que a rua de cima não tinha trânsito automóvel. Ninguém tinha carro e, mesmo que tivesse, as valas a céu aberto não permitiriam a passagem. Hoje há quem quase negue que o bairro era assim...

Perdi o contacto do Chico há muitos anos. Mas agradeço-lhe sempre, mesmo sem ele saber, o empréstimo dos livros do Major Alvega.

Imagem original em:
http://fmpsinogau.blogspot.pt/2008/08/blog-post_24.html

domingo, 16 de dezembro de 2012

AFINAL, NÃO FOI UM ACASO...

Podia ter sido um mau momento. Um arroubo de entusiasmo ante as câmaras da tv. Não foi. Aquilo é programático. Está nos genes de Isabel Jonet. Agora, em entrevista ao i veio dizer que "na acepção de São Paulo, caridade é amor, é espírito de serviço, é o outro precisar de nós sem que nós precisemos do outro e portanto levamos o que ele precisa e não o que nós queremos levar. A solidariedade é algo mais frio que incumbe ao Estado e que não tem que ver com amor, mas sim com direito adquiridos."

A explicação de Isabel Jonet é de uma meridiana clareza. E entende-se, com toda a clareza, que os únicos direitos adquiridos são os da sua classe social. Leiam-se os pertinentes comentários de José Pacheco Pereira e de João Cardoso Rosas. O único comentário às avessas veio de Vasco Pulido Valente, que é, sempre, do contra.

Declaração de interesses: contribuimos para o Banco Alimentar contra a Fome.  Só não damos para os peditórios ideológicos de Isabel Jonet.
 
  

A parábola do fariseu, num mosaico da basílica de Santo Apolinário, o Novo (Ravena) - início do século VI

LOUIS VUITTON? C'EST TOUT PRÈS DE MOURA



As moças não têm grande graça, com aquele ar escanzelado e em linha reta (deve ser para fazerem pendant com o fundo). Mas a anúncio é genial, com um toque mondrianesco. Set design by Daniel Buren and shot by Steven Meisel, lê-se na net. Tem as cores da bandeira de um dos meus municípios (Moura). Um toque de classe com ideias e coisas simples.

O SUAVE MILAGRE

O Miguel Gomes Martins é um excelente medievista, de quem sou amigo e de quem fui quase-colega, no Liceu Nacional de Queluz. O Miguel é um pouco mais novo e fazia parte da mesma turma da minha irmã. Tinha um particular talento para a ilustração, o que fazia com que toda a gente lhe cravasse desenhos para os trabalhos. Tinha também um afinado sentido de humor, o que o tornava especialmente popular.

O sentido de humor não teve alterações. Ontem, brindou-nos com esta fotografia no facebook.  Fotografou o écran do televisor, durante um telejornal, e comentou: "Testemunhei um milagre!!! MARX e LENINE ressuscitaram e estiveram presentes na manifestação de hoje da CGTP!!!". As minhas L4 e L5 passaram um mau bocado à conta disso.


O suave milagre é um conto de Eça de Queirós. Não tem assim muito a ver com a manif da CGTP, mas soa bem.

A CAÇA E A PESCA E O FUTURO EM SANTO ALEIXO

Temina hoje, em Santo Aleixo (Moura), a 2ª Feira de Caça e Pesca da Tomina, uma organização da Comissão de Festas local. O mérito e a coragem em levar a cabo uma iniciativa destas é enorme. Mas o facto que mais me chamou a atenção foi o sacrifício pessoal que a feira comporta. Estive, na sexta-feira, à conversa com um dos organizadores. É polícia e presta serviço na Venda Nova (Amadora). Apontou outro colega: "aquele ali chegou mesmo agora; trabalha no Algarve".

Há cada vez menos gente no interior. A que está, é de um escalão etário cada vez mais avançado. Reformas da administração local como a que estão em curso só virão piorar este estado de coisas. Miguel Relvas e Paulo Júlio, que acham que estão a fazer algo de genial, bem podem cantar, em coro, aquilo que Johnny Rotten, dos Sex Pistols, berrava em No feelings, há uns anitos: You better understand / I'm in love with myself / Myself, my beautiful self / A no feelings / A no feelings / A no feelings / For anybody else.

 

sábado, 15 de dezembro de 2012

ARTE ISLÂMICA - 8/10


Não é uma peça nem está num só sítio. Nem sequer é, por si só um estilo. Mas é um modo de fazer associado a um tipo de decoração inconfundível. Refiro-me aos izniks. Ou, melhor dizendo às produções feitas na cidade turca de Iznik. As raízes destas cerâmicas estão lá longe, na China. As cores e os motivos que se nos apresentam são verdadeiros reflexos do Paraíso. As plantas estão carregadas de simbolismo e cada uma delas tem um significado preciso. Podemos até não o saber, mas o feérico jogo de cores não nos deixa indiferentes.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

MARIA, MÃE DE MEILO


A ara não estava no sítio de origem. Devia, aliás, estar muito longe do sítio de origem. Foi reutilizada na esquina de uma rua do período almóada. A qual só foi identificada, quase por acaso, no castelo de Moura, durante os trabalhos de acompanhamento dirigidos pelo José Gonçalo. E mais tarde também pela Vanessa Gaspar e pelo autor do blogue. Um ano depois foi retirada do local (a ara, bem entendido, não a rua), tendo recolhido às instalações do Museu Municipal.

