quinta-feira, 30 de novembro de 2017

OUTRO FILHO DESCONHECIDO

A situação não é inédita. Em fevereiro de 2016 já me acontecera uma coisa assim (v. aqui). Desta vez, a surpresa foi diferente. Tinham-me pedido este texto, mas não me recordava de o ter enviado. Muito menos sabia que tinha sido publicado. A obra, com financiamento comunitário, nunca me chegou às mãos. Ao percorrer, ontem, os catálogos da Biblioteca Nacional dou com o título do texto. Surpresa! Peço a obra. Pois é, lá estava o trabalho sobre Moura e Serpa entre a Antiguidade Tardia e a Islamização. Limitei-me a tirar a nota bibliográfica, para acrescentar ao currículo. Voltei a solicitá-lo hoje, para o retrato. Tempus fugit, e só deu para isso, no meio de outras consultas, destinadas a concluir um livro, que iniciei há 20 (vinte, isso) anos...

quarta-feira, 29 de novembro de 2017

SOUALA


Ici venu, l'avenir est paresse.
L'insecte net gratte la sècheresse;
tout est brûlé, reçu dans l'air
a je ne sais quelle sévère essence...
La vie est vaste, étant ivre d'absence,
et l'amertume est douce, et l'esprit clair.


De Le cimetière marin, de Paul Valery

A fotografia foi feita no final da primavera de 2002. Dia 13 ou 14 de junho. Sei da data porque íamos a caminho de Beja, na Tunísia. Parámos num sítio no meio do nada. Havia uma placa. Tenho a certeza de ter lido SOUALA.

Fotografámos este bonito sítio. Um pequeno cemitério, numa suava elevação, com três palmeiras. O que é curioso é não consigo encontrar qualquer referência ao local... Souala "sumiu-se". Espero lá voltar, um dia. Porque o sítio existe. Assim me parece.

terça-feira, 28 de novembro de 2017

RONDA NOTURNA

As traseiras, como em Rear window, mas mais pacíficas. A Amadora à noite. Silêncio total e uma ou duas luzes. E Drummond de Andrade.

Repeti a fotografia com a M6. Rolo de 400 ASA, abertura de 2.0, exposição 1:15. Deve ficar bonita, deve... A minha amiga Paula Campos não vai achar graça quando lhe pedir uma ampliação.


PASSAGEM DA NOITE

É noite. Sinto que é noite 
não porque a sombra descesse
(bem me importa a face negra)
mas porque dentro de mim,
no fundo de mim, o grito
se calou, fez-se desânimo.
Sinto que nós somos noite,
que palpitamos no escuro
e em noite nos dissolvemos.
Sinto que é noite no vento,
noite nas águas, na pedra.
E que adianta uma lâmpada?
E que adianta uma voz?
É noite no meu amigo.
É noite no submarino.
É noite na roça grande.
É noite, não é morte, é noite
de sono espesso e sem praia.
Não é dor, nem paz, é noite,
é perfeitamente a noite.
 
Mas salve, olhar de alegria!
E salve, dia que surge!
Os corpos saltam do sono,
o mundo se recompõe.
Que gozo na bicicleta!
Existir: seja como for.
A fraterna entrega do pão.
Amar: mesmo nas canções.
De novo andar: as distâncias,
as cores, posse das ruas.
Tudo que à noite perdemos
se nos confia outra vez.
Obrigado, coisas fiéis!
Saber que ainda há florestas,
sinos, palavras; que a terra
prossegue seu giro, e o tempo
não murchou; não nos diluímos.
Chupar o gosto do dia!
Clara manhã, obrigado,
o essencial é viver!

segunda-feira, 27 de novembro de 2017

DEN HAAG MOURENSE

Mientras que yo te beso, su rumor
nos da el árbol que mece al sol el oro 
que el sol le da al huir, fugaz tesoro 
del árbol que es el árbol de mi amor. 

No es fulgor, no es ardor y no es altor 
lo que me da de tí lo que te adoro, 
con la luz que se va; es el oro, el oro, 
es el oro hecho sombra: tu color. 

