Chaves na mão, melena desgrenhada
Chaves na mão, melena desgrenhada,
Batendo o pé na casa, a mãe ordena
Que o furtado colchão, fofo e de pena,
A filha o ponha ali ou a criada.
A filha, moça esbelta e aperaltada,
Lhe diz co'a doce voz que o ar serena:
– «Sumiu-se-lhe um colchão? É forte pena;
Olhe não fique a casa arruinada...»
– «Tu respondes assim? Tu zombas disto?
Tu cuidas que, por ter pai embarcado,
Já a mãe não tem mãos?» E, dizendo isto,
Arremete-lhe à cara e ao penteado.
Eis senão quando (caso nunca visto!)
Sai-lhe o colchão de dentro do toucado!...
Nicolau Tolentino (1740-1811)
Chaves na mão, melena desgrenhada,
Batendo o pé na casa, a mãe ordena
Que o furtado colchão, fofo e de pena,
A filha o ponha ali ou a criada.
A filha, moça esbelta e aperaltada,
Lhe diz co'a doce voz que o ar serena:
– «Sumiu-se-lhe um colchão? É forte pena;
Olhe não fique a casa arruinada...»
– «Tu respondes assim? Tu zombas disto?
Tu cuidas que, por ter pai embarcado,
Já a mãe não tem mãos?» E, dizendo isto,
Arremete-lhe à cara e ao penteado.
Eis senão quando (caso nunca visto!)
Sai-lhe o colchão de dentro do toucado!...
Nicolau Tolentino (1740-1811)
Post que vai, em especial, para os colegas do Liceu de Queluz (1977/78) e da Faculdade de Letras de Lisboa (1981/85)
O episódio passou-se em finais de 1977. Tinha acabado de chegar da Escola Gama Barros. Depois de uma breve incursão de dois meses pelo Cacém regressava ao Liceu Nacional de Queluz. A turma do 9º ano que me calhou em sorte tinha alguns colegas conhecidos. Uma delas avisou-me que o professor de História era "uma fera". Tinha dado 13 valores à Lúcia Novais. Ninguém se recordava de a Lúcia ter notas abaixo de 17. Um 13 nela era igual a uma negativa, o que fazia prever uma razia a História. A colega que me passou a informação acrescentou: "em todo o caso, hoje é a última aula dele, porque vai para leitor de português em Dacar". O professor tinha um ar extravagante e um discurso que me pareceu estratosférico. A meio dessa última aula resolveu despedir-se de nós lendo poemas. Recordo-me de um, que me fez rir, e que transcrevi mais acima.
Quatro anos mais tarde, na Faculdade de Letras de Lisboa, os meus colegas do 1º ano de História comentavam o sentimento de pânico que lhes causava o Dr. Hamilton Costa, jovem assistente de Teoria das Fontes e Problemática do Saber Histórico (um lindo e portuguesíssimo nome para uma cadeira). Cujo discurso tinham dificuldade em seguir. Quando o vi no bar, percebi que o professor de uma aula só do meus dias de liceu e o terrorífico assistente eram uma e a mesma pessoa. Vim a descobrir depois uma pessoa muito pouco terrorífica, de grande cultura e com imenso sentido de humor.
2 comentários:
Eu tive a sorte de ter o Hamilton Costa (o penteado era uma maravilha de ventania) a História da Cultura e das Mentalidades. Só quem tinha pedalada para ele o conseguia acompanhar... e eu e o meu grupo fomos capazes de o acompanhar. Um excelente professor.
Também foi meu professor na Faculdade de Letras. Uma personalidade invulgar. Não sabia que tinha passado pelo Liceu Nacional de Queluz, por onde também passei. Acredito que a sua fina ironia e a sua peculiar forma de leccionar tenham sido incompreendidas por esses jovens estudantes!
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