Prepara-se neste momento a publicação. O estudo e a leitura da peça estão a ser dirigidos por José d'Encarnação (who else?). O que se pode avançar? Que a peça é da segunda metade do séc. I e que foi dedicada por um liberto, Meilo, à memória de sua mãe, Maria. Gente da nossa cidade. De há quase 2000 anos.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

PALESTINA: ROMPENDO MUROS


Texto da proposta que ontem apresentei na reunião ordinária da Câmara Municipal de Moura e que foi aprovada por unanimidade:

A recente integração da Palestina como 194º Estado não-membro da Assembleia-Geral das Nações Unidas veio abrir novas perspetivas para a resolução de um problema que se arrasta há décadas.
O voto positivo do Estado Português foi, nesse sentido, um contributo positivo e que não pode deixar de ser saudado. E que deverá agora ser acompanhado de medidas concretas de apoio ao povo palestiniano. Propõe-se nesse sentido, que a Câmara Municipal de Moura apresente formalmente junto da Associação Nacional de Municípios Portugueses uma proposta tendo em vista a criação de um programa de fomento de geminações entre municípios de Portugal e da Palestina. Independentemente de iniciativas isoladas já existentes, este programa poderá concertar ações e dar um sentido mais objetivo aos mais diversos domínios de cooperação.


Trata-se agora de dar seguimento à ideia. E passar das palavras aos atos. É mais fácil dizê-lo que fazê-lo mas nem sequer tentar é uma vergonha.

Fotografia - Larry Towell

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

O NATAL AO VIRAR DA ESQUINA


É uma árvore de plástico, mas é toda catita. Recicla embalagens, tem cor e luzes e tudo. O nome oficial é "árvore da partilha", porque é um trabalho partilhado. É liderada pela Divisão de Ação Social, Saúde e Educação da Câmara, envolve trabalhadores da autarquia, o INOVINTER, as escolas do pré-escolar e do 1º ciclo de Moura, o Ensino Especial, a APPACDM e a Universidade Sénior. E é melhor que a fotografia.

Está instalada num largo que tem um nome oficial (Gen. Humberto Delgado), mas que só é conhecido pelo nome de uma casa comercial há muitas décadas ali instalada. Bom, também tem outra designação popular, mas essa não se pode dizer aqui.

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

ROOTS


Antes e depois. O "antes" e o "depois" estão separados por 153 anos. Sem comentários e apenas com uma pergunta: será coincidência?


O NOVO MACHADO DE CASTRO

Entre o velho e o novo. Abre hoje ao público o renovado Museu Nacional de Machado de Castro. Um museu excecional, com uma implantação única. Está em pleno coração da medina coimbrã, firmando-se num criptopórtico romano (são dois, na realidade). As obras custaram mais de 15 milhões de euros e compreendem novas estruturas, num cúbico e impositivo desenho de Gonçalo Byrne. Seis anos depois do início da intervenção aí está o renovado Museu Nacional de Machado de Castro.

Visitei este museu, pela primeira vez, há muitos anos. Talvez numa das visitas do 2º ano de História da Arte. Passei por lá, no outro dia, muito rapidamente e ainda com o edifício a ser ultimado. Não me livrei a um remoque da minha amiga Ana Alcoforado: "vens sempre a Coimbra a correr, nem tens tempo para tomar um café". OK, na próxima ida a Coimbra irei ao Machado de Castro. Para uma visita com tempo, e café incluído.

Site: www.mnmachadodecastro.imc-ip.pt

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

TITO



Se all'impero, amici Dei, 
Necessario e un cor severo; 
O togliete a me l'impero, 
O a me date un altro cor.
 
Tito oscila entre o Poder e a Amizade, e sobre a necessidade de sacrificar o primeiro à segunda.  Uma situação clássica na vida, que o libretto de Caterino Mazzolà trata de forma indulgente. O título da ópera em um anti-clímax, porque sabemos à partida o que se vai passar. A especulação sobre a morte de Tito lança dúvidas sobre a justeza de tanta clemência.

La clemenza di Tito, vista em direto a partir do Met, veio mesmo a calhar. Uma opera seria que, às vezes, tem um toque pouco sério. Como tantas coisas na vida.