El color de tu alma; pues tus ojos 
se van haciendo ella, y a medida 
que el sol cambia sus oros por sus rojos 
y tú te quedas pálida y fundida, 
sale el oro hecho tú de tus dos ojos 
que son mi paz, mi fe, mi sol: ¡mi vida! 



Há tantos anos que queria ver o Gemeentemuseum, mas tantos mesmo. Por isso mesmo, achei (ainda mais) graça a uma das várias exposições temporárias (todas de alta qualidade). Neste caso, a que se dedicou à obra de Frans Hoogendoorn. Uma arte colorida, com um modelo dedicado à minha Moura. Ele não sabia disso, mas é o que menos interessa.
E Juan Ramón Jiménez não sabia, mas aquele poema também o escreveu para Moura.

domingo, 26 de novembro de 2017

TARDE PARA OCIOSIDADES

E por falar em vermelho, lembrei-me da Ferrari...

Com uma quase certeza: os pilotos italianos estão para a Fórmula Um como os tenistas franceses estão para o Grand Slam. Não vão lá de maneira nenhuma.

Último piloto italiano a vencer o Campeonato de Fórmula Um - Alberto Ascari, em 1953. Era primeiro-ministro Mario Scelba (quem???).

Último tenista francês a vencer um torneio do Grand Slam - Yannick Noah, em 1983. Era primeiro-ministro Pierre Mauroy (quem???).

COMUNISMO NEERLANDÊS


Montemor-o-Novo

Borba

Acaba de sair o livro "Red utopia", de Jan Banning. O autor já andou aqui pelo blogue, por causa do seu trabalho sobre as burocracias no mundo. Esteve em Portugal há mais de 30 anos, fotografando os restos da Reforma Agrária e registando um País que, hoje, já não existe. Voltou há pouco tempo, para registar o que ficou da utopia. Ou, melhor dizendo, de várias utopias. Aparentemente, mas só aparentemente, Jan Banning não toma partido. O ceticismo, ainda que seja um ceticismo respeitoso, espalha-se pelas páginas do livro. "Red utopia" está em exibição em Zwolle. Estará, no próximo ano, em Mannheim. Um comunismo só para o norte, portanto.
Do site do fotógrafo:
Since the fall of the Berlin Wall and the collapse of the Soviet Union, Communism seems like a thing of the past: relegated to the dustbin of history. But photographer Jan Banning’s Red Utopia looks at various corners of the world, where the ideology that so determined the course of the twentieth century is still alive and kicking.
Jan Banning set off in search of locations in five countries (India, Italy, Nepal, Portugal and Russia) where the ghost of Communism still walks abroad and sometimes even dominates local mind-sets. In cities, towns and villages, he recorded the interiors of Communist Party offices with their often exuberant iconography: red flags and banners, portraits of Marx, Engels, Lenin, Stalin and Mao, and pictures of national party leaders and ideologues. He has also photographed local party activists, staring solemnly into the lens from behind their desks.
Ver- http://www.janbanning.com

sábado, 25 de novembro de 2017

FALHOU TUDO

Não sou, decerto, nada original. O grande tema de hoje são as cheias da noite de 25 para 26 de novembro de 1967. Recordo as reportagens da RTP, vistas na casa de um vizinho, por entre os comentários desalentados dos mais velhos.

Por entre a censura, escapavam-se números (400, 500, 700 mortos, nunca se chegará a saber o número preciso).

Falhou tudo.

A Proteção Civil.
As comunicações.
A capacidade de resposta das autoridades.
O planeamento, que não houve e que só veio agravar a noite de chuva imprevista e furiosa. Casas e barracas construídas em leitos de cheia foram levadas pelo mar de lama.

Gonçalo Ribeiro Telles explicou porque é que o improviso lusitano tudo agravara. Deixou indicações sábias e oportunas. Ninguém lhe passou cartão. No início dos anos 80 a cena repetiu-se, com consequências felizmente muito menos graves.

Em 2017, o fogo choveu em Portugal. Falhou tudo.

A Proteção Civil.
As comunicações.
A capacidade de resposta das autoridades.
O planeamento, que não houve e que só veio agravar a seca prolongada. Casas construídas no meio da floresta foram levadas pelo mar de fogo.

