O desenho feito por Nicolau de
Langres em 1657 é a mais antiga planta de Moura que se conhece. A configuração
e o traçado das ruas que mostra corresponde, em grande parte, ao que hoje
conhecemos, excluindo os bairros, muito mais recentes, da Salúquia e do Sete e
Meio.
A Praça Sacadura Cabral,
por exemplo, apresenta um desenho que é idêntico ao que hoje podemos ver. Na
verdade, a nossa “praça” não é bem uma praça, mas antes um vasto terreiro, que
circunda a sul o castelo, acompanhando o traçado das muralhas. Para que não
restem dúvidas, estas localizavam-se onde estão os edifícios do mercado
municipal, da Câmara e da biblioteca.
A linha recortada da
praça, ou a pouca regularidade da sua planta, sempre me pareceu pouco lógica.
Ou, pelo menos, sem uma explicação evidente. A leitura recente do segundo
volume do Tombo da Vila de Moura veio lançar luz sobre um aspeto pouco
conhecido do urbanismo da nossa terra. O documento, de 1575, é claro: “a praça
da vila era tão estreita que parecia mais rua que praça”. Decidiu-se então que
deveria ser alargada. Os métodos eram expeditos. Compraram-se casas para serem
demolidas, estabelecendo-se um limite de 300.000 réis (1,5 €, na moeda dos
nossos dias) para tais aquisições. Seriam nomeados dois avaliadores “sem
sospeita”, sendo um deles designado pelos proprietários. Um terceiro faria o
desempate, caso fosse necessário. A engenharia financeira era pouco complexa.
As verbas viriam da renda de um baldio do concelho e de 50.000 réis que o
Convento do Carmo desembolsara para compra de um terreno municipal.
Determinava-se ainda que, quando a obra de alargamento estivesse terminada, “se
mude pera ella a feira da ditta vila”.
Voltemos então à
configuração da praça. Os documentos escritos são escassos, mas a malha urbana
conta-nos, por vezes, a história dos sítios. As zonas mais espaçosas em frente
à Câmara e ao Mercado devem ter correspondido às áreas demolidas. Ou seja, o
quarteirão que termina nas esquinas das ruas Miguel Bombarda (outrora do
Morgadinho) e Conselheiro Augusto de Castro (que já foi das Tendas) devia
prolongar-se mais alguns metros, conforme se propõe na planta em anexo. De
igual modo, deveria existir outro quarteirão na zona em frente dos Paços do
Concelho. A falta de simetria que hoje constatamos aparece-nos, assim,
corrigida, nesta hipótese de trabalho. O desenho é uma aproximação, sem
possibilidade de verificação concreta. Algum dia a faremos? Talvez, embora me
pareça pouco provável que os fundos documentais nos possam adiantar muito mais
ou clarificar as zonas de penumbra. O futuro o dirá.
Nota: Tive a colaboração neste trabalho dos colegas Rafael Reis e Sérgio
Delgado, que redesenharam a praça e a quem agradeço. Agradeço também ao André
Linhas Roxas que, sugestivamente, comentou a minha proposta “tá muito bonito;
parece a mascarilha do Lone Ranger”.
Esta (re)leitura do urbanismo de Moura foi publicada no jornal "A Planície" de dia 1 de novembro de 2012.