Giuseppe Filianoti é Tito.

domingo, 9 de dezembro de 2012

AMARELEJA - ALFROCHEIRO


Prière du Bordelais

Mon Dieu...
Donnez moi la santé pour longtemps
De l'amour de temps en temps
Du boulot, pas trop souvent
Mais du bordeaux tout les temps.

A prece não merece o meu acordo, já que há coisas que não podem ser só de tempos a tempos. E, ao que dizem, a grande zona de vinhos é a Borgonha. Oito dos dez vinhos mais caros do mundo são dessa região. No topo está o Henri Jayer Richebourg Grand Cru, cujo preço médio por garrafinha é de 11.135 euros (sim, isso mesmo, onze mil cento e trinta e cinco euros). Ou seja, fica-se assim como Dionysos, a tentar chegar ao cacho de uvas que Hermes tinha na mão.

A Feira da Vinha e do Vinho da Amareleja chega hoje ao fim. Os produtores estavam satisfeitos com os resultados, em termos comerciais. Ora ainda bem. Em 2013 cá/lá estaremos de novo.

Não sei quem é o autor da "oração". Quanto à estátua, que pertence ao Museu Arqueológico de Olímpia, é atribuída a Praxíteles. Mas também não há disso a certeza.


sábado, 8 de dezembro de 2012

QUATRO ANOS MAIS TARDE


E vão quatro anos de blogue. Vamos a contas.


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21 - América
3 - Oceânia

AMARELEJA - MORETO


Vendanges

Les choses qui chantent dans la tête
Alors que la mémoire est absente,
Ecoutez, c’est notre sang qui chante…
O musique lointaine et discrète !

Ecoutez ! c’est notre sang qui pleure
Alors que notre âme s’est enfuie,
D’une voix jusqu’alors inouïe
Et qui va se taire tout à l’heure.

Frère du sang de la vigne rose,
Frère du vin de la veine noire,
O vin, ô sang, c’est l’apothéose !

Chantez, pleurez ! Chassez la mémoire
Et chassez l’âme, et jusqu’aux ténèbres
Magnétisez nos pauvres vertèbres.

Paul Verlaine, Jadis et naguère


Vindimas? Ainda não, que diabo... Ainda agora acabaram... Mas o dia de hoje foi uma boa colheita, com uma (mais ou menos moderada) Rota das Tabernas e com os Grupos Corais da Casa do Povo. Amareleja dentro, a compasso certo. Com quatro parentes, que marcam presença naqueles grupos. Paul Verlaine, que não foi um exemplo de moderação, teria gostado de um passeio assim. Caravaggio, idem, também. Deve ser por isso que gosto de Verlaine e de Caravaggio.

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

AMARELEJA - PERRUM



Le vin perdu

J'ai, quelque jour, dans l'Océan,
(mais je ne sais plus sous quels cieux),
Jeté, comme offrande au néant,
Tout un peu de vin précieux...

Qui voulut ta perte ô liqueur ?
J'obéis peut-être au devin ?
Peut-être au souci de mon coeur,
Songeant au sang, versant le vin.

Sa transparence accoutumée
Après une rose fumée
Reprit aussi pure la mer...

Perdu ce vin, ivres les ondes !...
J'ai vu bondir dans l'air amer
Les figures les plus profondes...


A Feira arranca logo mais, lá para o fim da tarde. Logo mais não haverá grande espaço para Paul Valéry, mas a imagem que Martin Parr nos dá deve ser muitas vezes repetida.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

PAPINIANO CARLOS (1918-2012)

La pluie - Van Gogh (Philadelphia Museum of Art)

Eu sou
a menina
Gotinha de Água,
gotinha azul
do Mar
que foi
nuvem
no ar,
chuva
abençoada,
fonte
a cantar,
ribeiro
a saltar,
rio
a correr,
e que volta
à sua casa
no Mar
onde vai
descansar,
dormir
e sonhar
antes que
de novo
torne a ser
nuvem no ar,
chuva
abençoada,
fonte
a brotar,
ribeiro
a saltar,
rio
a correr
e Mar
uma vez mais.

Repete-se apenas o final do célebre texto A menina gotinha de água, de Papiniano Carlos (v. texto completo aqui). Partiu ontem, num dia de chuva, assim como o de Van Gogh, deixando atrás de si um importante legado literário. E, uma vez mais, fala-se de alguém com um percurso solidário e politicamente coerente. A menina gotinha de água foi um dos mais belos textos que li na infância. Talvez em 1972, na 3ª classe. O ritmo saltitante das palavras, a simplicidade e a música do texto fizeram com que nunca mais o esquecesse. Bom, admito que esse foi um motivo. O outro foi que gostei tanto do livro que retive a sua devolução à Profª. Jacinta, acabando por o perder. Falta que me foi relevada, mas que me tirou o sono um par de noites...