Portugal mudou muito em 50 anos? Mudou muito e para muito melhor. Onde continuamos a falhar? Na (in)capacidade de organizar as coisas essenciais, na visão de longo prazo, na falta de vontade ou de coragem em resistir aos "jeitinhos", aos "favorzinhos", às "coisas pequeninas" que é preciso ir resolvendo.

As coisas não acontecem por acaso. Continuaremos assim, porque assim somos. Entre muitas coisas positivas teve esta coisa terrível do improviso e da falta de capacidade de séria organização.




ONDAS DO MAR DE SCHEVENINGEN

A jovem amiga a quem sugeri uma ida à praia olhou para mim como se eu precisasse de ser internado com urgência. Faz frio e chicoteia-nos o vento do norte. Fomos e foi agradável a tarde fria com uma luz mais limpa do que imaginaria. O azul trasnlúcido das telas de Salomon van Ruysdael (1602-1670) e de Willem van de Velde (1611-1693) apareceu inteiro, à minha frente. Há ondas. Lembro-me do poema de Martim Codax, mas prefiro usar outro, de Ricardo Reis.


Uma Após Uma as Ondas Apressadas

Uma Após Uma 
Uma após uma as ondas apressadas 
Enrolam o seu verde movimento 
E chiam a alva 'spuma 
No moreno das praias. 

Uma após uma as nuvens vagarosas 
Rasgam o seu redondo movimento 
E o sol aquece o 'spaço 
Do ar entre as nuvens 'scassas. 

Indiferente a mim e eu a ela, 
A natureza deste dia calmo 
Furta pouco ao meu senso 
De se esvair o tempo. 

Só uma vaga pena inconsequente 
Pára um momento à porta da minha alma 
E após fitar-me um pouco 
Passa, a sorrir de nada. 

ÁGUA NOSSA

As páginas 2 a 4 do "Público" sobre as roturas e os consumos não cobrados nas redes municipais sublinharam algumas convicções que fui sedimentando ao longo dos últimos anos:

* Continuar a dizer-se que a recuperação das redes pode ser feita com o contributo das tarifas ou do seu aumento não faz sentido (ou, então, quem diz estas coisas vive num País que não é o nosso);

* A situação em muitas redes em baixa é má e vai piorar;

* Os Municípios não têm capacidade financeira para fazer face a problemas desta magnitude recorrendo apenas ao seu orçamento;

* A descapitalização, financeira e humana, a que o texto alude, vai aumentar.

Daqui por uns meses poderemos também confrontar as promessas que muitos fizeram ao longo de 2017 com a realidade das coisas. Em especial neste setor, onde se dizia que tudo era fácil...

Punch-line e cito do "Público" de ontem: nem é o número de pessoas a contratar que pode constituir um obstáculo, na sua opinião [Orlando Borges, presidente da ERSAR], dando exemplos como o da câmara que responde a essa necessidade "com apenas dois trabalhadores qualificados". Fico, sinceramente, com curiosidade em saber onde é esse milagre.

sexta-feira, 24 de novembro de 2017

O PÁTIO DOS ROLINS NO RIJKSMUSEUM



Quem fazia mosaicos hidráulicos assim às cores era o sr. Reganha. Ia muitas vezes espreitar a fabriqueta dele. Gostava de ver os mosaico tomarem forma. Não terá sido tanto isso a despertar, muitos anos mais tarde, o meu interesse pelas pinturas de Vermeer. Mas alguma coisa deve ter ficado... Pelo menos, alguma curiosidade pela construção pictórica dos interiores.

Vermeer, tal como Pieter de Hooch (1629–1684), interessaram-se justamente pelos jogos de luz nos interiores. É deste último a Mulher com criança numa despensa, que terá sido pintado em 1658. Podia ser o Pátio dos Rolins a ter sido retratado e a estar hoje no Rijksmuseum, em Amesterdão.

O Rijksmuseum é uma excecional pinacoteca. Ver - https://www.rijksmuseum.nl/

TORRE DO RELÓGIO - O ARRANQUE

Arrancou a obra de reabilitação da Torre do Relógio, em Amareleja. É daquelas notícias que me deixa verdadeiramente feliz. Foi uma intervenção pela qual muito se batalhou. O projeto foi terminado, a obra tem um financiamento comunitário de 85% e o caminho é em frente.

Oxalá as coisas corram bem, em termos de execução. Muitas vezes, há coisas que escapam ao dono da obra. O Pavilhão das Cancelinhas correu bem. Fico a torcer que aqui aconteça o mesmo. Tenho pressa em ir à inauguração.

quinta-feira, 23 de novembro de 2017

33

Quantos instrumentos legais são necessários para rever um plano de urbanização? Lancei a pergunta a uma amiga que, timidamente, arriscou "cinco?". Ri desalmadamente. São 33, incluindo um "projeto". Isso, 33 como na farinha.

A saber:
Carta de Zonas Inundáveis.
Plano Nacional de Política de Ordenamento do Território.
Plano Sectorial Rede Natura 2000.
Regime Jurídico da Reserva Agrícola Nacional.
Regime Jurídico da Reserva Ecológica Nacional.
Regime Florestal.
Regime Jurídico da Urbanização e Edificação.
Regime Jurídico de Empreendimentos de Turismo de Natureza.
Regime Jurídico de Parques e Depósitos de Sucata.
Regime Jurídico do Domínio Hídrico.
Regime Jurídico do Ordenamento do Território, Urbanismo e Instrumentos
de Gestão Territorial.

Regime Jurídico do Saneamento Básico.
Regime Jurídico dos Centros Radioelétricos .
Regime Jurídico dos Marcos Geodésicos.
Regime Jurídico dos Procedimentos de Avaliação de Impacto na
Segurança Rodoviária.
Regulamento de Licenças para Instalações Elétricas.
Reserva Florestal de Recreio.
Lei de Bases da Política Pública de Solos, de Ordenamento do Território
e de Urbanismo.
Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (RJIGT).
Estatuto das Estradas da Rede Rodoviária Nacional (EERRN).
Regulamento Técnico de Segurança contra Incêndio em Edifícios
(SCIE).
Plano Municipal de Defesa da Floresta Contra Incêndios (PMDFCI).
Plano Regional de Ordenamento Florestal do Baixo Alentejo.
Plano Regional do Ordenamento do Território do Alentejo.
Regime Jurídico dos Planos de Ordenamento, Gestão e de Intervenção
de Âmbito Florestal.

Plano Regional de Ordenamento Florestal do
Baixo Alentejo (PROFBA).
Plano de Bacia Hidrográfica do Guadiana.
Plano de Ordenamento do Parque Natural do Vale do Guadiana.
Regime das Zonas de Proteção e Elaboração do Plano de Pormenor
de Salvaguarda do Património Imóvel.
Plano de Salvaguarda e Valorização do Centro Histórico.

Plano Diretor Municipal.
Projeto de Mobilidade Sustentável.

Plano de Gestão da Região Hidrográfica do Guadiana.


Não posso deixar de nutrir um certo carinho por coisas como o Regime Jurídico dos Marcos Geodésicos. Tal como olho com ternura o prazer onanista com que alguns técnicos apresentam esquemas e fluxogramas. Depois pouco ou nada se faz de objetivo, de concreto e de prático.

Isto passa-se no País da simplificação e do simplex, da desburocratização e do "não vale a pena complicar". Um tal de Sebastião José de Carvalho e Melo deve dar estar a rir-se, algures...

quarta-feira, 22 de novembro de 2017

BALBÚRDIA NO OESTE - CENA FINAL

A cena estava a começar. Parecia tudo correr bem. A coreografia estava mais ou menos ensaiada. Nesse momento, entram os cóbóis. Instala-se a confusão. Adeus, musical. Adeus, coreografia. Adeus, organização.

É a cena final do genial "Balbúrdia no oeste", de Mel Brooks. Ao melhor estilo slapstick. Sem regras, nem rei nem roque. O único resultado garantido é a gargalhada. "Balbúrdia no oeste" é a escolha cinéfila da semana. 


AMIGO

No livro O cinema contemporâneo, decisivo nos meus tempos de juventude, Penelope Houston tem uma série de tiradas argutas e notáveis. Uma delas é sobre os filmes de François Truffaut. Diz algo como "Truffaut, tal como Renoir, seu reputado mestre, faz filmes sobre a amizade" (cito de memória). O livro é, salvo erro, de 1963. Renoir sempre me pareceu ser mais lírico que Truffaut. O qual, indiscutivelmente, fez filmes sobre a amizade e a proximidade entre as pessoas.

Nenhum outro sentimento me toca tanto como esse. O telefonema de há pouco, com um amigo de há 40 anos, confirmou-o. Há amizades provavelmente eternas. Outras são circunstanciais. 


Dois amigos na Mina de S. Domingos há quase 20 anos.
Ele trabalha na Câmara de Mértola. Ela também.

Amigo


Mal nos conhecemos
Inaugurámos a palavra «amigo».

«Amigo» é um sorriso
De boca em boca,
Um olhar bem limpo,
Uma casa, mesmo modesta, que se oferece,
Um coração pronto a pulsar
Na nossa mão!

«Amigo» (recordam-se, vocês aí,
Escrupulosos detritos?)
«Amigo» é o contrário de inimigo!

«Amigo» é o erro corrigido,
Não o erro perseguido, explorado,
É a verdade partilhada, praticada.

«Amigo» é a solidão derrotada!

«Amigo» é uma grande tarefa,
Um trabalho sem fim,
Um espaço útil, um tempo fértil,
«Amigo» vai ser, é já uma grande festa!

Alexandre O'Neill

terça-feira, 21 de novembro de 2017

TORRE INVISÍVEL

A torre do rio, em Mértola, teve em tempos, um projeto de valorização, que passava pela instalação de pontos de luz que permitisse iluminar a toda estrutura. A torre do rio é uma construção do século V ou do século VI e que se destinava a controlar a entrada na vila.

Razões de ordem técnica acabaram por inviabilizar o projeto. Estive, contudo, presente, na noite em que fizeram os testes de luz. Acabei por fotografar este cenário operático em condições que não se voltaram a repetir. Esta torre tornou-se, por assim dizer, invisível.


HINO A APOLO



Deus do áureo arco, auriarqueiro,
Com áureos cachos e áurea lira,
Senhor das Musas no áureo outeiro,
Das áureas chamas na áurea pira,
Cavaleiro
Do ano inteiro,
Onde dormia a tua ira
Quando tolo abusei da minha sorte
Vestindo-me na glória
Da láurea de tua história
Ou mereci o descaso até da morte?
Ó Délfico Apolo!

Troava o troante, troava,
Fremia o troante, fremia,
O dorso da águia se encrespava,
Calado em fúria – e mal se via
O trovão
Vindo ao chão,
Retido pela melodia.
Por que poupaste semelhante verme,
Tocando um alaúde
Até a quietude?
Por que não me esmagaste, um reles germe?
Ó Délfico Apolo!

As plêiades, vígeis no polo,
Ouviam a muda monção.
Sementes, raízes no solo
Cresciam no ardor de verão.
O oceano em
Velho plano
Labutava quando quem não
Ousou cingir, herege, em torno à fronte
Teu louro, insanamente,
Achando-se imponente,
E agora vem curvar-se a ti defronte?
Ó Délfico Apolo!

John Keats (1795-1821)

Preferi usar esta tradução, de um professor de literatura (Leonardo Antuness), ao original, que não é de leitura fácil.  Traduttore, traditore? Talvez, mas esta solução pareceu-me preferível. O poema é muito melhor que a fotografia, em todo o caso. Fui recuperá-la em mais um CD esquecido... A arqueologia da vida recente prossegue.

Estátuas no Pergamonmuseum, em Berlim. A fotografia deve datar de 2004.

segunda-feira, 20 de novembro de 2017

2013/2016: DIMINUIÇÃO DO DESEMPREGO NO CONCELHO DE MOURA

Os dados são de um estudo do Observatório Nacional de Administração Pública do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas.

E que dizem?

Duas coisas importantes:

O concelho de Moura foi o 8º de todo o interior do País onde o desemprego mais diminuiu.

O concelho de Moura foi o 2º do Alentejo onde o desemprego mais diminuiu.

A que anos se reportam os dados? Aos de 2013/2016. Há uma responsabilidade direta da ação do Município na diminuição do desemprego? Direi que há responsabilidade do Município nessa matéria. Não há investimento com uma Câmara Municipal inimiga dos investidores. Esse foi um dos maiores embustes que se lançou para o ar em relação ao mandato autárquico pelo qual fui o principal responsável. E que, parcialmente pegou...

Não vou tecer considerandos sobre o mandato passado. Isso fica para daqui a uns tempos.

Deixo aqui o link para o estudo:

http://capp.iscsp.ulisboa.pt/images/stories/ONAP/ONAP_Relatorio_Emprego_2013-16-v2.pdf

QUANDO O ARDILA SECOU

Estas espantosas imagens datam de 9 de outubro de 2005. Havia eleições autárquicas nesse dia e eu tinha a firme a convicção que iriamos perder por causa da falta de água. O Ardila secara. Secara à maneira dos rios norte-africanos. Que, de algum modo, o Ardila também é. Secara mesmo, de todo. Nem uma gota de água no leito da ribeira. Que era o ponto de abastecimento para o consumo humano de cerca de 40% dos habitantes do concelho de Moura.  Boa parte da população continuava, a despeito de contínuos e angustiados apelos, a consumir alegremente, como se nada se passasse.

As crises são cíclicas. O nosso padrão de consumo é que se alterou radicalmente no decurso das últimas décadas. Felizmente, a nossa atenção aumentou. No início dos anos 80, no meio de uma seca preocupante, a imprensa estrangeira falava desse problema em Portugal. Dentro de portas, a Pátria divertia-se com um boato que corria sobre uma suposto ato sexual envolvendo um futebolista de origem guineense e uma cantora... Hoje, o tema não interessaria ninguém.

É dia 20 de novembro e continua sem chover.

Um Dia de Chuva

Um dia de chuva é tão belo como um dia de sol.
Ambos existem; cada um como é.

Alberto Caeiro - "Poemas Inconjuntos"

STARDUST MEMORIES Nº 16: 36 ANOS MAIS TARDE...

Um post em que retomo um poema e uma imagem que já por aqui passaram. Só porque sim.

Recordação do Alto da Ajuda, em 1981. Um grupo mourense: José Francisco Moita, Tarugo (de óculos à Elton John), o autor de blogue (disfarçado de Tutankhamon), José Ramos (de boné amarelo), Francisco Emiliano, Maria da Luz Baleizão, Rui Bebiano, a nossa querida Antónia, uma prima do Fernando Pinto (é de Elvas e não me consigo recordar do nome da moça), o Rafael Rodrigues, o Fernando Pinto (na altura em que ia à Festa do Avante!) e a Isabel Baleizão.


se um dia a juventude voltasse 
na pele das serpentes atravessaria toda a memória 
com a língua em teus cabelos dormiria no sossego 
da noite transformada em pássaro de lume cortante 
como a navalha de vidro que nos sinaliza a vida 

sulcaria com as unhas o medo de te perder... eu 
veleiro sem madrugadas nem promessas nem riqueza 
apenas um vazio sem dimensão nas algibeiras 
porque só aquele que nada possui e tudo partilhou 
pode devassar a noite doutros corpos inocentes 
sem se ferir no esplendor breve do amor 

depois... mudaria de nome de casa de cidade de rio 
de noite visitaria amigos que pouco dormem e têm gatos 
mas aconteça o que tem de acontecer 
não estou triste não tenho projectos nem ambições 
guardo a fera que segrega a insónia e solta os ventos 
espalho a saliva das visões pela demorada noite 
onde deambula a melancolia lunar do corpo 

mas se a juventude viesse novamente do fundo de mim 
com suas raízes de escamas em forma de coração 
e me chegasse à boca a sombra do rosto esquecido 
pegaria sem hesitações no leme do frágil barco... eu 
humilde e cansado piloto 
que só de te sonhar me morro de aflição

Poema de Al Berto (1948-1997).